Invest

Zero estrangeiro, alta de juro e bolsa parada: a previsão “perversa” do CEO da Genial para 2023

Em entrevista à Exame Invest, Rodolfo Riechert disse que o "resultado da eleição foi muito ruim para a economia brasileira" e que vê o país flertando com o "abismo"

Rodolfo Riechert, CEO da Genial Investimentos (./Divulgação)

Rodolfo Riechert, CEO da Genial Investimentos (./Divulgação)

GG

Guilherme Guilherme

Publicado em 26 de dezembro de 2022 às 07h00.

Última atualização em 26 de dezembro de 2022 às 17h12.

CEO da Genial Investimentos, uma das maiores corretoras do país, com R$ 160 bilhões sob custódia, Rodolfo Riechert se define como "pessimista" para o ano que se aproxima. A perspectiva deriva das projeções para a política fiscal do próximo governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que, segundo Riechert, são "perversas".

"O resultado da eleição foi muito ruim para a economia brasileira", afirmou Rodolfo Riechert em entrevista à Exame Invest. "Se o Brasil gastar mais do que recebe, vai acabar quebrando um dia."

Para o CEO, a falta de sustentabilidade da dívida pública poderá forçar o Banco Central a ter que voltar a subir juros em 2023, mesmo com as recentes quedas da inflação. "Seria ruim para todo mundo. Ficaria mais caro para o governo e empresas se financiarem."

Com o juro alto, Riechert não vê espaço para a bolsa subir ou IPOs. Nem mesmo o capital externo, que "falava-se muito que viria" com a vitória petista, deve vir, previu. "Acho que vai ser zero estrangeiro por um bom tempo." 

Com a piora do risco de crédito das empresas, a renda fixa também não deve passar ilesa, na visão do CEO da Genial. "As pessoas precisam tomar cuidado, porque a renda fixa também tem risco. Ganha igual renda fixa, mas corre o risco de perder tudo."

Nas palavras de Riechert, "o Brasil é como uma pessoa que sempre flerta com abismo", mas que, "pelo menos, as instituições funcionam". "Então, os absurdos são barrados", ressaltou. "Esse é o cenário de hoje. Daqui a três meses pode ser diferente, mas não acredito que será."

Confira a entrevista com Rodolfo Riechert, CEO da Genial Investimentos.

Como o senhor tem avaliado as primeiras sinalizações do governo Lula? 

Estamos bastante pessimistas com o cenário. Independentemente das visões ideológicas, o resultado da eleição foi muito ruim para a economia brasileira. Há uma lógica fiscal perversa para o mercado financeiro e corporativo e, no fim das contas, também para as pessoas. Se essa lógica fiscal de fato prevalecer, teremos o problema de ter que aceitar uma inflação mais alta, que corrói o dinheiro de todo mundo e torna o Brasil mais pobre em investimentos. Pelo que tem sido demonstrado, é o caminho para o qual o país caminha.

A redução da PEC de dois ano para um ano foi um sinal positivo?

O mercado se agarrou a isso nos últimos dias. Só que se o Brasil gastar mais do que recebe, vai acabar quebrando um dia. A receita precisa ser maior do que a despesa para a dívida diminuir um pouco. Depois, pode equalizar, porque o Estado não precisa dar lucro, mas não pode quebrar. É em cima disso que deve girar o mercado brasileiro, especialmente se o internacional for negativo [no ano que vem]. Não acredito que vão revisar as reformas, como a trabalhista, mas deve haver muito barulho, o que já afasta o investidor. 

O Brasil ficou menos atrativo para o investidor estrangeiro?

Falava-se muito que viria dinheiro estrangeiro. Deve até vir alguma coisa para caridade e meio ambiente. Mas dinheiro de estrangeiro para empresas, para fazer investimento aqui no Brasil, não vem. O investidor quer ter um pouco de visibilidade do que virá para frente. Acho que vai ser zero estrangeiro por um bom tempo, até entendermos o que está acontecendo, se é que não vai numa direção ainda mais negativa.

Os ativos no Brasil estão extremamente baratos. Mas eles podem cair na lógica perversa de continuarem baratos durante um bom tempo. Nosso analista é um grande recomendador de Banco do Brasil. Todos os anos ele disse que estava barato e em todos anos ele continuou barato. Pode estar menos barato ou mais barato, mas está sempre barato na visão da maioria do mercado.

A bolsa está com os múltiplos próximos da mínima em mais de uma década. É um exemplo de ativo que deve continuar barato por muito tempo?

Minha leitura é de que os múltiplos permanecerão baixos por um bom tempo. O fluxo de investidores locais, com esse juro alto, é muito reduzido. Múltiplos baixos são assim porque a taxa de desconto é alta, como é o nosso caso, mas também porque a expectativa de lucro no futuro é pior. Então, o múltiplo é baixo hoje, mas não será, necessariamente, daqui a alguns anos. Quando a economia está crescendo, o múltiplo pode ser alto hoje, mas cai no futuro. 

Como está a expectativa da Genial para a bolsa em 2023?

Fomos uma das poucas casas que colocaram target de Ibovespa para o ano que vem em 109.000 pontos, isso quando a bolsa ainda estava em 112.000. Não tem muito motivo para a bolsa subir. Até porque um dos carros chefes da bolsa é a Petrobras, que já caiu, mas não parece o melhor lugar para colocar dinheiro. Outro é a Vale, que sempre vai ser exposta ao preço do minério, o que tem a ver com a economia internacional, em que a expectativa é de desaceleração. Os bancos, que já estão em múltiplos extremamente baixos, são a barreira [contra queda do Ibovespa], mas não me parece que existam gatilhos para voltarem a subir. 

Acho que vai acontecer bastante caso de o gestor ficar vendido em estatais e comprado em exportadoras, como acontecia na época da Dilma [Russeff, ex-presidente]. Deve ser um clássico para o início de governo até vermos aonde isso vai.

Quem não tem ações, deveria ter, porque realmente está barato. Mas vai ter que esperar um pouquinho. Ninguém tem bola de cristal para acertar o dia em que vai começar a subir. O downside também não parece ser tão grande. Então, não tem muito para perder. Mas não é o cenário para quem já investe em bolsa adicionar mais dinheiro. 

Deverá ser mais um ano sem IPOs?

Provavelmente. Os preços baratos refletem no preço do IPO. Se o empresário não precisa fazer um IPO, ele não vai fazer. Dificilmente terá alguma coisa que atraia a atenção.

As empresas e os empresários são bons. Mas as ações vão continuar baratas, já que o interesse pelo negócio é baixo. A renda fixa hoje dá um retorno alto, tendo potencial de risco pequeno.   

A Seilc deve subir no ano que vem?

O juro no Brasil já é muito alto, mas no primeiro momento pode ser esse o caminho. A inflação está em trajetória de queda, mas há o excesso de gastos do governo.

Os juros podem subir, o que seria ruim para todo mundo. Ficaria mais caro para o governo e empresas se financiarem. Ia ter gente se dando bem [o rentista], mas colocariam um imposto nele. Tenho certeza. 

Como as despesas são acima da receita, é preciso arcá-las por meio de emissão de dívida e de moeda, o que aumenta a inflação e a incerteza.  Aí, certamente, o Banco Central teria que entrar. Com a economia já patinando e o Banco Central tendo que aumentar os juros, logicamente, vão falar que ele é inimigo de um ou de outro. Criaria-se narrativas em cima disso, o que é muito negativo. 

De certa forma, a independência do Banco Central alivia a preocupação do mercado com o próximo governo?

O Banco Central é independente, mas apenas por dois anos [até a nova indicação]. Isso dá uma segurada. Só que o Brasil está tão para trás, que precisava de um acelerador, não de um freio.

O mercado de dívida corporativa se desenvolveu, com a menor participação do BNDES. Com a possibilidade de o BNDES ser mais ativo no próximo governo, deve cair o nível de emissões?

A renda fixa se retroalimenta. Como a empresa precisa se refinanciar, deve haver uma crescente nesse negócio. Não acho que o BNDES conseguirá abraçar tudo. Porém, as empresas não vão ter tanto apetite para grandes projetos. Aí é que pode entrar o BNDES, com financiamento mais barato. Só que os processos nos BNDES são mais lentos, engessados. É uma fonte que vão começar a procurar agora, mas vai demorar de dois a três anos até começar a ser relevante.

O mercado de renda fixa, hoje, está muito aquecido. Com a economia indo pior e as empresas emitindo mais, vai haver maior risco de crédito. As pessoas precisam tomar cuidado, porque a renda fixa também tem risco. Ganha igual renda fixa, mas corre o risco de perder tudo.

Gostaria de fazer alguma consideração final?

Acho que estamos em um momento bem difícil. O Brasil é como uma pessoa que sempre flerta com abismo. Já nos vimos nessa situação algumas vezes. Por isso, acho que o brasileiro sai dessa. Pelo menos, as instituições funcionam. Então, os absurdos são barrados.

Torcemos para o negócio dar certo, mas não nos furtaremos em sermos críticos, se acharmos que está no camainho errado. Esse é o cenário de hoje. Daqui a três meses pode ser diferente, mas não acredito que será.

Acompanhe tudo sobre:Açõesbancos-de-investimentobolsas-de-valoresCorretorasIbovespaJuros

Mais de Invest

Mercado intensifica aposta em alta de 50 pontos-base na próxima reunião do Copom

Ação da Agrogalaxy desaba 25% após pedido de RJ e vale menos de um real

Mega-Sena sorteia prêmio estimado em R$ 3,5 milhões nesta quinta

Ibovespa opera perto da estabilidade, apesar de rali exterior pós-Fed; Nasdaq sobe 2,5%