Cartão de crédito: adesão compulsória ao cadastro positivo faz parte do pacote de incentivos anunciado pelo governo (Getty Images/Getty Images)
Marília Almeida
Publicado em 16 de dezembro de 2016 às 18h00.
Última atualização em 16 de dezembro de 2016 às 18h22.
São Paulo - Para especialistas, a adesão automática ao Cadastro Positivo, banco de dados que inclui informações sobre consumidores que estão com as contas em dia e pode ser consultado por bancos e lojas, terá pouco efeito na redução dos juros e no volume de empréstimos.
Todos os brasileiros com CPF serão incluídos automaticamente no Cadastro Positivo a partir da edição de uma medida provisória, ainda sem data para ser publicada, conforme informações do Ministério da Fazenda. No entanto, quem quiser poderá solicitar sua exclusão do cadastro.
A medida foi anunciada nesta quinta-feira (15) pelo governo federal e faz parte de um pacote de incentivos à economia. Até hoje, a inclusão no cadastro, em vigor desde 2013, era voluntária.
Para o advogado especialista em direito do devedor, Ronaldo Gotlib, o Cadastro Positivo apenas formaliza algo que já existe: a investigação do histórico de crédito dos clientes.
Com base nessa consulta, os bancos criam uma classificação, o chamado score. Quanto melhor a classificação nesse ranking, mais o cliente é definido como um bom pagador. "Todo mundo sabe que se ficar com o nome sujo vai ter sua classificação reduzida no banco para obter novos empréstimos no futuro".
Já para Ione Amorim, economista do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a medida provoca preocupação, já que persiste a falta de transparência sobre o modelo.
"Esse tipo de banco de dados é bem desenvolvido em outros países porque existem regras claras sobre quais dados serão analisados pelas instituições financeiras e de que forma. A falta de clareza sobre pontos como o sigilo bancário, critérios para concessão de crédito e a privacidade dos dados limitaram a adesão ao cadastro até agora".
A expectativa é de que os bancos, ao saberem quais clientes são bons pagadores, consigam dar mais crédito e financiamentos para este público, além de melhores condições de pagamento dos empréstimos, como juros menores e prazos mais longos.
Isso porque a instituição financeira terá mais segurança ao emprestar, já que poderá avaliar melhor o risco da operação. Com crédito mais barato e facilitado, a expectativa é que o endividamento dos clientes diminua.
No entanto, os especialistas colocam em dúvida esses benefícios. "Novas empresas de tecnologia já conseguem cobrar a metade dos juros no cartão de crédito que a média verificada nos grandes bancos. Será que a falta de informações sobre os clientes é o único motivo pelo qual os empréstimos são caros?", questiona Ione.
Para Gotlib, não é a adesão forçada ao banco de dados de bons pagadores que fará com que o endividamento da população diminua. "O que de fato vai provocar a redução do endividamento é o respeito ao limite de 30% da renda dos clientes que pode ser comprometida com dívidas. Os bancos têm como saber se o cliente tem empréstimos em outras instituições financeiras, mas acabam fazendo vista grossa e dando mais crédito do que ele consegue pagar".
Para a Federação Nacional dos Bancos (Febraban), é preciso aguardar o texto final sobre a medida para fazer um avaliação específica do seu impacto. De todo modo, a legislação em vigor já define quais as informações devem constar dos cadastros positivos, diz a entidade.
A Febraban diz ainda, em nota, que os dados mais recentes mostram que até agora cerca de 5 milhões de consumidores estão cadastrados na base de dados, número ainda insuficiente para o pleno funcionamento do cadastro positivo.
"O cadastro positivo contribuiu para uma redução da inadimplência e, consequentemente, das taxas de juros nas operações de crédito em outros países apenas quando estava em pleno funcionamento. (...) Estes resultados são melhor percebidos numa perspectiva de médio e longo prazos".