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Pix não vai substituir o cartão de crédito, diz presidente da Abecs

Para Pedro Coutinho, também CEO da Getnet, parcelamento de compras e necessidades diversas do cliente limitam adesão ao novo meio de pagamento

CEO da Getnet também cita que infraestrutura e segurança do novo meio de pagamento será testada (Germano Lüders/Exame)

CEO da Getnet também cita que infraestrutura e segurança do novo meio de pagamento será testada (Germano Lüders/Exame)

Marília Almeida

Marília Almeida

Publicado em 3 de dezembro de 2020 às 05h30.

Última atualização em 3 de dezembro de 2020 às 12h34.

O PIX começou a operar no dia 16 de novembro e muito já se falou que o sistema de pagamentos instantâneos do Banco Central pode causar uma grande disrupção no mercado. Gratuito para pessoas físicas, choveram previsões de que o novo meio de pagamento deve substituir as transferências via TED e DOC, o pagamento em dinheiro em espécie e também o cartão de débito. Há até quem diga que pode ameaçar o reinado das maquininhas e do cartão de crédito.

Os novos meios de pagamento podem interferir em seus investimentos? Descubra ao contar com uma assessoria completa.

A indústria de cartões se defende. Pedro Coutinho, presidente da Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs) e CEO da Getnet, empresa de tecnologia do Santander que oferece produtos e serviços de meios de pagamento, não acredita que um único meio de pagamento possa substituir um mercado inteiro. Ainda mais um segmento utilizado por mais de 60% das famílias brasileiras e que cresce no país mesmo em um ano marcado por uma pandemia.

Segundo dados da Abecs, no acumulado do ano, entre janeiro e setembro, o uso dos cartões chegou a 1,38 trilhão de reais, crescimento de 5,4% em relação ao mesmo período de 2019. Foram realizadas 16,3 bilhões de transações com cartões ao longo de oito meses.

Veja abaixo a entrevista de Pedro Coutinho à EXAME Invest:

Estudos apontam que o Pix tem impacto negativo para adquirentes. Quais são as perspectivas da Abecs para o setor?

Não acredito que haja um único produto que substitua um mercado inteiro. Acredito que diversos meios de captura de pagamento poderão coexistir. Por exemplo, muito se falou sobre o fim do cheque, mas o país ainda gera 30 milhões de folhas de cheques por mês. Tenho um cliente que emprega 8.000 vendedoras em Araraquara e concede crédito para elas por meio de cheques. O Pix é mais uma forma de pagamento.

Se olharmos o que aconteceu em relação ao fast payment em outros países, como Inglaterra e Estados Unidos, além da Índia, veremos comportamentos diferentes. Em países nos quais o uso do dinheiro é muito alto e o uso do cartão é baixo, como a Índia, o impacto do pagamento instantâneo é maior. Já nos Estados Unidos e na Inglaterra, onde o cartão de crédito com tecnologia NFC (Near Field Communication, o pagamento por aproximação) está consolidado, a adesão ao pagamento instantâneo não mudou o mercado.

Acredito que o Pix vai resolver os problemas da TED e do DOC. Essas operações têm uma deficiência grande em relação a horários. É um grande ganho começar a transferir dinheiro a partir das 5 horas da tarde. Além disso, o Pix também tem como objetivo resolver o problema da alta circulação de dinheiro vivo na economia, que tem impacto negativo para o país. Contudo, em outros segmentos do mercado, como o de cartões, acreditamos que o impacto do Pix vai depender da experiência do cliente. Se passo por um pedágio é mais fácil encostar um cartão e pagar: não preciso abrir o celular.

Sem contar que teremos de monitorar a evolução do Pix. A infraestrutura e segurança do sistema serão testadas.

Os pagamentos no Pix podem ser agendados para 30 dias. A funcionalidade não pode abocanhar uma fatia do mercado de crédito?

Imagine que um consumidor quer comprar um ar condicionado em 12 parcelas no cartão de crédito. De quem é o risco? Do banco emissor, que deve emitir boletos para que realize os pagamentos no dia ou dar a opção de debitar automaticamente as parcelas na conta todo dia 30.

Para pagamentos agendados no Pix, se no dia em que o consumidor agendou não tiver saldo na conta, de quem é o risco? Da loja, que vai aumentar a sua inadimplência. É o mesmo problema do cheque pré-datado.

Tem outro ponto importante, que é o benefício de milhagem. Eu uso todas as oportunidades que tenho para ganhar milhas. Tenho três cartões, pago tudo no crédito à vista e ganho milhas sobre todas as transações que faço.

Qual deve ser o impacto do Pix sobre o segmento de cartões de débito?

O cartão de débito ainda é muito representativo: representa 45% do mercado. Do total transacionado neste ano pela indústria, 40% das operações foram realizadas com o cartão de débito ou pré-pago, enquanto 60% foram feitas com cartão de crédito. Dentro da aba do cartão de crédito, 50% são pagamentos parcelados e 50% pagamentos à vista, para 30 dias. O cartão de crédito hoje representa 65% dos gastos de uma família no Brasil.

Acreditamos que a iniciativa do Pix é sensacional. O pagamento instantâneo deve substituir a TED e o DOC totalmente, bem como boletos. Também deve diminuir o pagamento em dinheiro. Mas se o cartão de débito tiver a tecnologia NFC, podemos ver uma continuidade do uso.

As adquirentes se prepararam para oferecer a tecnologia NFC. Mas o Brasil ainda não tem todos os cartões com a tecnologia e há um desconhecimento sobre ela entre os consumidores e também os microempreendedores. Há uma oportunidade para melhorarmos esse cenário.

Como estão buscando se manter relevantes na Getnet? Quais são os benefícios de ter uma maquininha atualmente? 

As maquininhas ajudam o comerciante a gerenciar o negócio e vão além da funcionalidade de apenas realizar transações. Existem restaurantes que dividem sua operação em três turnos, e cada uma tem um faturamento diferente. Para auxiliar nessa organização, existem vários serviços de valor agregado nas maquininhas. Temos por exemplo o split de pagamento, no qual em cada operação já separamos do valor pago a comissão do garçom e realizamos o crédito do dinheiro na conta do funcionário.

Nos preparamos também para o mundo digital, com soluções para pequenos e grandes clientes. Montamos uma loja online em até dois dias. Essa solução vem nos permitindo ganhar market share (participação de mercado).

Além desses produtos de conciliação financeira, temos parcerias com cartões de alimentação. O restaurante pode deixar de ter a maquininha, mas hoje ela aceita diversos cartões de alimentação. Vão deixar de aceitá-los?

Temos também uma novidade mais recente, que muitos ainda não conhecem. Hoje, com a maquininha, se alguém quiser comprar em até 36 vezes, e tiver limite no cartão para isso, o estabelecimento pode vender. A maquininha tem uma linha de crediário embutida: a Getnet presta o serviço e o banco realiza o financiamento.

Qual está sendo o impacto da pandemia sobre o negócio?

A partir do momento em que 30 milhões de pessoas se digitalizaram por conta do auxílio emergencial, mais pessoas passaram a ter acesso ao crédito no país.

Além disso, existem hoje no país 14 milhões de desempregados e eles vão buscar empreender. Para isso, precisam de soluções de pagamentos. Imagina um empreendedor que deseja vender pipoca. O cliente chega para comprar o produto e ele diz que só aceita Pix. Acha que vai vender para todo mundo? Não. Ele vai ter de aceitar todos os meios de pagamentos.

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