EXAME.com (EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h34.
Já faz algum tempo que a assistência médica se tornou um dos benefícios mais valorizados por funcionários de qualquer nível hierárquico, em qualquer empresa. Segundo uma pesquisa da consultoria de recursos humanos Towers Perrin, 100% das companhias de médio e grande portes instaladas no Brasil oferecem esse tipo de benefício. Hoje, para o empresário, o plano de saúde é uma despesa inevitável. O problema mais comum do que se imagina é que ela pode se transformar em algo incontrolável, um fator desestabilizador nas finanças corporativas. "As empresas começam agora a perceber que o plano de saúde é um risco financeiro", diz Lais Perazo, gerente da área de saúde da Towers Perrin, consultoria internacional especializada em recursos humanos.
Esse risco é crescente. O custo médio por empregado e cada um de seus dependentes já chega a 120 reais por mês. As corporações brasileiras gastam hoje até 12% da folha de pagamento com a saúde de seus funcionários. Até alguns anos atrás, essa despesa era, no máximo, de 9%. O encarecimento desse benefício é um fenômeno mundial. Nos Estados Unidos, os custos de assistência médica vêm crescendo de 12% a 14% ao ano desde 2000, percentual muito superior aos índices de inflação (neste ano o custo de vida americano deve ficar ao redor de 2,5%). Trata-se do preço a pagar por novas tecnologias, exames, remédios e equipamentos que aumentam a eficácia dos tratamentos e a expectativa de vida. No caso brasileiro há um complicador financeiro adicional: as mudanças na legislação de 1998 ampliaram os serviços obrigatórios de todos os planos de saúde e elevaram os custos. "O essencial aumentou e tornou-se mais caro", diz Sheila Clezar, consultora da corretora americana Marsh.
Como enfrentar esses problemas? A melhor regra é deixar de encarar o assunto como um gasto inevitável e passar a pensar nele como um risco a ser administrado e reduzido. O tratamento que tem funcionado, nesse caso, combina a prevenção de doenças, o acompanhamento dos atuais doentes, a orientação dos funcionários para o bom uso do plano e a restrição de serviços.
Tome-se como exemplo a subsidiária brasileira da Basf. Até o ano 2000, a empresa administrava 14 diferentes contratos de assistência médica. Com eles, atendia 4 000 funcionários localizados em sete estados do país, gastando o equivalente a 8% de sua folha de pagamento. A adaptação às normas pós-1998 poderia fazer os custos subir de 8% para 10% da folha. Para manter as despesas sob controle, a companhia racionalizou seus serviços médicos. "Passamos a trabalhar só com duas operadoras de saúde", diz Anita Viviani, gerente de recursos humanos da Basf. "Nosso poder de negociação aumentou e o custo por funcionário caiu."
Os dois novos operadores da Basf Sul América e Unimed foram escolhidos por concorrência. Além de características operacionais como tamanho da rede e qualidade dos serviços, os aspectos financeiros e gerenciais foram considerados. "Procuramos uma rede de boa qualidade que pudesse atender toda a nossa área de atuação e que também oferecesse seguro contra acidentes de trabalho", diz Anita.
Após cortar o número de fornecedores, a Basf contratou a Marsh para ajudá-la a gerenciar seu plano. A corretora foi a campo: mapeou os riscos dos funcionários, analisou a utilização do plano e sugeriu ações que ainda estão sendo implementadas. A primeira delas foi iniciada neste ano e tem como objetivo a redução do gasto pela diminuição da demanda. O método para chegar a isso é a conscientização dos funcionários quanto ao uso desnecessário dos serviços e a inclusão irregular de dependentes e agregados. Jornais, cartazes, palestras e um manual de dicas ajudam a vender a idéia de que o plano tem custo e é preciso ser corretamente utilizado (veja as principais recomendações da Basf a seus empregados no Portal EXAME exame.com.br).
Os funcionários também passaram a receber um extrato com os recursos médicos utilizados e o preço de cada serviço. O recado implícito é que a Basf poderá apresentar parte dessa fatura a seus empregados. Essa prática, conhecida como co-participação, é uma das maneiras de reduzir rapidamente os custos para a empresa. O princípio é semelhante ao de um seguro de automóvel. Em caso de acidente, o segurado paga um pedaço da conta, para evitar o uso abusivo. "Pouca gente tem idéia que um exame de ressonância magnética pode custar 1 000 reais", diz Sheila, da Marsh. A co-participação é uma estratégia adotada cada vez mais pelas corporações. Normalmente, o funcionário paga 20% da conta, mas há casos em que a exigência chega a 50%. Uma co-participação de 20% diminuiria os gastos de uma empresa como a Basf em 1,6% da folha de pagamento. "Não está decidido se vamos adotar essa medida", diz Anita. "O importante é os custos não saírem do controle."
Chamar os empregados a dividir os custos da saúde não é uma panacéia. O esquema funciona quando faz parte de uma estratégia de gerenciamento de riscos, o que inclui cuidar da evolução dos doentes e realizar trabalho preventivo para que os funcionários saudáveis permaneçam nesse grupo. Esse desafio vem sendo encarado por empresas como a operadora mineira de telefonia Telemig Celular, que implantou ao mesmo tempo um programa de promoção à saúde, um de acompanhamento dos doentes e um sistema escalonado de co-participação. A estratégia conjunta conseguiu reduzir em 30% os gastos com saúde num período de três anos.
A empresa é beneficiada pela baixa idade média dos funcionários, em torno de 30 anos. Quanto mais jovem o quadro, menor a expectativa de despesas. A Telemig, com 2 700 funcionários espalhados por seis estados brasileiros, optou também por correr os riscos de um aumento da demanda por consultas médicas. Seu contrato com a Bradesco Saúde, firmado há três anos, diz que é a empresa telefônica quem vai pagar as contas médicas, um tipo de plano conhecido como pós-pago. A Bradesco Saúde recebe apenas uma taxa para administrar os planos. "Só pagamos o que for efetivamente utilizado", diz Robson Lodi, gerente de remuneração e benefícios do grupo. Atualmente, a empresa gasta 6% da folha de pagamento com a saúde dos empregados e de seus dependentes.
A alternativa seria fazer como a Basf e optar por um plano pré-pago, em que o risco é transferido para a seguradora. A empresa paga um valor para cobrir os custos previstos do funcionário. Os gastos que superarem o valor estabelecido são pagos pela seguradora, que cobra mais por isso e renegocia os contratos uma vez por ano.
Além da opção pelo tipo de plano, outro ponto vital para o controle dos custos é gerir as doenças. Em média, 65% dos funcionários de uma empresa respondem por apenas 10% dos gastos. Os 10% menos saudáveis, por sua vez, geram metade das despesas. "A saída é acompanhar de perto os maiores usuários dos planos de saúde, impedindo que seus gastos saiam do controle", diz Valter Hime, diretor executivo da consultoria de recursos humanos americana Aon Consulting.
A subsidiária brasileira da Philips, por exemplo, já adotou várias estratégias na gestão de sua área de saúde -- desde a contratação de empresas de medicina de grupo até a manutenção de um plano próprio para atender seus 4 200 funcionários. Desde 1999, a Philips terceirizou a parte operacional do plano (tarefas como receber, pagar e administrar a rede) para a Sul América Saúde. Ao mesmo tempo, médicos foram mantidos na empresa para acompanhar a utilização dos serviços e ajudar nas correções de rota. Um departamento com cinco pessoas audita os gastos, acompanha os atendimentos e negocia preços com a operadora. "Assim conseguimos minimizar o crescimento dos custos", diz Renato Barreiros, gerente do departamento de saúde e qualidade de vida da Philips. No ano passado, a empresa gastou 89 reais mensais por funcionário. Isso significou um aumento de 3% em relação ao ano anterior, índice bem inferior aos 15% da inflação médica do período. "Deixamos de gastar 3,9 milhões de reais em 2002", diz Barreiros.
O conceito de gestão de riscos vem sendo empregado pelas próprias operadoras de saúde. Num setor que passa por um momento de consolidação e busca de eficiência, o controle de custos é vital. A Sul América Saúde, por exemplo, está identificando quais clientes são usuários intensivos de médicos, exames e internações hospitalares. "Somente 1% dos segurados consome 30% dos recursos", diz Manoel Peres, diretor da companhia, que tem 2,3 milhões de clientes em todo o país e atingiu uma receita de 2,9 bilhões de reais em 2002. Em meados do ano passado, a Sul América escolheu 1 800 clientes para fazer parte de um programa de gerenciamento de doenças. O programa inclui a visita residencial de enfermeiros, a liberação de um telefone 24 horas para orientações e, conforme o caso, a instalação de infra-estrutura para o tratamento em casa. "É possível melhorar a qualidade de vida desses pacientes e diminuir seus custos para a empresa de 20% a 30%", diz Peres. Recentemente, de olho numa nova demanda do mercado, a Sul América passou a oferecer serviços de mapeamento de risco, prevenção e gerenciamento de doenças para clientes corporativos.
RECEITA DE ECONOMIA
O que as empresas devem fazer para gastar menos com saúde
1 Conheça as pessoas -- Trace o perfil dos funcionários da empresa, identificando os grupos saudáveis, os que apresentam risco de desenvolver doenças, os que já estão doentes e os casos críticos.
2 Escolha o plano -- A empresa pode optar por um plano pré-pago ou um pós-pago. No pré-pago, a operadora (a empresa de seguro-saúde ou de medicina de grupo) corre o risco de as despesas subirem incontrolavelmente. No pós-pago, esse risco é da empresa. Planos pós-pagos só valem a pena para companhias grandes, com mais de 2 000 funcionários. Quanto maior a escala da empresa, mais diluídos ficarão os riscos assumidos e maior o poder de barganha na negociação com a operadora.
3 Informe o público -- "As pessoas não sabem utilizar o plano de saúde", diz a consultora Sheila Clezar, da Marsh. "Em vez de marcar uma consulta, vão ao pronto-socorro, que é mais caro." A atitude dos funcionários pode ajudar na contenção de despesas, como evitar marcar consultas seguidas para o mesmo problema ou ainda emprestar a carteirinha a um terceiro.
4 Gerencie as doenças -- Acompanhar de perto os portadores de doença, principalmente crônicas e casos mais graves, é fundamental. As estatísticas mostram que 10% dos pacientes consomem 50% dos recursos do plano. "Um doente solto na rede provavelmente sofrerá com tratamento pior e mais caro", diz Lais Perazo, da Towers Perrin. "Monitorá-lo é a melhor saída."
5 Promova a saúde -- Os funcionários saudáveis, que só fazem consultas e exames de rotina, correspondem a 65% dos casos e consomem 10% dos recursos. Campanhas de incentivo à qualidade de vida e competições esportivas ajudam a mantê-los nesse grupo.