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Wells Fargo vê dólar pressionado por onda conservadora na América Latina

O Banco americano prevê aumento de rigor fiscal nos países latino-americanos com avanço dos governos de direita na região

Wells Fargo: disciplina fiscal aumenta previsibilidade macroeconômica (sakchai vongsasiripat/Getty Images)

Wells Fargo: disciplina fiscal aumenta previsibilidade macroeconômica (sakchai vongsasiripat/Getty Images)

Publicado em 10 de novembro de 2025 às 10h45.

Uma possível guinada da América Latina para governos mais alinhados à direita pode impactar positivamente o câmbio em países como o Brasil, segundo análise do banco americano Wells Fargo, divulgada na sexta-feira, 7. De acordo com os analistas, uma "onda conservadora" é esperada até o fim de 2026 — a segunda grande inflexão da região neste século.

A primeira, segundo o Wells Fargo, aconteceu entre 2015 e 2018, período em que partidos de centro-direita conquistaram o poder em diversos países sul-americanos. Agora, o banco prevê um novo ciclo, iniciado em 2024, que já mostra resultados eleitorais concretos em países como Equador, Bolívia e Argentina, e pode se consolidar em outras nações nos próximos 12 meses.

A análise projeta que os resultados dessas eleições devem influenciar diretamente os mercados financeiros locais, com destaque para o câmbio. A expectativa é que moedas como o real brasileiro, o peso argentino, o peso colombiano e o peso chileno se valorizem frente ao dólar, desde que acompanhadas por plataformas econômicas ortodoxas, com foco em responsabilidade fiscal, cortes de gastos e previsibilidade institucional.

Para o Wells Fargo, as propostas da direita — especialmente aquelas que prometem romper com políticas populistas recentes — tendem a reduzir os prêmios de risco e atrair investimentos estrangeiros.

Ao mesmo tempo, o relatório alerta que a volatilidade cambial pode aumentar no período pré-eleitoral, à medida que os mercados tentam precificar as chances de vitória de cada campo político.

Brasil: cenário projeta derrota de Lula e real valorizado

O Wells Fargo atribui 55% de chance de derrota do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições de 2026.

O relatório indica que o cenário de inflação persistente, aumento dos gastos públicos e deterioração fiscal tem causado perda de apoio político e desconfiança entre agentes do mercado.

A projeção é de que esse ambiente favoreça candidatos conservadores com plataformas centradas em disciplina fiscal, corte de gastos e previsibilidade macroeconômica nas eleições presidenciais do ano que vem.

O banco destaca que a política econômica do terceiro mandato de Lula tem sido marcada por uma postura populista, com ênfase em programas sociais amplos, manutenção de estatais como instrumentos de política pública e uso de bancos públicos para promover expansão de crédito. Essas decisões, segundo os analistas, alimentam a percepção de risco fiscal, o que pressiona o câmbio e dificulta a queda de juros.

Segundo a análise, uma vitória da oposição poderia reverter parte desse quadro. Candidatos ligados à família Bolsonaro, como a esposa do ex-presidente, Michelle Bolsonaro, ou ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, tendem a adotar uma agenda de responsabilidade fiscal. Para o banco, isso poderia levar à valorização do real frente ao dólar, redução no prêmio de risco e início de um ciclo de cortes na taxa Selic, caso o ambiente institucional se mostre estável.

Já num cenário de reeleição de Lula, o relatório prevê a continuidade do viés expansionista, com manutenção de estímulos fiscais, aumento de subsídios e menor ênfase no controle da dívida pública.

Isso, de acordo com os analistas, obrigaria o Banco Central (BC) a manter os juros elevados por mais tempo, para ancorar expectativas inflacionárias e compensar a percepção de risco elevada entre investidores nacionais e estrangeiros.

O Wells Fargo também observa que o atual ambiente de incerteza, alimentado por mudanças frequentes na âncora fiscal e falta de clareza em metas de resultado primário, torna o Brasil vulnerável a choques externos. A volatilidade do real é vista como reflexo dessa fragilidade institucional, e sua redução dependerá do resultado das urnas em 2026.

Argentina: Milei fortalece agenda liberal com apoio eleitoral

A Argentina é apontada pelo Wells Fargo como o caso mais consolidado da guinada conservadora em curso na América Latina.

O presidente Javier Milei alcançou uma vitória significativa nas eleições legislativas de meio de mandato, realizadas em outubro. Sua coalizão conquistou mais de 40% dos votos e ampliou sua base de apoio no Congresso, o que permite acelerar a implementação de reformas estruturais com viés liberal e antissistema.

O relatório enfatiza que Milei segue com a intenção declarada de extinguir o Banco Central da Argentina e implementar a dolarização da economia, proposta que vem sendo discutida desde sua campanha presidencial. A agenda inclui, ainda, a eliminação de subsídios estatais, cortes profundos nos gastos públicos e um processo de abertura econômica que visa atrair capital estrangeiro e restaurar a confiança nos fundamentos do país.

Para o Wells Fargo, a Argentina passa por uma transição para uma era "pós-peronista", na qual o modelo de intervencionismo estatal adotado por décadas perde espaço para uma abordagem ortodoxa, centrada na estabilidade fiscal e monetária.

O banco destaca que, embora a valorização do peso argentino não esteja no horizonte próximo, a perspectiva de disciplina fiscal e menor interferência política na política monetária pode estabilizar o câmbio e conter a inflação de forma mais duradoura.

O documento também ressalta que a força política de Milei é essencial para a viabilidade de medidas de alto impacto, como a dolarização, que exige amplo respaldo legislativo. A conquista de cadeiras no Congresso fortalece sua capacidade de aprovar reformas impopulares, mas consideradas cruciais para evitar colapsos fiscais futuros.

Os analistas enxergam a política cambial como um fator-chave para medir o sucesso da agenda de Milei. Caso reduza o déficit fiscal e elimine o financiamento monetário, a Argentina poderá alcançar um câmbio mais estável frente ao dólar, mesmo com reservas internacionais limitadas, de acordo com o banco. A credibilidade dessa política, porém, depende da execução consistente do ajuste e da resiliência política do governo diante de pressões sociais e corporativas.

Chile, Colômbia e Peru também

Além de Brasil e Argentina, o relatório do Wells Fargo destaca que Chile, Colômbia e Peru também devem seguir a tendência conservadora nos próximos ciclos eleitorais. Esses países vivem, segundo o banco, contextos de instabilidade fiscal, baixo crescimento e crescente insatisfação com políticas econômicas de viés populista, criando condições para o avanço de candidatos mais alinhados ao mercado.

No Chile, os economistas apontam o candidato José Antonio Kast como o favorito para as eleições deste ano, que acontecem no dia 16 de novembro. A plataforma de Kast é centrada em combate à criminalidade, redução do tamanho do Estado e maior estímulo ao setor privado e, segundo o Wells Fargo, seu favoritismo se dá em meio ao desgaste da esquerda no país e ao desejo da população por maior segurança e estabilidade econômica. O relatório projeta 55% de chance de vitória para Kast, contra 35% da ex-ministra Jeanette Jara, ligada à coalizão de esquerda.

Na Colômbia, o governo de Gustavo Petro enfrenta perda de popularidade em meio ao fraco desempenho econômico, inflação persistente e deterioração das contas públicas. O Wells Fargo estima 55% de probabilidade de que a oposição — seja de centro-direita ou direita — vença as eleições de 2026.

Entre os nomes cotados estão Sergio Fajardo, Victoria Dávila e Alejandro De La Espriella, que podem herdar o apoio de eleitores insatisfeitos com os rumos do atual governo. O relatório também aponta que uma virada política na Colômbia pode impulsionar o peso colombiano e reduzir pressões inflacionárias internas.

No Peru, o cenário político continua fragmentado após a saída de Pedro Castillo e sucessivas crises institucionais. No entanto, o relatório avalia que o vácuo deixado pela esquerda e a falta de confiança em soluções populistas podem abrir espaço para o fortalecimento de candidaturas liberais com propostas de estabilização macroeconômica e reformas pró-mercado.

Embora a eleição presidencial ainda esteja distante, o ambiente social e fiscal já mostra sinais de desgaste que, segundo o banco, favorecem o surgimento de um discurso conservador.

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