Cyrela, Eztec e M. Bigucci oferecem financiamento direto a clientes como forma de driblar o aumento de restrição dos bancos no crédito imobiliário (RyanKing999/Thinkstock)
Da Redação
Publicado em 25 de janeiro de 2016 às 04h00.
São Paulo - Os bancos vêm pisando no freio na hora de financiar imóveis no Brasil. Para conter os cancelamentos de contratos de clientes que não conseguem crédito na praça na hora da entrega das chaves, construtoras voltaram a financiar imóveis de forma direta. Algumas, mais agressivas, chegam a conceder crédito em valor equivalente a até 80% do valor do imóvel.
É o caso da Cyrela. Além do porcentual mais alto do financiamento, a construtora também consegue financiar imóveis por um prazo mais longo do que o da concorrência: 240 meses (20 anos).
De acordo com o diretor financeiro da construtora, Eric Alencar, essas condições são as melhores já oferecidas na história da empresa. “Antes, havíamos chegado a financiar, no máximo, 75% do valor do imóvel, e em até 180 meses”.
O financiamento direto oferecido pelas construtoras costuma oscilar conforme as condições do mercado. Quando há muito crédito no mercado, as empresas costumam interromper os financiamentos, já que a demanda é menor. Como a concessão do crédito não é o principal negócio das construtoras, e acabam gerando custos e riscos para essas empresas, dificilmente elas conseguem oferecer condições melhores do que as concedidas pelos bancos em um cenário mais favorável.
Alencar aponta que a Cyrela nunca parou totalmente de financiar de forma direta, mas voltou a conceder agora esse tipo de crédito de forma mais estruturada e com condições mais atrativas por conta da crise. “Buscamos ao máximo oferecer condições semelhantes às dos bancos”.
Outra construtora que voltou a oferecer o financiamento direto em um cenário de aumento dos contratos cancelados foi a M. Bigucci. Assim como a Cyrela, a construtora cobra juros de 12% ao ano e as prestações são corrigidas pela inflação. Já o tempo máximo de financiamento e o porcentual financiado são mais restritos: o crédito é concedido por até 150 meses e equivale a, no máximo, 70% do valor do imóvel.
A Eztec também oferece financiamento direto aos clientes em até 150 meses e correspondente a até 75% do valor do imóvel, com taxa de juros de 12% ao ano corrigida pelo IGP-M.
Mais flexibilidade
Assim como no banco, somente quem tem um bom histórico de crédito tem acesso ao financiamento oferecido pela construtora. Mas a possibilidade de a empresa avaliar esse histórico durante o período da construção do empreendimento, no caso de quem comprou o imóvel na planta, pode tornar essa análise de crédito mais flexível.
Isso significa permitir que o cliente possa comprometer uma fatia maior da renda em alguns casos, diz o diretor da construtora M. Bigucci, Marcos Bigucci. “Podemos conceder o crédito mesmo que ele seja equivalente a 40% da renda do cliente, por exemplo”. Nos bancos, os financiamentos só são concedidos se não comprometerem mais de 30% da renda do tomador.
Além de buscar oferecer uma opção de crédito para o cliente que tem o financiamento negado pelo banco, o foco do financiamento direto é atender compradores que tenham dificuldade de comprovar renda em instituições financeiras, como microempresários e trabalhadores sem carteira assinada.
O financiamento direto também é utilizado pelas empresas para oferecer maior segurança para novos clientes que queiram comprar um imóvel na planta, mas não têm a certeza de que o financiamento será aprovado pelo banco quando a obra acabar. “Nesse caso, já asseguramos o financiamento direto na hora de entrega das chaves”, diz Bigucci.
A construtora também pode personalizar a periodicidade de pagamento das parcelas, que pode ser semestral ou ter valores maiores no final do ano, quando o cliente recebe o 13º salário, por exemplo, conta o diretor. “Temos clientes que venderam um imóvel, mas irão receber os valores a cada seis meses. Buscamos então uma solução para adequar o financiamento às suas necessidades”.
Crédito exige cuidado
Geralmente, as taxas cobradas pelas construtoras no financiamento são maiores do que as oferecidas pelos bancos, o que aumenta o saldo devedor final.
Além disso, as parcelas são reajustadas por índices de inflação, que costumam ter variações maiores do que a Taxa Referencial (TR), mais comum nos financiamentos bancários. A título de comparação, o IGP-M fechou 2015 em 10,54%. Já a TR em 1,70%.
Além disso, as construtoras não costumam oferecer, como os bancos, financiamento com parcelas que diminuem ao longo do tempo. O mais comum é que o sistema de amortização da dívida no crédito dado pelas construtoras seja pelo sistema Price, no qual o valor das parcelas é fixo durante todo o tempo do financiamento. Ou seja, as parcelas podem pesar no orçamento durante um longo período, a não ser que ocorra uma amortização do saldo devedor no meio do caminho (veja como antecipar as parcelas do financiamento imobiliário).
O prazo do financiamento, ainda bem inferior ao que os bancos costumam oferecer, também faz com que as parcelas fiquem mais pesadas e exige atenção redobrada do comprador para evitar um descontrole financeiro.
Vale destacar ainda que, se por um lado as construtoras são mais flexíveis na concessão dos financiamentos, por outro os tomadores correm mais riscos de se comprometer com parcelas maiores do que seu orçamento pode arcar.
É o caso da aposentada Nazaré de Araújo de Sousa, 64 anos. Ela teve o crédito negado pelo banco por ter renda insuficiente para arcar com as parcelas e comemora o fato de ter obtido o financiamento oferecido pela construtora, que evitou que tivesse de cancelar o contrato de seu apartamento de 56 metros quadrados em São Paulo.
Contudo, Nazaré terá de pagar prestações de 2,6 mil reais por mês, valor que corresponde a cerca de 80% do valor da sua aposentadoria. Com parcelas reajustadas pela inflação, ela vem sentindo um aumento no valor das parcelas a cada mês, mas confia que irá aliviar o peso das prestações nos próximos meses. "Estou iniciando um negócio próprio e pretendo aumentar minha renda em breve".