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Como investir no exterior por meio de fundos

Burocracia, tributação e risco cambial dificultam ganhos em fundos estrangeiros; só a diversificação e a alta do dólar justificam a aposta

Bolsa de Nova York: acesso é mais fácil por meio de fundos (.)

Bolsa de Nova York: acesso é mais fácil por meio de fundos (.)

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h10.

Pouca gente sabe construir fortunas como o gestor americano Steve A. Cohen. Desde que abriu a administradora de recursos SAC Capital, em 1992, Cohen entregou aos quotistas de seus fundos um retorno anual médio de 30%. O percentual faz inveja até mesmo a Warren Buffett e foi conquistado com uma estratégia bem diferente da utilizada pelo "oráculo de Omaha". Cohen nunca fica sentado sobre uma posição durante vários anos. Sua especialidade são operações de curtíssimo prazo com contratos futuros de S&P 500, um dos principais índices americanos de ações. Quem conhece Cohen diz que ele compra e vende esses papéis quase que intuitivamente. Mas a maior parte das decisões de investimento na SAC Capital é tomada em conjunto com outros 100 gerentes de portfólio. Quem não entrega lucros crescentes é rapidamente demitido.

Se por um lado, isso é péssimo para os funcionários, por outro, costuma ser ótimo para os clientes. A boa notícia é que Cohen está à procura de investidores que tragam dinheiro fresco a seus fundos. Após o fechamento de cerca de 2.300 hedge funds com a crise de 2008 e 2009, ele chegou à conclusão que há muita gente rica procurando um bom gestor de fortunas. Se você ficou interessado, saiba que a legislação brasileira impõe uma série de restrições para investimentos no exterior - o que costuma desanimar os menos abastados. Para quem tem muito dinheiro, entretanto, essa pode ser uma forma interessante de diversificar suas aplicações.

Em geral, quem investe em fundos no exterior procura a ajuda de algum especialista capaz de selecionar as melhores aplicações. O cuidado é necessário devido à menor transparência dos fundos estrangeiros em relação aos brasileiros. Um fundo americano só precisa divulgar uma vez por trimestre suas posições. Essa brecha legal permitiu, por exemplo, que Bernard Madoff - um ex-presidente da Nasdaq - montasse um esquema de pirâmide que causou bilhões de dólares em perdas a quotistas de várias partes do mundo. Ao final de cada trimestre, Madoff simplesmente declarava aos órgãos reguladores que tinha vendido posições que, na verdade, nunca existiram - e conseguiu enganar um punhado de gente.

No Brasil, diversas empresas de gestão de recursos e bancos possuem profissionais especializados em analisar as estratégias de fundos estrangeiros. Arthur Mizne, sócio do M Square Fund, por exemplo, já visitou mais de 2.500 fundos de investimento no exterior. Durante essas viagens, ele busca entender a estratégia utilizada por cada gestor, encontrar quem possui as habilidades necessárias para ganhar mais dinheiro que a média e fugir das casas pouco transparentes ou com má reputação no mercado. Entre outras coisas, o trabalho inclui telefonemas para os ex-funcionários de um fundo para conhecer as práticas de investimento. Fundos menores, onde é possível esclarecer dúvidas diretamente com o gestor, costumam ser mais acionados. "Procuro gestores que saibam fazer algo difícil de imitar, mas fácil de entender", diz Mizne. O que sobra ao final dessa peneira são cerca de 25 fundos onde o M Square Fund aplica o dinheiro de seus clientes.


Via-crúcis

 

Encontrar um especialista para investir em um fundo no exterior, entretanto, é a parte mais fácil. O grande problema é enfrentar a via-crúcis burocrática e tributária imposta pela legislação brasileira. As leis são arcaicas e foram criadas com o objetivo explícito de desestimular remessas ao exterior. Quem quiser investir em fundos fora do país tem duas alternativas: comprar quotas de um fundo nacional que vai aplicar o dinheiro em ativos no exterior ou adquirir dólares e remetê-los a outro país por meio de uma instituição financeira para depois investi-los em algum fundo. O problema é que os dois caminhos são tortuosos.

Comprar quotas de um fundo brasileiro é menos burocrático. No entanto, a regulamentação criada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para investimentos no exterior fez com que poucos gestores atuassem nesse mercado. Somente os fundos classificados como de dívida externa - aqueles que aplicam em títulos públicos ou privados denominados em moeda estrangeira - podem aplicar 100% de seus recursos fora do país. Os fundos multimercados - uma das categorias mais populares no Brasil - só podem investir até 20% do patrimônio no exterior. Em todos os demais fundos, esse percentual cai para até 10%. A exceção fica por conta dos fundos voltados para investidores superqualificados - aqueles em que cada quotista entra com ao menos 1 milhão de reais. Para esses casos, a CVM não estipula limitações porque entende tratar-se de um investidor mais bem-informado e capaz de se proteger.

O outro caminho para investir no exterior por meio de fundos é encontrar um gestor lá fora e comprar as quotas. Logo de cara, já surge o primeiro problema. Quem tem o dinheiro no Brasil terá de fechar uma operação de câmbio e pedir para o banco onde possui conta fazer a remessa para uma de suas agências fora do país. O envio do dinheiro para um fundo não é tributado. O Imposto de Renda precisará ser pago sempre que houver ganho de capital com algum resgate. A alíquota é de 15% e a variação cambial entra na conta. Por exemplo, alguém que aplicou 100.000 dólares no exterior quando o dólar valia 1 real e resgatar 110.000 dólares quando dólar tiver subido para 3 reais terá de pagar à Receita Federal 34.500 reais (IR = (330.000 reais - 100.000 reais) X 0,15 = 34.500 reais). Eventuais prejuízos não geram créditos tributários para abater o imposto no futuro. O IR precisa ser pago no mês seguinte ao resgate. Se o contribuinte deixar para pagar quando trouxer os recursos de volta ao Brasil, terá de arcar com multa e juros.


Por todos esses motivos, o advogado tributarista Samir Choaib, sócio do escritório Choaib, Paiva e Justo, acredita que vale a pena abrir uma empresa no exterior sempre que a pessoa decidir aplicar a partir de 500.000 dólares por um longo período lá fora. Mesmo que o dinheiro seja resgatado e reaplicado diversas vezes, o pagamento do IR só será feito quando a empresa trouxer de volta os recursos ao Brasil - isso se houver lucro. Além disso, não há o chamado come-cotas nos fundos estrangeiros - os multimercados brasileiros precisam pagar IR sobre o lucro a cada seis meses mesmo que o dinheiro não seja resgatado. A desvantagem é que, no caso de empresas, a alíquota do IR sobe para 27,5% do ganho no exterior. Se houver prejuízo, entretanto, será gerado um crédito tributário para abater o imposto futuro. Por último, a empresa terá de contratar um contador no exterior para organizar suas contas.

O investimento em fundos no exterior ainda tem uma burocracia adicional. O cidadão que possui mais de 100.000 dólares fora do Brasil precisará entregar uma declaração anual ao Banco Central onde vai informar a quantidade de dinheiro que possui no exterior e em que países estão os recursos.

Então quando vale a pena?

Com tantos empecilhos, especialistas indicam que os brasileiros mantenham dinheiro aplicado no exterior em apenas duas situações. A primeira delas é para quem já enviou dinheiro para fora do país no passado e não planeja trazê-lo de volta porque pode precisar arcar com despesas em dólar no futuro. O outro caso é para uma possível inversão no fluxo de moeda estrangeira ao Brasil. Nos últimos anos, o dólar se desvalorizou muito, reduzindo o poder de compra local de quem comprou a moeda americana lá atrás. No entanto, com a expectativa de aumento do déficit brasileiro em conta corrente para 60 bilhões de dólares em 2010, já há no mercado quem acredite que o câmbio vai para cima em breve. "Se o dólar continuar em baixa, não é inteligente investir fora do país", diz Jan Karsten, diretor de investimento do Citibank no Brasil. "O Brasil vive um ótimo momento econômico e há muitas alternativas interessantes de investimento por aqui", diz .

Já Otávio Vieira, diretor de investimentos do Safdié Gestão de Patrimônio, afirma que a diversificação da carteira é o maior objetivo dos clientes que lhe procuram para investir no exterior. Um especialista que pediu para não ser identificado diz que, entre seus clientes, há uma empresa que terá de pagar um compromisso em coroas norueguesas dentro de alguns meses e não consegue fechar internamente um contrato que a proteja desse risco. Outro exemplo é de um empresário do setor siderúrgico que quer ter uma exposição em ações do setor de consumo na China e não encontra na bolsa brasileira opções de investimento. Ou então um rico empresário que já planeja sua sucessão financeira e soube que em algum país há uma legislação mais favorável para a transmissão de heranças. A partir desses exemplos, é possível inferir que investir no exterior é mesmo para poucos.

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