Minhas Finanças

Como se proteger do golpe do crédito consignado

Servidores públicos e aposentados são as maiores vítimas, mas qualquer pessoa que tenha os dados pessoais furtados está sujeito a prejuízos

A facilidade para obter empréstimos e dados pessoais faz de aposentados e servidores as vítimas preferenciais

A facilidade para obter empréstimos e dados pessoais faz de aposentados e servidores as vítimas preferenciais

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Da Redação

Publicado em 16 de outubro de 2010 às 12h02.

São Paulo - O empréstimo consignado é uma das linhas de crédito mais baratas do Brasil. Como as parcelas são descontadas diretamente na folha de pagamento, o devedor não precisa nem se preocupar em separar o dinheiro todo mês para abater a dívida. Por isso mesmo, essa modalidade de crédito vem sendo frequentemente utilizada por estelionatários para ganhar dinheiro à custa de pessoas que, muitas vezes, nem sequer fizeram esse tipo de empréstimo. As vítimas costumam ser servidores públicos e beneficiários do INSS. Mas, a rigor, ninguém está livre de sofrer o famoso golpe do crédito consignado - basta que seus dados pessoais caiam em mãos erradas.

São bastante conhecidas as histórias de idosos que passaram a arcar com descontos em seu benefício do INSS para o pagamento de empréstimos consignados que nunca contraíram. Também não faltam casos de servidores públicos que, um belo dia, descobriram débito semelhante em seu contracheque sem jamais terem visto a cor do dinheiro fruto do empréstimo. Isso já aconteceu, por exemplo, com pensionistas estaduais na Bahia em 2007, com professores do estado do Rio em 2010 e até com policiais militares fluminenses em 2008 e 2009.

Todas essas situações têm em comum o fato de terem sido causadas por fraudadores que agem da mesma maneira. Em geral, são quadrilhas que confeccionam documentos falsos - de carteiras de identidade a contas de luz - a partir de dados pessoais das vítimas, como CPF, RG, conta bancária, número do benefício do INSS e outras informações salariais. De posse das falsificações, um dos membros da quadrilha se passa pela vítima e obtém um empréstimo consignado no nome dela. Às vezes, não se dá o trabalho nem mesmo de falsificar uma assinatura. Diante de duas testemunhas, também da quadrilha, o falsário finge ser analfabeto e fornece apenas a sua impressão digital. O dinheiro é, então, creditado numa conta aberta pelos criminosos ou é sacado direto no caixa, mediante a apresentação dos documentos falsos. Enquanto o dinheiro do empréstimo vai para o estelionatário, as parcelas de pagamento são descontadas do salário ou benefício da vítima. Uma variação um pouco mais perversa envolve a obtenção de um cartão de crédito consignado, uma verdadeira dívida sem fim.

O perfil das vítimas não é um mero acaso. Servidores públicos têm estabilidade no emprego e normalmente recebem em dia - o que os torna clientes disputados pelos bancos. Aposentados e pensionistas do INSS também recebem pontualmente, e existe a garantia do benefício até o fim da vida. Com isso, os criminosos conseguem a liberação do empréstimo com mais facilidade. Existe ainda mais um fator que transforma essas pessoas em vítimas preferenciais: dados cadastrais vazados dos órgãos públicos alimentam um intenso mercado informal que abastece os estelionatários. Na outra ponta, há uma verdadeira indústria de falsificação de documentos.

No caso do INSS, por exemplo, é possível comprar listas de cadastros até mesmo pela internet, conforme mostrado em reportagem do "Fantástico", da "TV Globo", exibida em novembro de 2009. Na ocasião, o próprio repórter marcou um encontro com um homem que comercializava essas listas, comprou cadastros e mostrou como é fácil mandar fazer documentos falsos a partir desses dados. Em pouco tempo, o fraudador tem uma carteira de identidade nova em folha, com sua foto, seu dedão, e o nome de outra pessoa. "O indicativo da Polícia Federal é de que o início desses vazamentos do INSS é o Dataprev (banco de dados da Previdência), com sede no Rio de Janeiro", afirma Celso Pacheco, membro da assessoria jurídica da Federação dos Trabalhadores Aposentados e Pensionistas do Rio Grande do Sul (Fetapergs).


Em algumas situações, os estelionatários se utilizam inclusive de técnicas mais "sofisticadas". Em 2009, criminosos conseguiram alterar as margens consignáveis de pelo menos cem policiais militares do Rio de Janeiro, o que permitiu que mais de 30% da renda mensal desses servidores pudesse ser comprometida. Resultado: conseguiram pegar empréstimos de até 60.000 reais. Por causa do perfil do crime, a suspeita recaiu sobre servidores que atuavam no próprio setor de Operação de Pagamento da PM.

Às vezes, até quem de fato obteve crédito consignado pode ser alvo de um golpe. A vítima recebe o dinheiro de um empréstimo legal, mas percebe que começa a pagar também por outros que jamais contraiu. Isso normalmente acontece com quem recorre a correspondentes não idôneos de instituições financeiras em vez de comparecer diretamente ao banco. No Rio Grande do Sul, em 2009, aposentados foram vítimas do golpe do crédito consignado após seus documentos terem sido esquecidos na financeira ou retidos indevidamente por agenciadores.

Entenda melhor como funciona o empréstimo consignado e como fazer para obtê-lo.

Orientação para as vítimas

De acordo com juristas e órgãos especializados em combate a fraudes, os golpes do empréstimo consignado podem contar com o auxílio de supostos correspondentes financeiros aliados a quadrilhas de estelionatários, servidores públicos que colaborem com o vazamento dos bancos de dados e até mesmo funcionários de bancos. Portanto, muitas vezes não há o que fazer para se proteger. No entanto, certas condutas podem dificultar a ação de bandidos.

Primeiro, tenha cuidado com seus documentos e dados pessoais. Não passe informações como RG, CPF, número da conta bancária, endereço residencial e número do benefício do INSS para estranhos, principalmente por telefone ou pela internet. Desconfie de supostas promoções e lembre-se de que bancos e instituições públicas, como o INSS, em geral não solicitam dados por telefone ou e-mail. Também evite deixar cópias de documentos em lojas ou em financeiras e não permita que ninguém retenha seus documentos, o que, aliás, é ilegal. Em caso de perda ou roubo de documentos, é dever do cidadão fazer registro de ocorrência. Também é aconselhável comunicar o fato a órgãos de proteção ao crédito (SPC e Serasa). Assinaturas também podem ser usadas para fraudes. Portanto, não assine documentos em branco nem sem lê-los atentamente.

Em segundo lugar, evite recorrer a intermediários quando quiser fazer empréstimo consignado. "O cidadão deve ter consciência de que, quando precisa desse crédito, deve procurar o banco diretamente. Não há necessidade de nenhum intermediário", diz Valéria Cunha, assistente de direção do Procon-SP. Especialistas em direito do consumidor alertam que muitas vezes essas empresas e representantes conveniados a bancos podem não ser de fato conveniados. Caso seja necessário recorrer a uma dessas instituições, é fundamental checar se elas são idôneas e se o vínculo com o banco de fato existe. Mais especificamente, servidores públicos e beneficiários do INSS devem se certificar, ainda, de quais são os bancos conveniados ao seu órgão. Os aposentados, por exemplo, podem consultar a lista com essas instituições e suas respectivas taxas de juros no site do Ministério da Previdência .


Também é importante manter um acompanhamento cuidadoso da própria movimentação bancária, checando regulamente os extratos. Há relatos de pessoas que ficaram meses pagando empréstimos pegos em seu nome de forma fraudulenta. Ao se constatar qualquer anomalia, o primeiro passo é ir à polícia, fazer um registro de ocorrência e comparecer ao banco onde o empréstimo foi pedido. "Às vezes esse simples contato direto já resolve", afirma José Serpa Jr., especialista em direito do consumidor e editor do site Endividado.com. "Se não resolver, cabe ação indenizatória por danos materiais e morais contra o banco e o intermediário, se houver", conclui. O cidadão pode também comunicar ao SPC e à Serasa e formalizar uma reclamação junto a um órgão de defesa do consumidor.

No caso específico das fraudes envolvendo aposentados e pensionistas do INSS, o órgão reconhece o problema e alega que tomou providências junto à Polícia Federal e ao Ministério Público para identificar a origem, a autoria e a comercialização dos cadastros. Devido aos problemas envolvendo seus segurados, o instituto divulga uma série de orientações sobre como proceder para obter empréstimo consignado e como denunciar caso o beneficiário perceba ter sido alvo de um golpe. Para conhecê-las, basta acessar a notícia sobre as regras do consignado na página do Ministério da Previdência.

Celso Pacheco, da Fetapergs, aconselha que o aposentado ou pensionista que desconfiar ter sido vítima de fraude deve tirar o extrato do benefício por meio do site da Previdência Social, e acompanhá-lo para ver se está sendo feito algum desconto estranho. Isso porque o contracheque oficial discrimina todas as movimentações, ao contrário do extrato bancário, que as designa de maneira genérica. Ao perceber qualquer irregularidade, o aposentado deve ir até um posto de benefício e pedir para verificar os dados referentes a todos os empréstimos feitos em seu nome - valores, prazos e instituições. O cidadão tem, inclusive, direito de comparecer à financeira ou banco e solicitar uma cópia do contrato dos empréstimos para ter uma prova de que aquela assinatura não é a dele.

O INSS orienta ainda o beneficiário a formalizar denúncia ligando gratuitamente para a Central 135 ou por meio da internet. O segurado pode ainda, a qualquer momento, independentemente de ter ou não empréstimos consignados em seu nome, comparecer a uma agência da Previdência Social e solicitar o bloqueio do seu benefício para a realização de novos empréstimos. O desbloqueio também pode ser feito a qualquer tempo.

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