Minhas Finanças

Como adaptar a carteira de ações à alta dos juros

Sócio da Quest Investimentos diz a EXAME.com ter aumentado posições em bancos, empresas de consumo básico e ações mais defensivas

Walter Maciel, sócio-diretor da Quest Investimentos: gostamos de OGX e Cosan no setor de commodities (EXAME)

Walter Maciel, sócio-diretor da Quest Investimentos: gostamos de OGX e Cosan no setor de commodities (EXAME)

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Da Redação

Publicado em 1 de dezembro de 2010 às 05h24.

Com a inflação bastante próxima do teto da meta, o mercado já dá como certo que um novo ciclo de aumento de juros se avizinha. A única dúvida dos analistas é se o Banco Central começa a elevar a Selic ainda neste ano ou no começo do próximo. Mesmo com a dúvida, boa parte dos investidores já começou a preparar a carteira de ações para lucrar com esse novo cenário. Conhecida por ter como um dos sócios o ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros, a Quest Investimentos decidiu aumentar o peso de setores defensivos, dos bancos e das empresas de consumo básico na composição do portfólio. Já os setores que dependem de crédito como o de construção continuam na carteira, mas perderam peso. Desde que foi lançado em junho de 2005, o principal fundo de ações da Quest deu aos quotistas um retorno de 528% - contra alta de 172% do Ibovespa. A gestora de recursos administra 12 fundos que possuem um patrimônio total de 1,8 bilhão de reais. A seguir, o sócio-diretor da Quest, Walter Maciel, explica como a empresa planeja ganhar dinheiro na bolsa com o atual cenário:

EXAME.com - Como está o portfólio de ações da Quest?
Walter Maciel - Em primeiro lugar, é importante explicar que a Quest procura não se distanciar muito do Ibovespa. Se o setor de commodities representa 45% do índice, por exemplo, sempre terá também uma boa porção de nosso portfólio. Mas se acharmos que dentro do universo de matérias-primas há empresas que vão performar melhor, aumentamos o peso delas na carteira mesmo que isso vá no sentido contrário do Ibovespa. No geral, nossa posição em commodities está hoje um pouco abaixo de seu peso no índice. Um dos principais destaques nesse setor é a OGX. Lógico que também temos um pouco de Petrobras até para que nossos resultados não se descolem muito do índice em determinado mês. Mas é com a OGX que estamos mais otimistas no setor de petróleo.

EXAME.com - A aposta é que parte da OGX possa ser vendida como especula-se no mercado?
Maciel - Não, a Quest não compra ações com a expectativa de que determinados eventos aconteçam. A tese é de que a OGX é negociada com múltiplos muito mais baixos que pequenas companhias de petróleo estrangeiras. Se a empresa conseguir provar que possui só um terço das reservas que diz ter, a ação vai acabar subindo. Entendemos que é justo que o mercado conceda um desconto para as ações porque a empresa ainda está em uma fase pré-operacional. Isso é o que chamamos de "desconto do sonho". Mas estamos confiantes que o Eike Batista vai conseguir botar esse sonho de pé. As reservas da empresa estão em águas rasas, onde o risco de exploração é menor. E eles contrataram um monte de gente da Petrobras que sabe explorar petróleo.

EXAME.com - O que mais se destaca entre as commodities?
Maciel - Também gostamos da Cosan. Não é uma aposta na commodity açúcar. Na verdade, achamos que a área de distribuição de combustíveis ainda pode gerar mais valor para as ações [nos últimos anos, a empresa comprou a parte de distribuição da Esso e fez uma joint-venture com a Shell]. Também gostamos de CSN e Gerdau. E temos Vale, mas não é uma posição que eu destacaria no fundo.

EXAME.com - E como está o resto da carteira?
Maciel - Também estamos com um tamanho abaixo do Ibovespa em cíclicos locais. Decidimos deixar o portfólio mais conservador devido ao retorno da inflação e à expectativa de aumento dos juros nos próximos meses. Compramos mais ações do Pão de Açúcar e da Hypermarcas, que são empresas de consumo básico. Achamos que o Pão de Açúcar ainda é uma empresa defensiva mesmo com a compra do Ponto Frio e da Casas Bahia. Outras empresas de varejo dependem mais de crédito, assim como as incorporadoras. Quatro meses atrás, o setor de construção tinha um tamanho bem maior em nosso portfólio. Ainda estamos otimistas com a PDG e a Gafisa, que consideramos ter boa capacidade de execução. Gostamos da Rossi e achamos que a Cyrela sabe correr poucos riscos, mas nos múltiplos atuais preferimos as duas primeiras.


EXAME.com - O que mais está protegido da inflação no mercado interno?
Maciel - Gostamos das empresas de rodovias. O brasileiro está descobrindo que pode viajar. A inflação voltou, mas não há expectativa de alta dos preços da gasolina. Na mesma tese, a Localiza é outra empresa que vemos com bons olhos. As companhias aéreas também podem se beneficiar, mas nesse caso estamos de olho nas cotações dos papéis. Tínhamos Gol, mas reduzimos nossa posição há pouco tempo, quando as cotações subiram bastante. Se continuar a cair, podemos voltar a comprar.

EXAME.com - E as expectativas para bancos e setores defensivos?
Maciel - Estamos com uma posição acima da média nos setores defensivos, como energia e telefonia. A tese é mesma. A inflação não vai machucar essas empresas como outras ligadas ao mercado interno. Em relação aos bancos, gostamos muito do Bradesco e do Itaú Unibanco. Já fomos muito otimistas com Banco do Brasil, mas neste momento estamos um pouco receosos com a possibilidade de aumento da ingerência política no banco. Em relação ao Santander, achamos que a instituição não vai querer tomar muito risco no Brasil em um momento em que as coisas vão mal na Espanha. Achamos que as carteiras de crédito do Itaú e do Bradesco vão crescer mais rápido.

EXAME.com - A decisão de montar uma carteira de ações mais conservadora está relacionada somente à inflação ou também a problemas no exterior, como a dívida soberana dos países europeus?
Maciel - É inflação mesmo. Não achamos que os problemas na Europa vão contaminar demais o mercado brasileiro. Em relação aos EUA, estamos até mais otimistas que o resto do mercado. Achamos que eles voltarão a crescer mais rápido do que se imagina.

EXAME.com - A Quest acredita que o novo governo será capaz de fazer o necessário para que o país cresça e a bolsa continue a subir?
Maciel - A manutenção do forte crescimento vai depender de reformas microeconômicas. O país precisa de medidas que incentivem o empresariado a investir em infraestrutura. Como o eixo de crescimento mundial está se deslocando para a Ásia, o Brasil deveria desengavetar o projeto de construir uma saída para o Pacífico, que está parado há anos. O país precisa de uma ligação para um porto chileno e outra para um porto boliviano para não ficar na mão de ninguém. Essas obras reduziriam o custo de transporte das commodities brasileiras para a China e favoreceria a continuidade do crescimento. O problema é que o governo prefere incentivar um trem-bala que ninguém sabe se é viável economicamente.

EXAME.com - Em relação ao câmbio, o que é necessário fazer?
Maciel - Acho que o governo identificou o problema, mas a solução passa pelas reformas microeconômicas, e não por uma atuação direta no câmbio. Veja o que aconteceu quando o governo aumentou a alíquota do IOF para 6% no caso dos investimentos estrangeiros em renda fixa. O câmbio ficou no mesmo lugar em que estava, mas os juros pagos pelos títulos públicos de longo prazo subiram. O IOF não resolveu o problema do dólar e ainda criou um problema na área da dívida pública. Agora o Brasil precisa pagar juros maiores para encontrar demanda para seus papéis. Já com reformas microeconômicas, o Brasil poderia crescer mais sem que isso gerasse inflação. Os juros poderiam cair, o que ajudaria a reduzir a pressão cambial.


EXAME.com - Os primeiros sinais emitidos pelo governo fizeram a Quest ficar mais pessimista?
Maciel - Não veja ideologia em minhas informações. Como sócio de uma asset, meu papel é tentar ganhar dinheiro no mercado independentemente de qual seja o cenário. Inclusive nossa visão é de que o governo Lula fez várias coisas acertadas. Achamos que o PSDB não teria expandido o Bolsa Família e aumentado o salário mínimo como fez o governo Lula - e o PT acertou nesses pontos. Foi o crescimento da renda da população e do consumo interno que levaram o país para frente. O que a gente não sabe responder é se a conjuntura será tão benéfica para a Dilma como foi para o Lula.

EXAME.com - Por quê?
Maciel - O crédito saiu de 20% para 50% do PIB sob o atual governo e ninguém acha que dá para levar para 75% do PIB no próximo. Seria uma loucura. Ainda há espaço para o crédito imobiliário crescer muito, mas já há alguma saturação em outros segmentos. Os gastos públicos também não poderão mais se expandir demais se o governo quiser baixar os juros. Então não há muito espaço para ampliar os programas sociais.

EXAME.com - No que as Quest se diferencia das outras assets do mercado?
Maciel - Acho que olhamos melhor como a macroeconomia vai influenciar os negócios das empresas. Muitos concorrentes ficam o tempo todo analisando quais são as melhores empresas da bolsa. Eles acham que o trabalho do gestor é identificar quem é bom no mercado e ficar comprado cinco anos naquele papel até ganhar dinheiro. Nada contra quem faz isso, é importante mesmo fazer uma análise apurada dos papéis que entrarão na carteira. Mas nós achamos que eles olham muito para a árvore ao invés de observar o que está acontecendo na floresta. A Quest acredita que só analisando o cenário macroeconômico é possível comprar e vender um papel na hora certa.

EXAME.com - Quando se administra muitos milhões de reais em fundos de ações, é possível ter esse agilidade?
Maciel - Nossa política exige mesmo um giro um pouco mais elevado da carteira. Então quase que só investimos em papéis com boa liquidez. O lado bom é que eu posso vender todo o nosso portfólio de ações em dois dias. Como o investidor brasileiro é muito "curtoprazista", não teremos nenhum problema se algum dia grandes quotistas quiserem resgatar o dinheiro. Renomadas casas de administração de recursos tiveram problemas de liquidez quando veio a crise de 2008. Nós não corremos esse risco.

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