Temer: essa visão foi ampliada com a aprovação considerada apertada do projeto de terceirização na quarta-feira (Beto Barata/PR/Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 23 de março de 2017 às 17h41.
Última atualização em 24 de março de 2017 às 12h53.
São Paulo - Depois de meses relevando os tropeços políticos do governo, o mercado passa a demonstrar receio de que as expectativas mais positivas com a aprovação das reformas não sejam confirmadas.
A decisão do presidente Michel Temer de excluir os servidores estaduais e municipais da reforma da Previdência já havia gerado o temor de que outras concessões estejam a caminho e descaracterizem a reforma, reduzindo sua capacidade de limitar o crescimento da dívida e dificultando a trajetória de queda das taxas de juros.
Essa visão foi ampliada com a aprovação considerada apertada do projeto de terceirização na quarta-feira.
Uma aprovação mais demorada da reforma também poderia tornar mais lento o seu efeito na retomada da confiança da economia, afetando o cenário das eleições de 2018, na avaliação de analistas.
A posição de alguns deputados de não apoiar a reforma por receio de serem punidos pelo eleitor representa um cálculo político de curto prazo que é “míope”, diz o cientista político Rafael Cortez, da Tendências Consultoria.
Se a reforma for enfraquecida ou demorar para ser aprovada, a retomada da economia será prejudicada e com isso aumentará o “sentimento de mudança”, favorecendo candidaturas alternativas para 2018, diz o consultor.
Sem resultados a mostrar, ficaria ainda mais difícil a vida dos políticos que defendem a continuidade da atual política econômica.
Está ocorrendo uma “mudança de humor” sobre as chances de a reforma da Previdência ser aprovada sem mudanças importantes, diz Carlos Kawall, economista do Banco Safra.
“O mercado não está precificando uma não aprovação. O temor é que se aprove uma reforma que seja insuficiente para conter o crescimento da dívida.”
A exclusão dos servidores estaduais e municipais, a segunda grande concessão do governo Temer, que já havia antes retirado os militares da reforma, traz um custo importante em termos de “argumentação política”, diz Cortez, da Tendências.
Inicialmente, o governo tinha a autoridade ”moral” de dizer que a reforma era dura, mas para todos. “O que se está dizendo agora é que alguns grupos vão ficar fora do sacrifício.”
Cortez considera que novas derrotas do governo podem ser esperadas em outros pontos da reforma da Previdência.
“Nem o FHC e o Lula, que eram muito mais populares que o Temer, conseguiram fazer reformas profundas. O risco é enorme e está mal precificado pelo mercado”, diz o consultor.
Entre os pontos que geram mais resistência estão a idade mínima para trabalhadores rurais e mulheres e a regra de transição com limite aos 50 anos.
Apesar de ter sido aprovado na quarta-feira, o projeto de terceirização em todas as áreas das empresas foi visto como certa derrota na Câmara, pelo placar considerado apertado de 231 votos a favor e 188 contra, com 8 abstenções.
Para Ivo Chermont, economista-chefe da Quantitas Gestão de Recursos, partidos da base aliada deram sinal claro de que o governo precisará trabalhar bem mais para aprovar a reforma da Previdência.
Apesar da alta do dólar, dos juros futuros e do risco Brasil nesta quinta-feira, o investidor ainda reluta em adotar uma postura abertamente negativa.
Segue depositando esperanças em que o governo, enfim, consiga aprovar uma reforma minimamente consistente que ajude a conter o déficit fiscal.
A última concessão de Temer, porém, deixou o mercado em alerta. “Há incerteza sobre até que ponto a reforma vai ser desidratada”, diz Newton Rosa, economista da SulAmérica.
“A Previdência não vai sair como foi prometido ao mercado e, se passar uma reforma inócua, simplesmente não resolve nada, inclusive o teto dos gastos perde sentido”, diz Pablo Spyer, diretor da Corretora Mirae.
Ele lembra que o recuo de Temer coincidiu com outros fatores negativos que ajudam a abalar o sentimento positivo do mercado, como a crise da carne, que afeta as exportações, e possibilidade de aumento de impostos, inclusive IOF no câmbio.