A alta de juros já havia sido sinalizada na última ata do Copom. A decisão foi, portanto, em linha com as expectativas do mercado. (Ueslei Marcelino/Reuters)
Marília Almeida
Publicado em 8 de dezembro de 2021 às 19h48.
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu por unanimidade elevar a taxa básica de juros Selic em 1,5 ponto percentual, que passa de 7,75% para 9,25% ao ano.
A alta de juros já havia sido sinalizada na última ata do Copom. A decisão foi, portanto, em linha com as expectativas do mercado.
Em comunicado sobre a decisão, o Copom justificou que o ajuste mais duro reflete o cenário externo menos favorável, evolução da atividade econômica moderadamente abaixo da esperada e inflação ainda elevada.
"No cenário básico (...) as projeções de inflação do Copom situam-se em torno de 10,2% para 2021, 4,7% para 2022 e 3,2% para 2023. Esse cenário supõe trajetória de juros que se eleva para 9,25% a.a neste ano e para 11,75% a.a. durante 2022, terminando o ano em 11,25%, e reduz-se para 8% a.a. em 2023", apontou o BC, em comunicado.
O Copom voltou a incluir no comunicado o trecho em que "antevê um ajuste de mesma magnitude" para a próxima reunião. Caso a previsão seja concretizada, a Selic subirá para o patamar de 10,75%.
O Comitê ressalta que, em seu cenário básico para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções. "Por um lado, uma possível reversão, ainda que parcial, do aumento nos preços das commodities internacionais em moeda local produziria trajetória de inflação abaixo do cenário básico. Por outro lado, novos prolongamentos das políticas fiscais de resposta à pandemia que pressionem a demanda agregada e piorem a trajetória fiscal podem elevar os prêmios de risco do país".
Segundo o BC, diante do aumento de projeções e do risco de desancoragem das expectativas para prazos mais longos, é apropriado que o ciclo de aperto monetário avance "significativamente em território contracionista". "O Comitê irá perseverar em sua estratégia até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas.”
Para o mercado, o BC adotou um tom mais duro no comunicado. Contudo, como a alta já era esperada, não houve uma revisão de expectativas para o nível da taxa no ano que vem.
Confira 5 opiniões do mercado sobre a decisão do Copom:
Segundo projeção dos economistas do Grupo Consultivo Macroeconômico da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais, as taxa de juros deve voltar a dois dígitos no início do próximo ano. A expectativa é que os juros subam mais 1,5% na primeira reunião do Copom do próximo ano, para 10,75%, com mais dois aumentos, de 0,75% e de 0,25% respectivamente, nos encontros seguintes, chegando a 11,75% em maio. Para os economistas, o patamar ficará estabilizado até outubro, quando devem ocorrer duas quedas consecutivas de 0,25% para que a Selic finalize 2022 a 11,25%.
As projeções foram revisadas por conta da persistência da inflação e piora da percepção sobre o dinamismo da economia em um cenário que se tornou ainda mais desafiador após a alteração do teto de gastos. A projeção para o PIB deste ano foi revisada de 5% para 4,74%, enquanto a de 2022 caiu de 1,2% para 0,5%.
Para o economista do banco, Leonardo Paiva, o Banco Central "jogou com regulamento debaixo do braço". Na sua opinião, o comunicado tem um tom "muito bom".
"Uma frase emblemática do comunicado é a ideia de ancorar inflação na meta ao longo do horizonte relevante de política monetária, em 2022 e 2023, uma mudança em relação ao último comunicado, que limitava no horizonte de política monetária. Essa comunicação dá um grau de liberdade para o BC sinalizar na próxima reunião se encerra o ciclo de alta em março ou maio. A próxima reunião, portanto, ganha mais importância".
Daniel Weeks, economista-chefe da gestora, aponta que tom foi "hawkish". Não colocou muito peso na piora de dados da atividade, mas deu à piora do cenário de inflação e expectativas. "O Copom coloca que caso a inflação avance significativamente, e significativamente é uma palavra nova".
Há também, no comunicado, indicação de que 2022 é um caso perdido, mas ao longo de 2022 e 2023 a alta de juros pode convergir. "O resumo é um BC preocupado com a desancoragem das expectativas.
Diante dessa nova alta, a gestora mantém suas expectativas de mais uma alta de 1,5 ponto porcentual em fevereiro e 1 ponto porcentual em março. "A partir daí acreditamos que o BC dará mais peso para 2023 e o nível dos juros deve ser suficiente para manter a inflação de 2023 perto da meta".
Caso os preços continuem a subir, podem haver altas não tão significativas após março, ressalta Weeks. "Mas esse não é o nosso cenário base".
Para Andre Perfeito, economista-chefe da corretora, o colegiado do Banco Central vê com preocupação a desancoragem das expectativas e adotou um tom mais duro na perspectiva de reverter o quanto antes os efeitos da situação.
"A combinação de expectativas menos piores na margem, somado a perspectiva de queda da inflação em 12 meses já no primeiro trimestre de 2022 apontam que o mercado deve jogar ainda mais para baixo a parte longa da curva de juros".
Contudo, a Necton mantém sua projeção de Selic em 11,5% ao final do ciclo em maio do ano que vem. "Apesar do Copom ter indicado uma alta de 150 pontos base, acreditamos que as condições econômicas no entorno da reunião irão forçar uma alta menor, seja por conta do IPCA mais comportado, do câmbio mais estável ou pela atividade ainda fraca".
Na visão de Luciano Sobral, economista-chefe da gestora, apesar de ter entregue a alta na Selic como o mercado esperava, o Copom parece ter tentado soar duro para o mercado, qualificando a evolução da atividade econômica como “moderadamente abaixo da esperada” (sem comentar sobre a piora sobre as projeções de crescimento de 2022 nas últimas semanas).
O Copom ainda ressaltou que “irá perseverar em sua estratégia até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas”, frase que não estava presente no comunicado de setembro.
Isso, segundo Sobral, pode ser interpretado como uma ênfase nas expectativas de mercado com relação às projeções do próprio BC, o que pode levar o mercado a acreditar que as altas de juros seguiriam no segundo trimestre de 2022 caso essas expectativas para a inflação de 2023 sigam se deteriorando.
"O comunicado parece compatível com o call de mais duas altas de 1,5 ponto porcentual, com a Selic terminando o ciclo em 12,25%. Por ter deixado clara a sinalização para a reunião de fevereiro, parecem menos prováveis cenários de desaceleração já naquela reunião e, como comentado acima, parece maior a probabilidade do ciclo avançar no segundo trimestre de 2022".