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Nova instrução da CVM mudará regras de fiscalização e punição ao mercado

Entrou em audiência pública uma proposta de instrução que reformulará as atuais regras de fiscalização, julgamentos e punições para irregularidades

A Bolsa de Valores de São Paulo, B3 (Paulo Whitaker/Reuters)

A Bolsa de Valores de São Paulo, B3 (Paulo Whitaker/Reuters)

Anderson Figo

Anderson Figo

Publicado em 18 de junho de 2018 às 16h52.

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) coloca hoje em audiência pública uma proposta de instrução que reformulará as atuais regras de fiscalização, julgamentos e punições para irregularidades cometidas no mercado de capitais. A minuta sobre a atividade sancionadora vai regular desde a apuração de infrações administrativas, o rito dos processos administrativos sancionadores (PAS), a aplicação de penalidades, o termo de compromisso, até o acordo administrativo em processo de supervisão, o chamado acordo de leniência.

Lei 13.506 e novas multas

A instrução visava inicialmente atender as inovações trazidas pela Lei 13.506/17, que elevou o valor das multas em caso de crimes contra o mercado de capitais, mas o regulador resolveu aproveitar e rever toda a parte sancionadora, explica o diretor da CVM, Henrique Machado. “A nova instrução tem por objetivo atualizar, consolidar e harmonizar os diversos procedimentos relativos à atuação sancionadora da CVM”, destaca.

Medidas podem entrar em vigor em 2019

A audiência pública deve durar dois meses e a aprovação do texto final deve ocorrer em algum momento do quarto trimestre. “Esperamos começar o ano com as novas regras”, diz o diretor. “É um trabalho de fôlego, já que vai substituir quatro normas anteriores e unificar em uma instrução única todos os procedimentos sancionadores”, afirma Machado. Ela funcionará como um código de processo administrativo sancionador da CVM, facilitando tanto o trabalho de fiscalização como o das instituições e profissionais de mercado em seu dia a dia.

Mais ritos sumários e simplificados e menos processos

Um dos prontos principais da nova norma é definir melhor os ritos sumários e simplificados, deixando claro o que não precisará ser assunto de processo administrativo sancionador. Com isso, o Colegiado da CVM poderá se concentrar em processos relevantes, sem prejuízo do trabalho da área técnica. “Podemos usar procedimentos mais rápidos e criar novas regras processuais, garantindo a defesa e os recursos dos acusados, mas tudo de forma mais clara e definida”, diz. Isso permitiria uma redução significativa no prazo dos processos, de até 50%, estima Machado.

Comunicação dos processos será eletrônica

A CVM vai também adotar os meios eletrônicos para se comunicar com o mercado nos processos, publicando as determinações e intimações no “Diário Eletrônico” no site da autarquia, reduzindo os custos e tornando mais ágeis os processos. “Tudo isso deve reduzir o custo de observância e facilitar os procedimentos e a comunicação com o mercado”, diz.

Os ritos sumários também devem ter uma definição mais clara, com uma simplificação para o julgamento de pequenos delitos. Além disso, devem sem ampliados os casos que podem ser julgados sumariamente. “Infrações pequenas, como não publicar avisos ou resultados de assembleias, poderão ter julgamentos mais rápidos, sem toda a apuração de um processo sancionador, até porque é só analisar as publicações”, explica.

Debate vai definir punições e penas de infrações menores

Infrações que não demandam ampla investigações nem diversas diligências para chegar à conclusão podem ser assim resolvidas mais rapidamente. “Basta juntar os documentos, ver se não cumpriu as normas de auditoria, por exemplo, e usar a proposta de relatório que já terá um modelo pronto”, diz. Machado espera um debate interessante na audiência pública em torno das punições e penas dos casos de infrações menores do rito simplificado.

Ao mesmo tempo, a atuação preventiva da CVM continuará detectando esses problemas. E o colegiado poderá se concentrar nos processos relevantes.

Definição dos valores de multas

Outro destaque da norma é a regulamentação da nova multa de até R$ 50 milhões estabelecida pela Lei 13.506. A CVM quer definir critérios para estabelecer o valor de acordo com a irregularidade cometida, a chamada dosimetria. Os critérios darão mais segurança para o mercado sobre o tipo de punição que cada irregularidade terá.  Era um compromisso da CVM de deixar claro para o mercado de que nem todos os erros estariam sujeitos à multa de R$ 50 milhões. “Vamos ter uma tabela anexa de crimes e penalidades de acordo com atenuantes e com isso o Colegiado também não precisará definir a dosimetria em cada caso”, explica.

Acordo de leniência

Além disso, a regra deverá definir como funcionará o acordo de leniência da CVM, que ainda não foi regulamentado, e que deve permitir que uma empresa pague uma multa e cumpra determinadas medidas compensatórias pelas irregularidades que cometeu. Esse tipo de acordo ganhou importância após casos como da JBS e Odebrecht, como forma de punir condutas irregulares, mas ao mesmo tempo preservar a empresa.

O procedimento é chamado oficialmente de acordos administrativos em processo de supervisão, e foram introduzidos pela Lei 13.506/17, reforçando o conjunto de instrumentos regulatórios que poderão ser utilizados pela CVM para exercer a função de supervisão e fiscalização no mercado de valores mobiliários. “Nesse contexto, a Autarquia procurou adotar mecanismos que garantissem o sigilo na proposição e negociação do acordo, de modo a manter a atratividade do instituto para os potenciais signatários”, explicou Antonio Berwanger, superintendente de desenvolvimento de mercado.

A norma deverá, portanto, abordar quatro focos principais: a ação pré-sancionadora, o processo sancionador em si, a dosimetria da pena, a regra do termo de compromisso e o acordo de transição, explica Machado.

Tudo isso vai em linha com a proposta da CVM de reduzir o custo de observância do mercado, ao atualizar as normas e dar previsibilidade para os participantes, explica Machado.

“A proposta de instrução também valoriza o importante trabalho coordenado que a CVM desenvolve com o Ministério Público Federal (MPF), o Banco Central e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), criando todas as condições para que acordos em processos de supervisão de interesse comum sejam celebrados com plenas amplitude e efetividade”, conclui Alexandre Pinheiro, Superintendente Geral da CVM.

A seguir, os principais pontos da nova instrução:

Em relação ao regime do Processo Administrativo Sancionador (PAS) vigente:

(i) Fixação de parâmetros para a decisão das superintendências a respeito da não instauração de processo administrativo sancionador, quando decidirem pela utilização de outros instrumentos ou medidas de supervisão que julguem mais efetivos;

(ii) Adoção do meio eletrônico como regra para comunicação dos atos processuais perante os acusados, tanto no caso da citação quanto das demais intimações realizadas;

(iii) Publicação de atos processuais do “Diário Eletrônico” no site da CVM, em substituição à publicação atualmente realizada no Diário Oficial da União;

(iv) Estabelecimento do efeito devolutivo como regra nas penas de suspensão temporária, inabilitação temporária e suspensão da autorização ou registro para o exercício das atividades autorizadas pela CVM, sendo possível formular recurso ao Colegiado para requerimento do efeito suspensivo;

(v) Definição de limites máximos para a pena-base fixada com fundamento no inciso I do § 1º do art. 11 da Lei 6.385/76 (que permite a aplicação de multa de até 50 milhões de reais), de acordo com o grau de gravidade da conduta (Anexo 65);

(vi) Determinação de critérios para fixação de pena-base, aplicação das circunstâncias agravantes e atenuantes e aplicação de causa de redução;

(vii) Consolidação das regras relativas aos termos de compromisso; e

(viii) Atualização do procedimento e do rol de infrações submetidas ao rito simplificado.

Dentre as principais características dos acordos administrativos, ou de leniência, estão:

(i) adoção do Comitê de Acordo de Supervisão (CAS), órgão independente e apartado das áreas de supervisão ou fiscalização da CVM, para analisar a proposta, negociar e celebrar o acordo de supervisão com os proponentes;

(ii) descarte ou devolução ao proponente, nos casos em que a proposta não for aceita, de que todos os documentos fornecidos à CVM, não permanecendo qualquer cópia em posse da Autarquia; e

(iii) criação de critérios objetivos para caracterização de conhecimento prévio da CVM a respeito das infrações trazidas, para fins de determinação do benefício máximo concedido ao potencial signatário (extinção da punibilidade ou redução de 1/3 a 2/3 das penas aplicáveis na esfera administrativa).

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