Carlos Eduardo Rocha, gestor da Occam Brasil (Divulgação/Divulgação)
Paula Barra
Publicado em 15 de setembro de 2021 às 14h13.
Última atualização em 15 de setembro de 2021 às 14h35.
O Brasil vive um ambiente de crise, com deterioração do cenário macroeconômico e envolto a ruídos políticos, avalia Carlos Eduardo Rocha, CEO e gestor da Occam Brasil. Na sua visão, isso tem minado a energia do País para avançar em pautas essenciais, como as reformas.
"Enquanto o Brasil não resolver a questão macro, com combate à inflação e, do lado político, não houver uma compreensão da necessidade do controle fiscal, o ambiente não vai melhorar", disse o gestor em entrevista à EXAME Invest.
Para ele, a carta de Bolsonaro à nação pode até ter dado uma apaziguada nos ânimos, mas há dúvidas quanto à persistência da trégua. "O governo é muito belicoso. É muito improvável que não vá entrar em novos conflitos mais à frente. O mais provável é que isso volte a acontecer".
Com projeção de alta de 9% para o IPCA este ano, Rocha vê risco do Banco Central ter que elevar a Selic para dois dígitos para conseguir combater a inflação. "Na nossa visão, os juros vão subir mais rápido do que o mercado espera".
Na carteira, a Occam está comprada em dólar e vendida em real. Em renda variável, ele disse que está mais otimista com o exterior. "No Brasil, buscamos só gerar alfa [selecionar ações que podem ter um retorno acima da média do mercado]".
Confira abaixo os destaques da entrevista:
Existe um movimento externo muito favorável para ativos de risco, diante dos juros baixos nos países desenvolvidos, e isso tem levado muitas pessoas a buscarem alternativas de investimentos na Bolsa lá fora.
Mas, infelizmente, no Brasil, temos um movimento contrário, diante da deterioração macroeconômica. Sempre tivemos uma situação fiscal frágil, mas, ao mesmo tempo, fizemos uma expansão fiscal muito forte, com o auxílio emergencial, e não conseguimos parar isso. Agora, estamos falando ainda em expansão do Bolsa Família.
Não é porque somos particularmente trapalhões, mas os países da América Latina, em geral, têm uma situação frágil. Todos estão com problemas fiscais e inflação maior. O efeito do auxílio emergencial gerou também um processo inflacionário.
O Brasil fez um auxílio maior que o previsto e ainda segue discutindo expansão fiscal, quando deveríamos falar em diminuição.
O Banco Central reduziu os juros para 2% ao ano, mas não conseguiu mantê-lo baixo. A inflação perdeu o controle e, quando isso acontece, ela fica disseminada e vai para outros setores. O problema começa a aparecer em todos os lugares. E ainda não resolver resolver essa questão.
Na nossa opinião, devemos ter uma inflação de 9% este ano. Vamos ter que controlá-la com juros, correndo o risco da Selic chegar a dois dígitos para conseguir debelar a inflação.
Além disso, também erramos na questão da gestão política. Isso gera um ruído enorme e tira energia do país, que precisa avançar em reformas.
Até avançamos com a reforma da Previdência e, em parte, com a reforma do Imposto de Renda, mas ela também deve gerar um processo inflacionário, dado que o governo buscou promover junto uma redução do IR para a classe média.
Isso se caracteriza como uma medida mais populista, assim como a expansão do Bolsa Família. O resultado é que vai demorar mais tempo para conseguirmos equalizar a dívida.
O Brasil sempre busca atalhos, mas não tem jeito. O caminho que era para ser curto vai tomar muito mais tempo.
Tivemos também fatores exógenos, como a pandemia e a crise hídrica. Acredito que seja improvável termos apagão ou racionamento, mas isso mostra o quanto o Produto Interno Bruto (PIB) potencial do Brasil é baixo. Outro ponto é que a energia escassa e o custo muito alto também geram um processo inflacionário forte, que dissemina para outros setores.
O Brasil tem várias oportunidades, mas é preciso resolver a questão macro. O BC precisa subir os juros para debelar a inflação.
Além disso, na parte política, apesar da carta de Bolsonaro à nação, o governo é muito belicoso. É muito improvável que não vá entrar em novos conflitos mais à frente. O mais provável é que isso volte a acontecer.
Estamos em um ambiente de crise. Para sair dessa situação, acredito que só com um choque de realidade nos políticos, mas talvez para eles isso só ocorra em outros níveis de mercado. Talvez com o dólar a 6,00 reais, os juros em dois dígitos e a Bolsa em derrocada.
Estamos há cerca de um ano das eleições e o candidato líder [nas pesquisas] já falou que é contra o teto de gastos. Isso não só gera expectativas ruins no mercado como também tira os incentivos para o próprio governo em cumprir o fiscal, já que o lado oposto está falando em não cumprir.
Enquanto o Brasil não resolver a questão macro, com combate à inflação e, do lado político, não houver uma compreensão da necessidade do controle fiscal, o ambiente não vai melhorar.
Estamos mais otimistas com a Bolsa no exterior. No Brasil, buscamos só gerar alfa [selecionar ações que podem ter um retorno acima da média do mercado], em alguns nomes excepcionais, como plataformas de investimentos, bancos digitais, que têm crescimento acima de 15% ao ano.
Gostamos também de algumas empresas que possuem diversificação internacional, menos dependentes do cenário macroeconômico doméstico. Entre elas: Natura (NTCO3) e Gerdau (GGBR4).
Infelizmente, com essa deterioração macro, estamos comprados em dólar e vendidos em real. Achamos que ainda tem assimetria positiva para cima. Na nossa visão, os juros vão subir mais rápido do que o mercado espera.
Os juros longos já são negociados acima de 10% no mercado. Isso tem desestimulado investimentos em Bolsa. Mas juros é consequência e não causa. Acreditamos que a inflação deva acelerar e ela fará com que os juros subam mais.