Petrobras: incertezas da capitalização continuam afetando o preço das ações (.)
Da Redação
Publicado em 13 de setembro de 2010 às 15h14.
São Paulo - Não foram poucas as notícias que evidenciaram a vertiginosa queda das ações da Petrobras nos últimos tempos. Na esteira de um tombo superior a 28% registrado de janeiro até agora, a estatal perdeu mais de um quarto do seu valor de mercado. Os fundos de investimento vem reduzindo sua exposição ao papel e o megainvestidor George Soros vendeu as ações que tinha da companhia. Em comum, todos esses eventos guardam uma estreita relação com a incerta capitalização da Petrobras. E a indefinição do preço do barril que será usado na cessão onerosa segue inflando a nuvem de dúvidas que paira sobre a operação.
Para discutir as perspectivas para o investidor que aposta na Petrobras, o site EXAME conversou com analistas e gestores do mercado. Todos foram unânimes em apontar que a ação está, de fato, muito barata em relação ao seu potencial de valorização. Portanto, vale a pena acreditar no papel se o intuito é mantê-lo na carteira por um bom tempo. "O portfólio de projetos da companhia é bastante rico em termos de crescimento e rentabilidade futura com o pré-sal", afirma Max Bueno, analista da corretora Spinelli. "Mas o mercado não está dando atenção aos fundamentos da Petrobras porque o foco está todo centrado na capitalização. Por isso, as ações ainda podem cair", alerta.
Osmar Camilo, da corretora Socopa, concorda que os papéis não chegaram ao fundo do poço. "A pressão deve aumentar com a proximidade da oferta", diz. Ainda assim, ele avalia que vender as ações para comprá-las a um custo mais baixo pode ser arriscado para quem pensa em lucrar com essa diferença de preços na capitalização. É verdade que muitos peixes grandes já adotaram essa estratégia. Como têm uma quantidade representativa de papéis, eles podem inclusive influenciar a queda dos preços quando se desfazem das ações. "Mas para o pequeno investidor, essa diferença não deve ter um grande impacto lá na frente", emenda Camilo.
A explicação é simples. Quem já tem ações da empresa terá prioridade na subscrição, isto é, na compra dos novos papéis que serão emitidos na capitalização. Isso significa que se a demanda pelas eventuais sobras for muito grande, pode ser que o investidor não consiga entrar na oferta depois. Além disso, é consenso que os valores de hoje são realmente uma pechincha. E apesar de estarem bem perto do piso, estão longe de refletir as perspectivas de crescimento da empresa. Por isso, se o papel continuar patinando, a variação não deve ser tão grande em relação ao preço já atingido. "A companhia é uma gigante do setor e já está extremamente descontada", completa Erick Scott, analista da SLW.
Importância do preço do barril
Apontada em uníssono como a responsável pela volatilidade das ações, a operação de capitalização da Petrobras depende, no momento, da definição do preço do barril que será extraído das áreas não licitadas do pré-sal. Extraoficialmente, o laudo da consultoria contratada pela Petrobras sugere que ele custe de 5 a 6 dólares. Por outro lado, o trabalho da consultoria contratada pela ANP (Agência Nacional do Petróleo) defende que essa margem fique entre 10 e 12 dólares. Como a União vai ceder à empresa os direitos de exploração de até 5 bilhões de barris de petróleo, essa operação - também chamada de cessão onerosa - pode custar de 25 a 60 bilhões de dólares à Petrobras. É justamente essa queda de braço que vem atrasando um consenso entre as partes: enquanto o governo tenta elevar o preço do barril para conseguir arrecadar mais com as suas reservas, a estatal busca reduzir o preço para preservar o caixa.
Quando o impasse for resolvido, a Petrobras vai usar títulos públicos para pagar essa cessão onerosa. E o governo, ao invés de embolsar o montante, vai empregar esse dinheiro (ou pelo menos parte dele) na compra de novos papéis, aumentando sua participação na empresa. "O que o governo vende é o potencial do lucro com as reservas do pré-sal. Na prática, ele é o único que vai por o dinheiro no bolso agora", resume Frederico Sampaio, gestor de renda variável da Franklin Templeton. Como não se sabe exatamente qual será o retorno que o investimento dará no futuro, para o acionista é sempre melhor que o preço do barril seja mais baixo. "O petróleo ainda está embaixo da camada pré-sal e são muitas as variáveis envolvidas nessa extração. Se lá na frente descobrirem que o barril vale 5 dólares, o preço de 8 dólares fixado hoje terá significado um prejuízo", afirma Sampaio.
Vale lembrar que quanto maior for o valor do barril, maior será o montante que a Petrobras deverá ao governo pela exploração das reservas. Esse reforço no caixa da União permitirá que ela aumente sua participação acionária por duas frentes: se a cessão custar caro, a Petrobras deverá emitir mais ações para arrecadar dinheiro junto ao mercado. E quanto mais ousada for essa meta, maior é a chance dos minoritários não conseguirem manter sua participação no negócio na mesma proporção de antes.
Isso acontece porque a oferta dos novos papéis precisa obedecer à divisão acionária existente. Como a União é dona de 29,6% das ações, ela deverá usar os recursos recebidos para comprar um número de ações que mantenha este percentual. Ao restante dos investidores, será ofertada uma quantidade de papéis que assegure a participação que eles já têm. No final do processo, contudo, o que os minoritários não levarem poderá ser abocanhado pelo governo. Por isso, quem não acompanhar a oferta passará a ter menos ações em relação ao capital total da empresa. Consequentemente, verá sua parcela de dividendos ficar mais modesta, já que a divisão do lucro será feita entre um número maior de papéis.
Dividendos
Como se vê, há uma infinidade de interesses envolvidos na capitalização. Não por acaso, o governo vem adiando o anúncio do valor do barril dia após dia. Equilibrando as propostas da ANP e da Petrobras, o mercado estima que esse preço deve ficar na casa dos 8 dólares. Para entender de que modo essa definição afeta o pequeno investidor, o site EXAME pediu que uma corretora fizesse uma projeção dos dividendos recebidos por um minoritário que resolvesse não acompanhar a oferta.
Se a capitalização fosse anunciada hoje, com o barril a 8 dólares e a operação total estipulada em 85 bilhões de dólares (limite estabelecido em assembléia pelos acionistas), quem quisesse manter sua proporção de ações na empresa deveria investir 60,4% do valor já aplicado. Caso não acompanhasse a subscrição, esse sujeito perderia até 36,6% dos dividendos. Portanto, quem tivesse 1.000 ações preferenciais da empresa, receberia 693 reais de dividendos, ao invés dos 1.094 reais que seriam naturalmente embolsados. O cálculo considera a cotação atual do papel preferencial, um lucro esperado de 32 bilhões de reais para esse ano e uma divisão de 30% desse bolo.
Nesse cenário, não é difícil constatar que nem todo investidor teria condições de fazer um aporte tão generoso na Petrobras. Afinal de contas, seria preciso mais do que dobrar a aplicação já existente. Supondo que a operação conseguisse captar 45 bilhões de dólares no mercado - o que é considerado uma quantia e tanto, dado que os investidores injetaram 22 bi no banco rural da China naquela que foi maior capitalização do ano - o governo teria recursos na manga para comprar as sobras da oferta, gastando exatamente os 40 bilhões de dólares levados na cessão onerosa. Dessa forma, sua participação no capital total saltaria dos atuais 29,6% para 36,2%. "Se o governo comprar mais ações, todos os acionistas serão diluídos. E ao invés de embolsarem a participação no lucro como hoje, eles verão essa parcela diminuir. Isso é ruim especialmente porque a capitalização não vai aumentar o lucro da empresa no curto prazo", afirmou um analista ouvido pelo site EXAME.
Se o preço do barril fosse a 12 dólares, o governo receberia 60 bilhões de dólares pela cessão onerosa. Caso os minoritários entrassem na operação com 30 bilhões ao invés dos 45 bi usados no exemplo anterior, o aumento de participação do governo poderia chegar a 42,8%, considerando uma oferta dos mesmos 85 bilhões de reais. Para muita gente, fica o temor de uma maior ingerência do estado sobre a Petrobras, colocando os interesses do governo na frente das metas e lucros da empresa. "O maior risco é que as decisões se tornem cada vez mais políticas, como já está acontecendo agora", sustenta Erick Scott, da SLW.
O analista da Socopa Osmar Camilo avalia, no entanto, que a questão dos dividendos não deve ser considerada com afinco. "O investidor costuma ganhar de 2% a 3% do preço de cada ação com a repartição dos lucros pela Petrobras. Se ele está preocupado com isso, deve voltar sua atenção para empresas que tradicionalmente pagam mais, como as elétricas, que chegam a distribuir 15% sobre o preço da ação". Segundo Camilo, o baixo valor do papel da Petrobras compensará, no longo prazo, a menor arrecadação com os dividendos. "A ação está extremamente desvalorizada, tanto para o pequeno investidor, quanto para o mais qualificado. E tudo já foi considerado para que se chegasse a esse preço: desastre com a British Petroleum, risco político e incerteza da capitalização", diz.
Por último, vale lembrar que o preço do barril, por si só, não deve ser a única informação levada em consideração. "O mais importante é saber as variáveis que levaram à determinação desse valor, como a existência de infraestrutura próxima às reservas, a quantidade de óleo e as suas características físicas", afirma Max Bueno, da Spinelli. "A qualidade do petróleo pode justificar um preço de barril aparentemente alto. Por isso, os dados que vão estar no laudo técnico são até mais relevantes", completa. Ao investidor, portanto, vale a máxima do mercado acionário: estômago frio e atenção às informações que devem ser divulgadas nos próximos dias. Afinal de contas, é a crença no virtuoso crescimento da Petrobras que está em jogo na hora de manter ou tirar o papel da carteira.
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