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Bovespa, 50 mil pontos, precisa enfrentar desafio da popularização

Bolsa paulista chega aos 50 mil pontos e bate recordes de rentabilidade, mas lucros ainda estão concentrados nas mãos de poucos

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h34.

Campeã de rentabilidade nos últimos anos e recém-chegada à marca histórica dos 50 mil pontos, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) ainda precisa vencer o desafio de tornar-se mais plural e popular. Hoje o mercado financeiro brasileiro permanece como um tabu para mulheres, pessoas de renda mais baixa e moradores de estados fora do eixo Rio-São Paulo. É verdade que o número de investidores experimentou um boom e triplicou no últimos sete anos. O total de 241 mil pessoas físicas, entretanto, representa apenas 0,13% da população brasileira. Além disso, o perfil do negociador de ações pouco tem se alterado. Segundo números da Bovespa, 75,8% dos negócios são realizados por paulistas e fluminenses - os demais 24 Estados e o Distrito Federal juntos respondem por menos de 25% do volume girado. Já os homens representam 78,4% dos investidores com ações custodiadas pela bolsa - número que tem caído menos de 1 ponto percentual ao ano. A Bovespa não tem dados sobre a renda média do investidor, mas a Itaú Corretora, uma das maiores do mercado, afirma que metade de seus clientes têm conta no Itaú Personnalité, unidade do banco voltada para pessoas com renda mensal superior a 5 mil reais.

Com mais de 30 anos de experiência, o diretor-superintendente da Associação Nacional de Corretoras de Valores, Câmbio e Mercadorias (Ancor), Gilberto Biojone, compara o mercado financeiro brasileiro à rede de lojas Tamakavy, aposta fracassada do apresentador Silvio Santos no segmento de varejo. Apesar de vender móveis para um público popular, a rede abriu lojas com uma aparência sofisticada que acabaram vendidas para a Casas Bahia no final da década de 80. "As pessoas olhavam aqueles estabelecimentos bonitos e arrumados e associavam com algo caro, fora de alcance. A mesma coisa acontece com as corretoras. O cidadão comum pensa que negociar ações é difícil, complicado, só para ricos", afirmou. "Parte da culpa é das próprias corretoras, que vivem repetindo que há risco no investimento em ações. Há risco mesmo, mas também há o melhor retorno dos últimos anos."

O presidente da Itaú Corretora, Roberto Nishikawa, também vê grande potencial de crescimento. Ele estima em 3 milhões e 4 milhões de brasileiros o público-potencial do mercado acionário. Segundo ele, há alguns anos faltava apenas a queda da taxa dos juros para a bolsa deslanchar. Mas com a Selic (taxa básica da economia) a 12,5% ao ano e tendência de baixa, ele acredita que dentro de cinco anos a bolsa possa ter 1 milhão de investidores pessoas físicas. "Antes estava muito fácil conseguir uma rentabilidade de até 20% ao ano. Bastava deixar o dinheiro em um fundo de renda fixa que os juros altos garantiam esse retorno", afirmou. "É preciso criar uma nova cultura entre investidores."

Esse fenômeno aconteceu na Espanha durante a década de 90. Para ingressar na União Européia, a Espanha teve que aproximar suas taxas de juros reais, então em dois dígitos, para patamares mais próximos dos outros países do bloco econômico. O resultado foi que em poucos anos o percentual de recursos aplicados em renda variável cresceu de 5% para 25% do total depositado em fundos no país. No Brasil, apenas 9,1% dos investimentos estão aplicados em fundos de ações, segundo números da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid). "Acredito que estamos prestes a observar no Brasil o mesmo fenômeno que ocorreu na Espanha, desde que os juros continuem em queda", afirmou Nishikawa.

Da mesma forma que ajudou muita gente a fazer fortuna, o mercado financeiro também já corroeu poupanças de uma vida toda. As corretoras, no entanto, não acreditam que o mercado acionário seja complexo demais para o cidadão brasileiro médio. Hoje as grandes corretoras ajudam seus clientes a decidir qual ação comprar entre os centenas de papéis que circulam no pregão. Analistas preparam relatórios sobre empresas em que avaliam o potencial de valorização e os riscos das ações com maior liquidez - e a remuneração desses profissionais costuma variar de acordo com o índice de acerto de suas análises. Para os investidores com menor experiência, uma boa dica é seguir a carteira das principais recomendações de sua corretora. Os mais experientes, no entanto, podem se aventurar a fazer suas próprias análises. Dependendo de quanto dinheiro tem o cliente e de quanto está disposto a gastar para manter-se informado e fazer a melhor compra, as corretoras podem colocar à disposição do investidor um analista para tirar dúvidas por meio de telefone ou chat. Outras informações importantes, como cotações on-line, book de ofertas, gráficos e fóruns estão disponíveis nos sites das corretoras para auxiliar o investidor.

Os bancos, entretanto, não costumam ser tão agressivos para vender serviços de corretagem como são com fundos de previdência, seguros ou financiamento imobiliário, por exemplo. A explicação é que hoje o cliente muitas vezes pode render mais ao banco se investir em um fundo administrado pela instituição do que se for às compras diretamente na Bovespa. Com o crescimento do home broker, o sistema on-line de negociação de ações, as corretoras puderam reduzir as comissões sensivelmente. Hoje já há corretoras que cobram comissões de 10 reais por ordem de compra ou venda independente do valor da operação e sem taxa de custódia - vale lembrar que outros serviços além da tecnologia para dar a ordem costumam custar mais. Mesmo assim, se o cliente comprar em uma ordem 10 mil reais, por exemplo, pagará nesse caso uma comissão equivalente a 0,1%. Enquanto isso, muitos fundos de investimento cobram taxas de administração que ultrapassam 4% ao ano. Como a maioria dos investidores pessoas físicas não são muito ativos e fazem no máximo dois negócios por mês, apostando no longo prazo, os fundos acabam sendo mais rentáveis para as instituições financeiras.

Se por um lado a negociação com ações já não exige uma poupança inicial alta e oferece boas oportunidades de rentabilidade, é recomendável que os investidores adquiram um mínimo de conhecimento sobre o funcionamento do mercado financeiro antes de começar a negociar ações. A própria Bovespa tem desempenhado importante papel nesse esforço de ampliação da cultura do mercado acionário. O projeto Educar, por exemplo, oferece seis cursos gratuitos a interessados em aprender mais sobre economia e também sobre a negociação de ações. As inscrições podem ser feitas por meio do site da Bovespa. Em um ano, o programa atendeu 40 mil pessoas em São Paulo, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Fortaleza e Curitiba. O curso faz tanto sucesso que há 50 mil pessoas na fila para aulas futuras. A espera mínima para conseguir uma vaga alcança três meses. "Esse curso ajuda a criar nas pessoas a cultura da poupança e do investimento", afirma Luis Abdal, assessor de marketing da Bovespa. Outro programa de bastante sucesso, esse mais voltado para captação imediata de investidores, é o Bovespa Vai até Você. Profissionais da bolsa vão a empresas, sindicatos, estações de metrô, supermercados e até mesmo cidades longínquas para apresentar para a população as oportunidades do mercado acionário. Pesquisa interna da Bovespa mostra que um terço das pessoas que conhecem o programa se interessam e procuram posteriormente mais informações sobre como começar a investir. A Bovespa ainda agenda palestras para grupos, atende pessoas no espaço onde funcionava o antigo pregão viva-voz em sua sede no centro de São Paulo, disponibiliza biblioteca e organiza até programas educativos e competições para jovens para aumentar o conhecimento da população sobre o mercado. Para quem deseja obter conhecimentos mais avançados, corretoras, associações e escolas de ensino disponibilizam cursos periódicos que ajudam pessoas a tornarem-se investidores profissionais.

O aprendizado na área de finanças pode levar anos ou até mesmo décadas. Em situações de crise até os mais experientes profissionais são levados a adotar posições conservadoras no mercado. Se o Brasil conseguir manter o crescimento sustentado, no entanto, o mercado financeiro pode oferecer boas oportunidades para melhorar sua situação financeira.

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