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Da Redação
Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h34.
Para Raghuram Rajan, professor de finanças da Universidade de Chicago e ex-economista-chefe do FMI, o plano de 700 bilhões de dólares pode limpar os balanços dos bancos, mas não vai fazer com que eles voltem a emprestar
EXAME Qual é a principal deficiência do plano americano de 700 bilhões de dólares?
Rajan - O plano não tem uma estratégia explícita para os bancos levantarem mais capital. A menos que eles aumentem seu capital, o plano oferece apenas medidas parciais. O plano tenta limpar os balanços. Mas mesmo que esse objetivo seja atingido, os bancos estarão assustados demais para emprestar para as empresas. Eles provavelmente continuarão desalavancando. É preciso recapitalizar os bancos.
EXAME - Quais são as chances de que a execução do plano de 700 bilhões de dólares realmente destrave os fluxos de crédito?
Rajan - Depende de como ele vai funcionar. O plano do Tesouro americano tenta recapitalizar instituições financeiras de três modos diferentes. Primeiro, ao pagar acima do valor de mercado por ativos ilíquidos (os títulos podres), o Tesouro espera recapitalizar indiretamente as instituições. Segundo, ao criar um mercado para ativos ilíquidos e permitir que os preços sejam estabelecidos, ele espera que outros operadores privados entrem no mercado. Terceiro, o Tesouro provavelmente espera também que, quando os ativos ilíquidos estiverem fora dos balanços, as instituições terão balanços limpos, poderão levantar capital e se tornarão mais dispostas a emprestar. São intenções sólidas, mas, possivelmente, inconsistentes. Pagar um preço pelos títulos podres não vai ajudar o mercado a descobrir o preço real que os traders, que não têm os horizontes de longo prazo do governo, estão dispostos a pagar.
EXAME - O que pode dar errado?
Rajan - As instituições com os ativos mais tóxicos são aquelas que tomaram as piores decisões - razão pela qual elas têm tantos ativos ilíquidos para vender. Por isso, provavelmente estarão mais próximas da inadimplência. Embora possam conseguir o maior alívio com a venda de ativos, elas provavelmente não se recuperarão e expandirão seus empréstimos rapidamente - nem deveriam, dado seu histórico. Ao contrário, as instituições financeiras relativamente saudáveis que provavelmente têm mais capacidade de expandir os empréstimos poderão não ser as que receberão boa parte do capital adicional do plano do Tesouro pois têm poucos ativos ilíquidos para vender.
EXAME - Quais são as principais mudanças na regulação que deveriam ser feitas para evitar crises similares no futuro?
Rajan - Problemas de governança em bancos e a excessiva alavancagem de curto prazo estiveram no seu centro da atual crise. Essas duas causas estão relacionadas. Qualquer tentativa de impedir uma repetição deveria reconhecer que é difícil resolver problemas de governança, e, conseqüentemente, desestimular bancos a se alavancarem. Intervenções regulatórias diretas, como exigir mais capital, poderiam simplesmente exacerbar as tentativas do setor privado de contorná-las, assim como esfriar a intermediação e o crescimento econômico. Ao mesmo tempo, é extremamente dispendioso para a sociedade tanto continuar salvando o sistema bancário, como deixar a economia ser arrastada para o torvelinho criado pelas crises bancárias. A despeito de seus melhores esforços, os reguladores não podem evitar problemas sistêmicos.
EXAME - Não tem solução, então?
Rajan - Os reguladores devem se concentrar em minimizar os custos das crises para a sociedade sem afundar a intermediação financeira no processo. A minha proposta é um seguro de capital, que garanta que o setor privado assuma a conta e reduza as conseqüências adversas de uma crise. Apesar de haver esboçado os traços gerais de como o esquema de seguro de capital poderia funcionar, existe inquestionavelmente muito mais trabalho a ser feito para ele ser implementado. Espero que outros acadêmicos, autoridades políticas e profissionais encarem esse desafio.