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“Se arrumar a casa, Via Varejo vai dobrar de valor”, diz gestor da Ibiúna

À frente de um fundo que rende quase 150% do CDI no ano, André Lion fala das estratégias em ações de commodities, bancos e varejo

Lion: "É fácil captar um cliente cobrando zero de tarifas e sem anuidade. A questão é quantos vão conseguir ser rentabilizados". (Ibiúna Investimentos/Divulgação)

Lion: "É fácil captar um cliente cobrando zero de tarifas e sem anuidade. A questão é quantos vão conseguir ser rentabilizados". (Ibiúna Investimentos/Divulgação)

TL

Tais Laporta

Publicado em 24 de setembro de 2019 às 07h30.

Última atualização em 24 de setembro de 2019 às 16h10.

Enquanto um grupo de gestores ganha fama nas redes sociais, há quem prefira ficar nos bastidores. Nesta turma está André Lion, responsável pela área de renda variável da Ibiúna Investimentos, casa fundada em 2010 sob a sua batuta e da dupla Mário Torós, ex-diretor do Banco Central, e Rodrigo Azevedo. Com R$ 6,4 bilhões em ativos, a gestora administra fundos com estratégias arrojadas e retornos para poucos. O fundo long short, por exemplo, acumula ganho de 147% do CDI no ano. Já o Hedge STH, com perfil multimercados, rende 273% do CDI desde o começo de 2019. “Não faz diferença divulgar nossa carteira”, comenta Lion a EXAME sobre a preferência pela discrição quando se trata de falar sobre as escolhas do gestor. 

Graduado em engenharia de produção pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo e com MBA pela Universidade de Pensilvânia, Lion foi sócio-diretor da área de renda variável da BRZ Investimentos entre 2007 e 2010. Antes disso, foi gestor sênior de renda variável na Itaú Asset Management. A Papo que Rende, ele fala das perspectivas sobre a chegada da Amazon Prime, dá seu palpite sobre a ascensão dos bancos digitais e conta porque a Ibiúna decidiu criar um fundo de previdência com foco em ações, um perfil incomum para quem pensa na aposentadoria.

Leia a íntegra da entrevista:

Atravessamos um período de otimismo na bolsa brasileira, mas a piora no cenário global pesou sobre as ações. Vocês tiveram que mudar a estratégia da carteira?

Fizemos uma mudança dois meses atrás, quando a China decidiu desvalorizar o iuane em meio à tensão entre os chineses e americanos. No dia seguinte nós zeramos qualquer posição em ações ligadas a commodities, porque quando há este movimento no câmbio, os preços das commodities ficam muito incertos. Não adianta fazer valuation (estimar o valor) de uma empresa quando você não sabe o preço da commodity. Mas ainda achamos interessante investir em Vale, Gerdau e na própria Petrobras, que está se desenvolvendo muito bem. Fizemos uma rápida revisão de tudo o que foi feito nos últimos dois anos. A empresa pela primeira vez dentro de muitos anos está fazendo o que prometeu. Com investimentos, redução de custo, é uma empresa interessante. 

Os bancos acumulam um desempenho inferior ao Ibovespa no ano. Os bons tempos ficaram para trás?

No mês passado aumentamos a exposição em Bradesco. De fato se discute o quanto de pressão os bancos vão sofrer por causa das fintechs. Certamente já estão sofrendo. A Cielo é o melhor exemplo de empresa pressionada pela concorrência. O que importa é o impacto disso nos resultados e qual a capacidade de reação dos bancos. Um dos problemas da Cielo, pela própria estrutura societária e por não conseguir se associar a outras empresas, é a dificuldade em reagir. Um banco tem mais graus de liberdade para reagir e a maior parte do business é crédito. Vemos claramente que os bancos privados vão ter que suprir a menor oferta de crédito dos bancos públicos. Mesmo que não tenhamos um crescimento agressivo da economia, se olharmos as carteiras dos bancos privados, eles podem ter crescimentos interessantes.

Como você vê a rápida ascensão de bancos digitais na bolsa?

Na mesma linha das fintechs, é algo interessante, já faz sentido e vão crescer. Porém é fácil captar um cliente cobrando zero de tarifas e dando um cartão de crédito sem anuidade. A questão é quantos dos novos clientes vão conseguir ser rentabilizados. Podemos ver num futuro não muito longínquo os bancos tradicionais adquirindo estes negócios. O Bradesco já fez isso com o Next. O BTG criou seu banco digital. Estes bancos têm uma vantagem porque começaram antes. O Bradesco tem seus próprios sistemas. Ele precisa se reinventar, não só na forma como oferece seus serviços, mas como serviço em si. 

Meses atrás vocês apostaram em Via Varejo, acreditando no retorno dos Klein na gestão. Agora que a Amazon lançou seu serviço prime no Brasil, como fica sua visão sobre o setor varejista?

Para a Via Varejo não vejo problema. É natural que o mercado tenha digerido mal o lançamento do Prime pela Amazon. É uma empresa gigantesca que teoricamente poderia fazer o que quisesse no Brasil. Mas ela está entrando no Brasil de forma cautelosa e organizada. Ela entende que é um mercado diferente. Entrou só com livro, depois passou a eletrônicos e depois o marketplace. Ela pretende ser e será um grande player nos próximos cinco anos, mas é bastante claro que a meta não é destruir esse mercado. Ela não quer ser a primeira, quer ser rentável.

Qual o impacto para os players do setor?

Estes passos da Amazon tiram um pouco de crescimento para frente destas outras empresas. Na minha cabeça, Magazine Luiza seria a mais afetada pela razão de ser a mais cara. Em seguida seria a B2W, que tem seu valor no varejo online, e depois as Lojas Americanas. Via Varejo seria a última afetada, porque hoje sua tese é arrumar a casa, organizar o varejo offline e voltar a vender como há 10 anos. É isto o que está sendo precificado. Se for precificar o valor do online na Via Varejo, depois de conseguir fazer o offline melhorar, o papel tem que dobrar de valor. Se ela executar estes passos de reorganização, comprar melhor, melhorar custos, vender bem, a abertura de margem do offline mais do que justifica qualquer valuation que vemos na bolsa.

A criação de um banco digital pela Via Varejo entra nesta conta?

Hoje em dia, banco digital todo mundo tem. Tem que saber o que fazer com ele. Não podemos esquecer que a Via Varejo tinha um grande negócio de crédito anos atrás e hoje o cliente quer algo mais digital. Isso não está precificado. Não é o vetor de crescimento da empresa, mas se conseguir fazer, ótimo. Vemos muitas empresas querendo entrar neste negócio. Dar crédito é fácil mas é perigoso, porque cobrar é difícil. 

Em três anos, Magazine Luiza chegou a um tamanho equivalente a seis Vias Varejos na bolsa. A ação está supervalorizada?

Ela foi precificada como uma empresa completamente online, como se ela estivesse se transformando talvez no equivalente a uma Amazon. Existe um risco de execução e de competição. Há empresas muito maiores em receita que poderiam conseguir acordos com fornecedores melhores e começar a competir melhor. Magazine Luiza foi muito feliz em executar sua estratégia nos últimos anos, até porque havia alguns players ou com problemas ou fora do mercado. A própria Via Varejo nos últimos anos estava com problemas na execução interna e Magalu se aproveitou disso de maneira inteligente. De agora em diante, aquele vento de cauda que beneficiou Magalu nos últimos anos talvez diminua.

Vimos antes da aprovação da reforma muita gente apostando em Ibovespa em até 140 mil pontos no fim do ano. Qual sua visão?

Tenho uma visão otimista, acho que estamos passando por um processo interessante. Desde meados de 2010 a economia brasileira passou por um processo de relativa desorganização, foram tantas interferências e incentivos irracionais que a economia ficou desorganizada. De dois anos para cá tivemos um processo de reorganização. Reforma trabalhista aprovada, Previdência e outras menores aprovadas. Isso mostra que a economia está começando a entrar nos trilhos. O mercado financeiro está começando a ter uma abrangência maior. Somos muito positivos no médio prazo para a economia e por consequência o mercado de ações brasileiro. Vemos novas empresas listadas, as já listadas performando bem, enxergamos este ciclo positivo. 

O interesse por renda variável vem crescendo também dentro dos fundos, em momento de juros baixos. O investidor está preparado para enfrentar os riscos desta indústria?

Este movimento também é consequência da normalização da economia, o que dá uma perspectiva positiva para o mercado acionário. É  um momento propício para fazer essa migração, sair do investimento relativamente sem risco e procurar algo mais arriscado. Se o investidor está preparado? Sim e não. Sim porque faz muito tempo que há produtos de renda variável distribuídos por diversos canais e muita gente já entendeu que há volatilidade e incerteza. Talvez o grande questionamento são os percentuais de alocação, o quanto colocar em renda fixa e variável. 

Vocês lançaram um fundo de previdência long biased voltado para ações. Por que esta estratégia?

Ele é diferente, tem uma gestão mais ativa e mais risco na carteira. Nosso primeiro fundo de previdência tem uma década, desde que a Ibiúna foi criada. Não é porque é de extremo longo prazo que a gestão de previdência não pode ser ativa. Antigamente, o cliente colocava o dinheiro e o gestor simplesmente comprava um papel de renda fixa de longo prazo e o dinheiro ficava lá estacionado. Daí vimos que dá para fazer uma gestão mais ativa e isto veio evoluindo. Lançamos este produto agora porque a lei evoluiu e permitiu diversificar. A gente achou com este mesmo conceito uma maneira de oferecer um veículo de gestão ativa com exposição à bolsa e com perfil de long biased, com viés de proteção, que pode ter 50% em ações. Esta união faz o produto.

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