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Além de objeto de desejo, luxo agora é investimento

Impulsionados pela demanda dos emergentes, artigos de luxo, como vinhos finos e arte, destacam-se não só em vendas, mas também por sua rentabilidade

O capitalismo, com sua criatividade e rapidez características, não tardou em ver no mercado de luxo uma oportunidade de ampliar os ganhos (Fernando Lemos/VEJA Rio)

O capitalismo, com sua criatividade e rapidez características, não tardou em ver no mercado de luxo uma oportunidade de ampliar os ganhos (Fernando Lemos/VEJA Rio)

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Da Redação

Publicado em 23 de janeiro de 2012 às 09h27.

Desde 1975, a renomada vinícola Château Mouton Rothschild, da região francesa de Bordeaux, convida, a cada safra, um artista famoso para desenhar o rótulo da bebida que leva seu nome. Já aceitaram a tarefa expoentes do mundo das artes como Joan Miró, Pablo Picasso e Andy Warhol.

Em 2008, a vinícola decidiu chamar para participar da série o renomado pintor Xu Lei, da China. Foi uma estratégia bem pensada, pois, além de oito ser o número de sorte do país, os chineses vinham ganhando destaque enquanto consumidores de vinho. Assim que as primeiras garrafas foram colocadas à venda, os preços saltaram de 400 euros para 800 euros a unidade em apenas três meses.

Essa magnífica valorização, graças ao impulso dado pelos novos consumidores emergentes, não é exceção entre produtos fetiche das classes mais abastadas, como bebidas finas, obras de arte, carros de luxo, etc. O capitalismo, com sua criatividade e rapidez características, não tardou em ver aí uma oportunidade de ampliar os ganhos.

Com isso, belos quadros e bebidas deliciosas ficam temporariamente afastadas do deleite do consumidor para serem armazenadas e representadas por um papel (que comprova o investimento). Aquele 'recibo' é o registro de posse de uma quota daqueles bens, que, com o passar do tempo, tende a se valorizar. Nos últimos anos, inclusive, com a demanda fortíssima e uma estrutura produtiva limitada, os preços sobem com vigor – o que faz destas aplicações campeãs de rentabilidade. São os chamados passion investments.

Para fazer parte do grupo dos que aplicam nestes bens é preciso, primeiramente, ter bastante dinheiro. Ao adquirir uma cota de um fundo de vinhos, por exemplo, o investidor leva para casa apenas um comprovante da operação. Nada de degustação. As garrafas que compõem as carteiras são previamente selecionadas por equipes de especialistas em finanças, enófilos e traders. Elas ficam devidamente armazenadas em ambientes seguros – e caros – com climatização especial em Bordeaux, na França, a milhares de quilômetros da maioria dos investidores. A lógica de aplicação em outros artigos finos é semelhante.

O efeito China – O episódio do Château Mouton Rothschild 2008 ilustra como o enriquecimento e a crescente demanda das nações em desenvolvimento, sobretudo da China, têm impulsionado o mercado internacional de ativos de luxo. Em 2010, os leilões de vinhos finos da prestigiada Sotheby’s somaram 88,3 milhões de dólares – seu melhor resultado em 40 anos de operação. Só as vendas no leilão organizado em Hong Kong cresceram 268%.

Desde 2005 até o ano passado, os preços dos vinhos da região de Bordeaux – considerados “investíveis” por oferecerem perspectiva de valorização no longo prazo – tiveram uma alta de 148%, aponta o índice Liv-ex Fine Wine Investable, medido pela Liv-Ex (bolsa de vinhos sediada em Londres). “Percebemos que, para cada ponto porcentual acima de 7% que cresce o PIB chinês, esse índice sobe 10%”, relata Filipe Albert, gestor do Bordeaux Wine Fund Multimercado, o primeiro fundo brasileiro dedicado a vinhos, da gestora Cultinvest.

Não somente os vinhos finos usufruem da onda de prosperidade que aportou no mundo em desenvolvimento. Enquanto o S&P 500 – índice das 500 principais ações negociadas nas bolsas de valores norte-americanas – caiu 1,3% em 2011, na esteira das incertezas que rondam a economia dos Estados Unidos, as vendas nos leilões de arte contemporânea da Sotheby’s e da Christie’s aumentaram 35%. O mercado global de obras de arte, aliás, atingiu recorde de faturamento de 10,7 bilhões de dólares no ano passado, segundo a Artprice, que compila resultados de leilões em todo o planeta. A China representou entre 35% e 40% desse valor e se tornou o maior mercado internacional de arte.


Diversificação – Toda essa pujança tem estimulado investidores a considerar a diversificação de suas carteiras. Com as ações muito voláteis e os títulos de dívida dos países desenvolvidos com rentabilidade baixíssima, não surpreende que os investidores procurem outros lugares para seu dinheiro – e é compreensível que pensem no retorno não só em termos financeiros, mas também emocionais. Se bem que, há de se fazer a ressalva, as ações dos grandes grupos de luxo têm se destacado por sua apreciação (também na esteira da demanda dos emergentes). Índice desenvolvido pela Cultinvest com os principais papéis do setor teve valorização de quase 180% em seis anos (veja quadro).

De acordo com a última pesquisa sobre riqueza global do banco Merrill Lynch e da consultoria Capgemini, a arte é vista cada vez mais como uma forma de investimento. “Os novos ricos chineses são apontados como compradores entusiastas nos leilões, sobretudo do estoque em franca diminuição de obras de artistas nativos”, aponta o relatório. Outros emergentes, incluindo Rússia, Índia e nações do Oriente Médio, também são apontados como bons compradores de joias, relógios raros e carros antigos.

Participação brasileira – O Brasil não ficou fora dessa onda. Mais difundidos lá fora, os passion investments estrearam no país por meio de dois fundos que começaram a operar no ano passado. Além do Bordeaux Wine Fund Multimercado, da Cultinvest, houve o lançamento do Brazil Golden Art (BGA), da Plural Capital, que investe em arte contemporânea brasileira. Ambos são voltados a investidores nacionais.

Embora a cota mínima para entrar nesse clube faça com que o investimento fique acessível somente a investidores qualificados – 1 milhão de reais para o de vinhos e 100.000 reais para o de arte –, a procura pelos fundos surpreendeu. “Em quinze dias já tínhamos captado nossa meta, de 40 milhões de reais”, conta Heitor Reis, um dos responsáveis pelo BGA, com extensa experiência na direção de museus. “Depois da última exposição que fiz aos investidores em dezembro, recebo dezenas de e-mails de gente querendo participar”, completa.

A euforia dos interessados é compreensível. Algumas obras de artistas brasileiros contemporâneos tiveram valorizações muito expressivas na última década. O preço da obra Azulejaria em Carne Viva, da artista plástica Adriana Varejão, por exemplo, subiu quase 5.000% em dez anos. “A demanda tem sido tão grande que estamos estudando a criação de um segundo fundo neste ano voltado para arte latino-americana”, diz Reis.

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