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Com o dinheiro dos outros

Os fundos imobiliários possibilitam ao investidor comum virar dono até de centro de exposições

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h33.

O Parque Anhembi, o mais movimentado centro de exposições do país -- recebe 6 milhões de visitantes por ano --, deve ganhar um vizinho até o fim de 2003. Um complexo arquitetônico será construído ao seu lado e acrescentará novos centros de exposições, de convenções e de conveniência. Ao contrário do atual Anhembi, de propriedade da prefeitura de São Paulo, o novo terá vários donos -- milhares deles, desde que se disponham a investir no mínimo 51 000 reais para se tornar sócios do empreendimento. Quem fizer isso estará apostando num negócio de longo prazo por meio de um instrumento que começa a ganhar força no Brasil: os fundos imobiliários.

Com um espaço previsto de quase 70 000 metros para locação, o Novo Anhembi pretende criar uma sinergia com o parque existente para disputar o mercado de feiras internacionais. Seus empreendedores -- a Construtora São José e a empresa de promoção de eventos Alcântara Machado -- não terão de colocar necessariamente a mão no bolso para bancar os quase 200 milhões de reais de investimentos. O projeto tampouco será financiado por um ou dois megainvestidores. "Quem vai financiar é o poupador comum", diz Tomás de Salles, diretor de novos negócios da Lopes Consultoria de Imóveis, responsável pela assessoria de vendas.

Lançado em maio, em menos de dois meses o fundo Novo Anhembi vendeu 12% de suas cotas. Para participar, cada investidor precisa desembolsar no mínimo 51 000 reais (parcelados em 22 meses), o que lhe permite comprar um lote de 49 000 cotas. "Acreditamos que o empreendimento poderá ser financiado por cerca de 3 000 investidores", diz Rossano Nonino, diretor da Mercúrio DTVM, gestora do fundo. O retorno dos cotistas vai depender da receita com as locações do Novo Anhembi, que já tem 39 feiras agendadas para 2004 e 2005.

Pelo menos 20% dos investidores do Novo Anhembi adquiriram cotas de outros fundos imobiliários e, portanto, já conhecem o produto. Mas a maioria é formada por marinheiros de primeira viagem, seduzidos pela agressiva campanha de divulgação do fundo e pelo glamour de se tornar donos de um empreendimento de grande porte. "O Novo Anhembi vai ajudar a promover a indústria de fundos imobiliários, pois projetos iguais a ele são raros", diz o executivo Gerson Luiz Bendilati, diretor de incorporação da InPar. Bendilati conhece bem esse mercado: está preparando uma nova emissão de cotas, no valor de 26,5 milhões de reais, para complementar o fundo imobiliário que financiará parte do Continental Square Faria Lima, um conjunto imobiliário de alto padrão que reúne flats, escritório comercial e um hotel Caesar Park, arrendado para o grupo Posadas.

Novos fundos

Para ter uma idéia do dinamismo desse mercado, a Mercúrio, que pertence ao grupo Rio Bravo Investimentos, vem trabalhando na estruturação de outros três fundos além do Novo Anhembi e pretende lançá-los nos próximos seis meses. Maior gestora de fundos imobiliários do país, a Mercúrio administra atualmente 14 fundos, com um patrimônio de 700 milhões de reais. "Os fundos vão substituir a forma tradicional de comprar imóveis no Brasil", afirma Nonino.

As perspectivas são boas, mas a realidade dos números mostra um mercado ainda incipiente. "A participação dos fundos na indústria imobiliária da Grande São Paulo não passa de 5%", diz Ricardo Pereira Leite, diretor de novos negócios da Tecnisa Engenharia e Construção. "Se considerarmos apenas os empreendimentos corporativos, essa participação sobe para algo entre 10% e 15%." Um dos motivos para a falta de fôlego demonstrada até agora é a dificuldade para assegurar um produto rentável para o investidor e, ao mesmo tempo, manter uma margem adequada para o empreendedor. "Isso é algo impossível nos dias de hoje por causa das elevadas taxas de juro", diz Leite.

De origem americana, os chamados real estate investment trust, ou fundos imobiliários, surgiram na década de 60. Nos Estados Unidos, já acumulam um patrimônio de 150 bilhões de dólares. No Brasil, os primeiros fundos começaram a aparecer só em 1993, mas deles participavam apenas grandes investidores, empresas e fundos de pensão, que se associavam para usufruir as vantagens fiscais oferecidas pelo produto. Em 1999, mudanças na legislação restringiram esses benefícios a fundos lançados dentro do modelo americano, ou seja, com cotas pulverizadas para o maior número possível de investidores. Foi a partir daí que surgiram os primeiros fundos destinados ao varejo, entre eles os do Shopping Pátio Higienópolis e os do JK Financial Center. Em 2000, foram lançados também no mercado paulistano os fundos do Hospital da Criança e do Centro Empresarial Parque da Água Branca. No primeiro semestre de 2001, foi a vez do fundo do Continental Square Faria Lima, com a primeira emissão de cotas, no valor de 49 milhões de reais. Além de planejar uma nova emissão para dar continuidade ao empreendimento, a InPar pretende lançar outro fundo imobiliário para bancar parte da construção de dois edifícios no bairro de Moema, um investimento estimado em 110 milhões de reais. E mais: o fundo de pensão dos funcionários da Caixa Econômica Federal (Funcef) venderá parte de sua participação em agências da instituição por meio de fundos imobiliários. A Funcef negocia a emissão de cotas de até 1 000 reais de um fundo lastreado em 400 milhões de reais em imóveis. É uma operação de grande porte, mas com cotas de pequeno valor, o que deve aumentar a liquidez do mercado.

Quer ter um galpão?

Os recursos captados pelos fundos imobiliários são aplicados tanto em imóveis em construção como nos já concluídos. E não apenas em empreendimentos como shopping centers, escritórios comerciais e hotéis. Há investimentos sendo feitos também em centros de distribuição e logística, como é o caso do fundo imobiliário Europar. Lançado em maio, é o primeiro no Brasil registrado na bolsa de valores. Quando o investidor quiser vender cotas já adquiridas ou comprar novas, poderá fazê-lo por intermédio de corretoras credenciadas pela bolsa. É uma novidade que pode ajudar a atrair novos investidores. O rendimento dos cotistas vem da locação de cinco centros de distribuição e logística e de um edifício de alta tecnologia localizados no eixo Rio-São Paulo. Todos estão prontos e alugados para grandes empresas, como FedEx, Cesa S.A., Belt Logistics e Expresso Mercúrio. Apesar de acessível ao bolso do poupador médio -- o investimento mínimo é 10 000 reais --, o desafio é vender um produto tão empresarial. "Às vezes, é difícil para o investidor entender que não se trata de meros galpões", diz o empresário Élbio Fernandez, da Fernandez Mera, responsável pela assessoria imobiliária do empreendimento.

Ao lançar o Europar, o empresário português Antônio Marques Varela não viu impedimento algum nessa falta de intimidade do público com um negócio tão especializado. Presidente do grupo Tiner, um conglomerado de 12 empresas dos setores de construção, agropecuária e aeronáutica, com um faturamento anual de 100 milhões de dólares, Varela trouxe para o Brasil sua experiência na incorporação de imóveis por meio de fundos imobiliários, os quais hoje acumulam um patrimônio de 1 bilhão de dólares. Há quatro anos no país, Varela investiu 50 milhões de dólares na compra de terrenos e na construção dos centros de logística que agora integram o fundo Europar. "Esperamos que o fundo, hoje de 44 milhões de reais, chegue a 1 bilhão de reais em dez anos", diz Varela. Até o fim do ano, ele pretende concluir três outros projetos para a construção de centros de logística, escritórios e residências, com um investimento previsto de 250 milhões de dólares.

Na mesma linha do Europar, a incorporadora Tishman Speyer-Método lançou, no fim do ano passado, um fundo imobiliário lastreado na participação de 16,17% que possui na Torre Norte do Centro Empresarial Nações Unidas. O fundo, no valor de 64 milhões de reais, requer um desembolso mínimo de 50 000 reais dos investidores. "Estudamos fazer o mesmo com o Rochaverá Plaza", diz o executivo Daniel Citron, presidente da Tishman Speyer-Método, referindo-se ao complexo de escritórios de alto padrão que começou a ser construído em dezembro de 2001 perto do MorumbiShopping. As duas primeiras torres, com custo estimado em 100 milhões de dólares, devem ficar prontas em 2003. Se esse fundo se concretizar, será uma chance para pequenos e médios investidores se tornarem sócios de um dos maiores edifícios corporativos da metrópole.

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