Dívidas: o cheque especial é a modalidade de empréstimo mais simples, porém mais cara (krisanapong detraphiphat/Getty Images)
Estadão Conteúdo
Publicado em 8 de junho de 2019 às 10h28.
Brasília — Os brasileiros mais pobres e com menos escolaridade são as maiores vítimas dos altos juros cobrados pelos bancos no cheque especial. A modalidade de empréstimo mais simples, porém mais cara, do mercado tem sido a saída dos trabalhadores com menor renda para fechar as contas no fim do mês. O resultado dessa equação são altos níveis de inadimplência nessas operações, que superam o de qualquer outra linha de crédito disponível para famílias.
Estudo do Banco Central mostra que 43,9% dos usuários do cheque especial têm renda inferior a dois salários mínimos (R$ 1.996) e 12,5% estão com os pagamentos em atraso superior a 90 dias. Outros 33,5% dos clientes que usam esse tipo de crédito ganham entre dois e cinco salários, com 6,4% de inadimplência.
Considerando o nível de escolaridade, a inadimplência no cheque especial também é maior entre aqueles que estudaram por menos tempo e não chegaram a cursar uma faculdade.
A taxa média cobrada pelos bancos no cheque especial passou de 322,7% ao ano em março para 323,3% em abril. No crédito pessoal, por exemplo, os juros passaram de 45,3% para 45,9% ao ano.
"Uma vez que baixa escolaridade e baixa renda estão interligadas, é difícil saber se a maior inadimplência é resultado do não entendimento das características do produto (questão educacional) ou do seu custo elevado (questão de renda) ou ainda de uma combinação dos dois", pondera o BC no documento.
Em dezembro do ano passado, o saldo do cheque especial totalizou R$ 21,98 bilhões, dos quais R$ 3,38 bilhões estavam inadimplentes. Esse nível de inadimplência de 15,36% é bem superior à média do total de operações de crédito para pessoas físicas, de 3,25%.
Para o BC, é importante o desenvolvimento de estratégias de utilização desse instrumento de forma mais adequada por seus usuários. Em entrevista ao jornal Valor Econômico nesta semana, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, afirmou que a instituição estuda autorizar os bancos a cobrarem uma tarifa dos clientes no acesso ao cheque especial, em troca de uma redução dos juros cobrados na modalidade.
Desde julho do ano passado, os bancos estão oferecendo um parcelamento para dívidas no cheque especial. A opção vale para débitos superiores a R$ 200. Segundo a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), entre julho de 2018 e abril deste ano, 9,55 milhões de pessoas migraram do cheque especial para o parcelado. Só em abril, dado mais recente, 1,11 milhão de pessoas fizeram a troca da linha que cobra juros médios de 12,31% ao mês para a outra, cujo custo é de R$ 3,21 ao mês, de acordo com levantamento feito com 12 bancos que representam 90% do mercado.
A expectativa da Febraban era de que essa migração do cheque especial para linhas mais baratas acelerasse a tendência de queda do juro cobrado ao consumidor. Em junho de 2018, antes do início da nova dinâmica, a taxa do cheque especial estava em 304,9% ao ano.
Para o economista da Serasa Experian, Luiz Rabi, a inadimplência maior no cheque especial entre as pessoas com menor renda e escolaridade não significa que apenas essa camada da população precisaria de mais educação financeira. Segundo ele, mesmo pessoas com mais estudo e conhecimento sobre o funcionamento desse tipo de crédito acabam caindo na armadilha dos recursos disponibilizados de maneira automática pelas instituições financeiras.
"As classes de maior renda e escolaridade cometem os mesmos erros no cheque especial, mas conseguem sair rapidamente do instrumento. Quando essas pessoas exageram em compras por impulso, normalmente superam esse desequilíbrio sacando de outra reserva financeira", explica. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.