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Brasil está entre campeões de cesárea – e bem longe de mudar

Diversas iniciativas têm surgido para reduzir a alta taxa de cesáreas no país, que é a segunda maior do mundo, mas resultados ainda não são animadores


	Recém-nascido: medidas que visam reverter alta taxa de cesáreas são ineficazes, diz Febrasgo
 (Thinkstock/praisaeng)

Recém-nascido: medidas que visam reverter alta taxa de cesáreas são ineficazes, diz Febrasgo (Thinkstock/praisaeng)

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Da Redação

Publicado em 17 de maio de 2016 às 08h36.

São Paulo – Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o segundo país com maior percentual de partos realizados por cesárea do mundo (55,6%) e só perde para a República Dominicana, onde a taxa chega a 56,4%. Diante do alto índice de cesáreas no país, e dos seus prejuízos para a saúde da mãe e do bebê, diversas iniciativas têm surgido na tentativa de incentivar a realização de partos normais, mas por enquanto sem muito sucesso.

Segundo dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a situação é ainda mais dramática no âmbito da medicina privada: 85,5% dos partos são realizados por cesárea no sistema de saúde suplementar, quando o ideal para o Brasil seria uma taxa entre 25% e 30%, conforme orientação da OMS.

A alta taxa de cesáreas no país, assim como os elevados custos para a realização dos partos, foram abordados em detalhes em outras duas reportagens, que fazem parte deste especial de EXAME.com sobre os altos custos dos partos no Brasil. Veja o conteúdo na íntegra.

Diversas pesquisas e declarações da ANS e da OMS mostram que o parto cirúrgico tem sido realizado com frequência sem necessidade e revelam que a cesariana marcada pode dificultar a amamentação, gerar problemas de saúde para a mãe, e provocar o nascimento prematuro do bebê, elevando o risco de óbito neonatal.

A mais recente iniciativa no sentido de inibir a realização de cesáreas no país é o protocolo criado pelo Ministério da Saúde em abril deste ano. Ele define melhores práticas para os procedimentos de partos – a serem seguidas pelas secretarias de saúde dos estados e municípios – e torna obrigatória a conscientização da gestante, pelos médicos, sobre os riscos da cesárea.

Em fevereiro deste ano, a ANS também promulgou a Resolução Normativa (RN) número 398, como resultado de uma determinação do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.

A RN obriga operadoras de planos de saúde e hospitais a contratarem obstetrizes e enfermeiros obstétricos (profissionais que cursam faculdades especializadas na realização de partos, mas não são formados em medicina) em sua rede assistencial, quando houver disponibilidade, já que nem todas as regiões possuem profissionais com esse tipo de formação.

A resolução determina, ainda, que médicos deverão entregar às pacientes a Nota de Orientação à Gestante, que esclarece os riscos e benefícios da cesariana e do parto normal.

Em julho do ano passado, como resultado de uma ação civil pública do Ministério Público Federal, a ANS promulgou outra Resolução Normativa, número 368, que obriga as operadoras a divulgarem os percentuais de cesáreas e partos normais por hospital e por médico. Ela também passou a exigir que os obstetras utilizem o Partograma, documento gráfico no qual é registrado tudo que acontece durante o trabalho de parto. 

Em novembro, o MPF também havia determinado, por meio de uma ação civil pública, que a ANS deveria obrigar as operadoras a pagar pelos partos normais “honorários médicos de, no mínimo, o triplo do valor atribuído à cesariana”.

No entanto, a determinação foi suspensa pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (2ª instância) que considerou que a medida demandava “acentuado grau de interferência no equilíbrio econômico da relação entre o consumidor e a operadora”.

Recém-nascido na UTI neonatal: cesáreas podem prejudicar amamentação e gerar problemas de saúde para a mãe e o bebê (Thinkstock/mvaligursky)

Medidas são paliativos, diz Febrasgo

César Eduardo Fernandes, presidente da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetricia (Febrasgo), diz que as novas resoluções não alteram as regras do jogo. Ele afirma que os obstetras sempre fizeram um registro sobre a evolução da gravidez de suas pacientes. A única diferença é que o Partograma talvez padronize um pouco mais as informações.

Sobre as diferenças entre remunerações da cesárea e do parto normal, Fernandes acredita que a medida poderia ter efeito reverso: “Eu tenho medo de que, em vez de elevar o honorário para o parto normal, os planos peguem o valor atual da cesárea e dividam por três para conseguir pagar a remuneração três vezes maior ao parto normal sem gastar mais dinheiro”. 

Ainda que a medida esteja suspensa, ao menos por ora, gestantes relatam que com a cobrança do Partograma e a obrigação de divulgação da taxa de cesáreas, um novo problema surgiu: além de não realizarem os partos normais pelo convênio, alguns médicos passaram a evitar também a realização de cesárea pelos planos de saúde.

Fernandes também faz vista grossa para a divulgação do percentual de cesáreas e partos normais realizados por cada médico. “Falaram-se obviedades nessas medidas, como se a normatização da ANS melhorasse o problema. De que adianta carimbar o médico, dizendo sua taxa de cesárea? Por que a ANS não pune as maternidades que não têm estruturas?”, diz o presidente da Febrasgo.

Ele acrescenta que o problema deveria ser resolvido com medidas que incentivem melhor remuneração para os médicos e melhores condições nos hospitais, com mais quartos para partos normais, equipes de enfermaria preparadas para esse tipo de parto, além de médicos anestesistas e obstetras de plantão na maternidade.

“A ANS não deveria punir ainda mais os médicos. Ela deveria melhorar suas remunerações para incentivar a formação de novos obstetras, já que, diante de todos os problemas, eles estão começando a rarear no mercado. O grande problema é a falta de leitos para fazer o parto normal nas maternidades, não são os médicos”, diz Fernandes.

Tanto o presidente da Febrasgo, quanto a ANS, defendem que a reversão da alta taxa de cesáreas depende de uma mudança estrutural, envolvendo médicos, planos de saúde e hospitais. Mas enquanto Fernandes diz que o aumento dos honorários pagos aos médicos pelos planos é essencial para a resolução do problema, a ANS diz que a questão não é tão relevante (veja mais detalhes na matéria que explica os fatores que impulsionaram a taxa de cesáreas no país).

Para a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que representa algumas das maiores operadoras de planos de saúde do país, a solução do problema passa pela conscientização da sociedade e da classe médica.

Segundo a entidade, as operadoras de planos de saúde não exercem nenhuma pressão para a realização de cesáreas. “Ao contrário, não é de seu interesse defender ou estimular o parto cirúrgico – que, inclusive, gera mais riscos à saúde de mães e bebês, além de ser bem mais oneroso, com os excessos de cirurgias impactando o sistema mantido pelos beneficiários dos planos”, disse a FenaSaúde por meio de nota.

Projeto parto adequado

Outra iniciativa que tem o objetivo de reverter a alta taxa de cesáreas no Brasil é o Projeto Parto Adequado, criado pela ANS em 2015, em parceria com o Hospital Israelita Albert Einstein e o Institute for Healthcare Improvement (IHI), organização sem fins lucrativos americana que tem o objetivo de testar novos modelos de procedimentos médicos em busca das melhores práticas na área de saúde.

O programa envolve 40 hospitais privados e públicos e visa promover melhorias na infraestrutura hospitalar e nos processos de trabalho, com a incorporação de equipes multiprofissionais, capacitação dos profissionais para ampliar a segurança na realização do parto normal e a revisão das práticas relacionadas ao atendimento das gestantes e bebês, desde o pré-natal até o pós-parto.

Antes de dar início ao projeto, os hospitais e maternidades participantes apresentavam uma taxa média de partos normais de apenas 22%. Passados 12 meses, o grupo registrou um aumento de nove pontos percentuais na taxa de partos normais, que passou a ser de 31%, em média, sendo que 21 deles já atingiram taxas de partos normais de pelo menos 40%. 

Seis hospitais do projeto também conseguiram diminuir as internações em UTI neonatal, com reduções que variaram de 29% a 67%. Conforme ressalta a ANS, além de trazer riscos para o bebê, a internação em UTI neonatal eleva os custos hospitalares.

Também participam do projeto 32 operadoras de planos de saúde, que apoiam a iniciativa de três formas: orientando beneficiárias que desejam realizar o parto normal; com a criação de uma página em seus sites chamada Espaço Parto Adequado; e com a avaliação de viabilidade financeira dos modelos a serem implementados nos hospitais apoiados para a elevação da taxa de partos normais.

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