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CVM suspende executivos por usar recursos do Tesouro de clientes

O caso foi descoberto quando a corretora teve sua liquidação decretada pelo BC e os clientes não conseguiram ter acesso aos títulos do Tesouro

Corval: a operação fraudulenta se consumava com a apropriação dos recursos de seus clientes, mantidos na conta corrente da própria Corretora, passando a ficar disponíveis em seu “caixa (nito100/Thinkstock)

Corval: a operação fraudulenta se consumava com a apropriação dos recursos de seus clientes, mantidos na conta corrente da própria Corretora, passando a ficar disponíveis em seu “caixa (nito100/Thinkstock)

Karla Mamona

Karla Mamona

Publicado em 14 de agosto de 2019 às 12h12.

São Paulo - A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) condenou três executivos da corretora Corval a multas que somam R$ 600 mil e punições que vão de 3 a 9 anos de proibição de atuação no mercado de capitais em processo envolvendo a transferência de ativos dos clientes para a corretora para levantar recursos no mercado.

A Corval oferecia custos mais baixos para ficar com os títulos do Tesouro Direto dos clientes em custódia própria, em vez de deixá-los guardados na BM&FBovespa, e os vendia para fazer caixa ou os usava para garantir operações na bolsa ou no mercado. Ela também alugava as ações dos clientes seu autorização, entregava os papéis na bolsa e liberava dinheiro dado em garantia pelos clientes para pagar comissões aos diretores e agentes autônomos.

O caso foi descoberto quando a corretora teve sua liquidação decretada em setembro de 2014 pelo Banco Central e os clientes não conseguiram ter acesso aos títulos do Tesouro Direto. A partir de então, o sistema de registro e custódia dos papéis das corretoras passou a ter controles mais rígidos.

As operações fraudulentas teriam ocorrido, segundo o Processo Administrativo Sancionador CVM SP2018/15 (SEI nº 19957.007133/2017-92), entre 16 de abril de 2013 e 5 de junho de 2014.

Foram condenados Carlos Augusto Vieira Fraga, diretor estatutário da corretora, Luis Rodrigo Esteves de Souza, que segundo a CVM seria o responsável de fato pela corretora e Lizete da Conceição, responsável pela custódia. Robson Eduardo Salgueiro, analista de custódia, foi absolvido das acusações.

Fraga recebeu multa de R$ 300 mil e suspensão por 5 anos para atuar direta ou indiretamente em qualquer operação do mercado de capitais. Souza foi multado em R$ 300 mil também, e inabilitado por 9 anos para atuar no mercado. Já Lizete recebeu suspensão por três anos. A decisão do coletiado foi unânime e seguiu o voto do presidente da CVM, Marcelo Barbosa.

Segundo o voto do presidente da CVM, a Corval vivia situação de ausência de liquidez, sem ter caixa próprio para arcar com suas despesas do dia a dia. Não obstante, ao longo do período, verificou-se que a Corretora conseguiu (i) pagar suas despesas operacionais; (ii) realizar adiantamentos a diretores e agentes autônomos vinculados à Corretora; (iii) honrar compromissos com a bolsa de valores; e (iv) possibilitar que clientes realizassem certas operações alavancadas em bolsa sem que tivessem recursos para oferecer em garantia. Conforme a apuração dos fatos deixou claro, a disponibilidade de recursos foi possibilitada por mecanismo fraudulento, diz a CVM.

Em um primeiro momento, era realizada a transferência de ações – custodiadas pela Corval – de determinado cliente sem sua prévia autorização (não obstante serem registradas a título de empréstimo), com o propósito de substituir valores em espécie de outros clientes então depositados na Corretora para servirem de garantia (margem) de certas operações em bolsa alavancadas, pelas ações dos primeiros (“Substituições”).

Com a substituição do dinheiro por ações, solicitada à BM&FBovespa, os recursos então depositados em garantia eram liberados pela bolsa para a Corval, ficando disponíveis na conta corrente da Corretora para uso.

Finalmente, a operação fraudulenta se consumava com a apropriação dos recursos de seus clientes, mantidos na conta corrente da própria Corretora, passando a ficar disponíveis em seu “caixa” e utilizados para diversas finalidades, como pagamento de despesas operacionais próprias e de adiantamentos a diretores e agentes autônomos vinculados à Corval.

Foram confirmadas 271 Transferências de Ações, bem como a ausência de autorização dos clientes cedentes para sua realização. Além de a Corretora não ter enviado à BSM as autorizações dessas negociações, os próprios acusados reconheceram a irregularidade, afirma o presidente da CVM. Ele também não negaram a existência e utilização do dinheiro que esteve disponível na conta corrente da Corval ao longo do Período.

A segunda operação fraudulenta apontada pela CVM – iniciada a partir da venda de ações de um cliente – também teria ocorrido com a intenção de gerar caixa para a Corval. Luis Esteves e Carlos Fraga injustificadamente teriam protelado a devolução dos valores obtidos com a operação não autorizada, período durante o qual puderam utilizar, em benefício da Corval, os recursos. Segundo os acusados, a venda teria ocorrido em razão de “erro operacional”.

Segundo Barbosa, as evidências mostraram transferências via TED para empresas ligadas a Luiz Esteves, “o que denota que não apenas a Corval foi direta e indevidamente beneficiada com a operação (e os acusados indiretamente beneficiados), mas também Luis Esteves auferiu vantagem particular”.

“Ante o exposto”, afirma Barbosa, “entendo que foram preenchidos todos os três elementos considerados pelo Colegiado como necessários à caracterização da infração prevista no item I c/c item II, alínea c, da Instrução CVM nº 08/1979, pois restou demonstrada: 
i. a utilização de ardil ou artifício, consistente na realização de transferências não autorizadas de valores mobiliários sob custódia da Corval, de determinados clientes para outros, classificados pela Corretora como se fossem empréstimos entre as partes; 
ii. a indução ou manutenção de terceiros em erro, pois os clientes da Corval não tinham ciência das Transferências de Ações, acreditando que as ações mantidas sob custódia da Corretora permaneciam sob sua titularidade e disponibilidade; e 
iii. a intenção de obter vantagem ilícita (para a Corretora e para Luis Esteves), tendo em vista que as Substituições tinham como finalidade a possibilidade de utilização, por parte da Corretora e de seus diretores, dos valores depositados pelos clientes a título de garantia para fins diversos”.

O presidente da CVM conclui o voto pedindo a condenação dos acusados, no que foi seguido pelos demais diretores.

Essa notícia foi publicada originalmente no site Arena do Pavini.

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