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O que são as terras raras que acirraram tensões entre Trump e a China?

Produção de elementos químicos essenciais para transição energética e digital está concentrada em território chinês

Terras raras: Produção de elementos químicos essenciais para transição energética e digital está concentrada em território chinês

Terras raras: Produção de elementos químicos essenciais para transição energética e digital está concentrada em território chinês

Da Redação
Da Redação

Redação Exame

Publicado em 10 de outubro de 2025 às 17h53.

Última atualização em 10 de outubro de 2025 às 21h48.

Principal ponto de tensão nas negociações comerciais entre o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e a China, as chamadas terras raras têm ganhado destaque com o avanço da emergência climática. A demanda por esses elementos químicos cresce porque eles são essenciais para o funcionamento de tecnologias estratégicas, como turbinas eólicas, painéis solares a baterias de veículos elétricos.

As terras raras formam um grupo de 17 elementos químicos que, apesar do nome, não são exatamente escassos. O termo surgiu devido à dificuldade de separá-los de outros minerais e processá-los em escala industrial.

São consideradas insumos estratégicos porque se relacionam à transição energética e digital em todo o mundo. Turbinas de energia limpa, baterias de longa duração, veículos menos poluentes e satélites de última geração dependem de componentes feitos com elementos como o neodímio e o disprósio. Em um cenário global cada vez mais voltado à segurança energética e soberania tecnológica, os países disputam não apenas reservas minerais, mas também a capacidade de dominá-las do subsolo ao produto final.

Quais são os 17 elementos?

As terras raras incluem 17 elementos químicos, sendo quinze lantânidos — lantânio, cério, praseodímio, neodímio, promécio, samário, európio, gadolínio, térbio, disprósio, hólmio, érbio, túlio, itérbio e lutécio — e dois elementos que não pertencem aos lantânidos, mas possuem propriedades químicas semelhantes: escândio e ítrio.

O escândio é importante para a tecnologia de células de combustível, e seu risco de fornecimento é considerado alto. O ítrio, junto com o escândio, é um dos dois elementos de terras raras que não fazem parte dos lantânidos. Entre os lantânidos, o lantânio é o homônimo do grupo e possui ampla aplicação industrial, enquanto o cério é o mais comum, sendo utilizado em diversos setores.

O praseodímio compartilha propriedades químicas e físicas com o neodímio, que é um componente essencial em ímãs permanentes de alta potência. O promécio é extremamente raro na natureza, com ocorrência estimada em menos de um quilo. O samário é uma terra rara leve usada em ímãs de alto desempenho, e o európio, também leve, aparece em lâmpadas fluorescentes e cédulas de dinheiro.

O gadolínio tem múltiplas aplicações, que vão da energia nuclear à medicina. O térbio é um dos elementos mais caros, utilizado para aumentar a performance de ímãs permanentes. O disprósio é fundamental em materiais magnéticos e tecnologias de energias renováveis. O hólmio possui o maior momento magnético entre todas as terras raras e é usado em tecnologia médica.

O érbio é aplicado como corante e amplificador de potência em cabos de fibra óptica, enquanto o túlio é um dos lantânidos mais raros. O itérbio é usado em fósforos, catalisadores e capacitores cerâmicos. Por fim, o lutécio é o elemento mais caro do grupo, com aplicações altamente especializadas.

O papel da China

A China não apenas possui as maiores reservas conhecidas, como também tomou decisões estruturantes nas últimas décadas, investindo em pesquisa, tecnologia e controle da cadeia produtiva por meio de políticas públicas. Atualmente, o país é considerado o principal fornecedor mundial desses elementos, uma posição que preocupa Trump, pelo fato do território chinês concentrar uma parte crucial das matérias-primas necessárias à indústria de defesa, energia e tecnologia americana.

De acordo com o Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS), cerca de 70% da produção global de terras raras vem do gigante asiático. A principal mina é Bayan Obo, no norte do país, que concentra grandes quantidades de todos os elementos usados em ímãs permanentes e supera em larga escala depósitos como Monte Weld, na Austrália, e Kvanefjeld, na Groenlândia.

Depois de extraídos, os minerais passam por etapas complexas de separação e refino até se tornarem utilizáveis. Essa fase também é dominada pelos chineses, que lideram a produção mundial de ímãs — componentes essenciais em turbinas eólicas, motores de carros elétricos e sistemas eletrônicos avançados.

O domínio é ainda mais expressivo em certos tipos de elementos. Os mais leves — exceto o neodímio e o praseodímio — são mais abundantes e simples de processar. Mesmo assim, a União Europeia ainda importa de 80% a 100% de suas necessidades desse grupo da China. No caso dos elementos mais pesados, a dependência é total, chegando a 100%.

Ponto de discórdia

Esse monopólio chinês acendeu um alerta nas economias ocidentais. Nos últimos anos, Estados Unidos e União Europeia começaram a criar reservas estratégicas de terras raras e outros materiais críticos, numa tentativa de diminuir a vulnerabilidade de suas cadeias produtivas e reduzir o risco de interrupções no fornecimento.

Mesmo assim, os EUA ainda não possuem capacidade para transformar as matérias-primas extraídas em produtos acabados em escala industrial. As refinarias e fábricas de ímãs ainda estão em construção. Por enquanto, os óxidos de terras raras extraídos em solo americano são enviados à China para processamento e retornam aos EUA como ímãs permanentes e outros componentes industriais.

Em julho, o Departamento de Defesa dos EUA fechou um acordo com a maior mineradora de terras raras do país, a MP Materials, incluindo uma participação acionária — o primeiro grande movimento do governo Trump para apoiar a indústria americana e reduzir a dependência da China.

Posteriormente, a Casa Branca adquiriu participações na Lithium Americas e na Trilogy Metals, alimentando a especulação de investidores sobre possíveis novos acordos estratégicos.

Apesar dos esforços da Europa, dos EUA e de outros países, o poder de mercado da China deve permanecer consolidado no futuro próximo.

Projeções para a demanda global

A demanda por minerais essenciais para a transição energética, como lítio, cobalto e cobre, além das próprias terras raras pode aumentar quase quatro vezes até 2030, segundo estimativas da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD).

A agência da ONU também prevê que que o consumo desses minerais poderá crescer mais de 1.500% até 2050, impulsionado pela eletrificação da frota global, pela expansão das energias renováveis e pela digitalização da economia.

Um estudo realizado na universidade de pesquisa belga KU Leuven, por sua vez, concluiu que seriam necessários de 7 a 26 vezes mais metais de terras raras somente na Europa para atingir as metas climáticas até 2050. Já a Agência Internacional de Energia (AIE) é um pouco mais cautelosa, prevendo que a demanda em 2040 poderá ser de 3 a 7 vezes maior do que é hoje.

Importância do Brasil

O Brasil possui cerca de 21 milhões de toneladas em óxidos de terras raras, o que o coloca na segunda posição global em reservas estimadas, segundo o USGS. Os principais depósitos estão localizados em áreas do Sudeste, como Araxá e Poços de Caldas (MG), e no Norte, especialmente na região de Seis Lagos, no Amazonas.

Apesar da posição privilegiada no mapa, o país está longe do protagonismo internacional. Como explica a pesquisadora Elaine Santos, mestra em Energia, Sociedade e Meio Ambiente pela UFABC, a existência de reservas não significa capacidade imediata de exploração.

“O Brasil ainda depende de processos caros e complexos para separar e purificar os elementos de terras raras. E isso exige uma política de longo prazo, com coordenação entre diferentes áreas: ambiental, tecnológica, industrial e científica”, afirma.

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