Starlink, empresa de Elon Musk (Odd Andersen/AFP)
Redatora
Publicado em 9 de junho de 2025 às 09h25.
Última atualização em 9 de junho de 2025 às 09h29.
Enquanto a internet via satélite da Starlink avança por quase toda a América do Sul, conectando até aldeias indígenas isoladas na floresta amazônica, a Bolívia segue um caminho oposto. O país de 12 milhões de habitantes negou a licença de operação à empresa de Elon Musk e tem preferido manter a conectividade nacional sob controle estatal, com apoio de um satélite chinês já envelhecido.
A decisão, tomada no ano passado, contrasta com a realidade da infraestrutura de internet local. Fora das grandes cidades bolivianas, o acesso à rede é escasso, lento e instável. O país registra a pior velocidade de internet da América do Sul, e mais de 90% da população depende de celulares para se conectar, o que nem sempre é possível em áreas rurais, onde o sinal é fraco ou inexistente.
Apesar da demanda reprimida, autoridades bolivianas afirmam que a entrada da Starlink poderia desequilibrar o mercado local e colocar em risco a soberania do país ao entregar parte estratégica da conectividade nacional a uma empresa estrangeira. “Qualquer empresa que venha fazer negócios no país vai querer uma fatia do bolo, um bolo que, neste momento, pertence a quem já está aqui”, disse Iván Zambrana, diretor da agência espacial boliviana.
A Starlink tem ganhado espaço na América Latina justamente por oferecer uma solução mais acessível e prática para regiões de difícil acesso. No Brasil, seu maior mercado na região, já são mais de 250 mil usuários desde 2022.
Mas o domínio da companhia também levanta alertas. O governo brasileiro, por exemplo, fechou um acordo com a SpaceSail, uma empresa chinesa que desenvolve uma rede própria de satélites, após desentendimentos com Elon Musk sobre a moderação de conteúdos na plataforma X.
Na Bolívia, o serviço de internet é hoje garantido por um satélite chinês lançado em 2013. Segundo especialistas, ele tem sinal fraco, cobertura limitada e deve se tornar obsoleto até 2028. O governo estuda alternativas para substituí-lo e já iniciou conversas com a SpaceSail. A expectativa é que a nova rede chinesa lance 648 satélites em 2025, chegando a 15 mil até 2030.
Mesmo com a resistência oficial, há pressão crescente para rever a decisão. Hotéis na fronteira com o Chile chegaram a contrabandear equipamentos da Starlink para oferecer conexão. Professores como Adrián Valencia, que leciona em Quetena Chico, no sul do país, precisam dirigir por seis horas até a cidade mais próxima para conseguir fazer upload de vídeos educacionais. “Não ter internet é como não saber ler”, afirmou.
A Starlink ainda lista a Bolívia como um país com previsão de cobertura a partir de 2025. Até lá, enquanto o satélite atual se aproxima do fim de sua vida útil, segue a disputa entre soberania estatal e demanda por conectividade em um dos países mais desconectados do continente.