Nos últimos três anos, o Ibovespa vem se valorizando em reais, mas o movimento não foi acompanhado pelo preço em dólar (Amanda Perobelli/Reuters)
Beatriz Quesada
Publicado em 9 de dezembro de 2020 às 16h16.
Novembro foi um mês excepcional para o mercado brasileiro, marcado por boas notícias em relação às vacinas contra o coronavírus e pela definição no cenário político dos Estados Unidos com a eleição de Joe Biden. Como resultado, os investidores estrangeiros se sentiram mais seguros com a retomada da economia global e migraram suas posições para países como o Brasil, em busca de ativos mais arriscados e mais rentáveis.
Em novembro, o capital externo ingressou com 33,3 bilhões de reais na B3, valor recorde desde o início da série mensal em 1995. E, na esteira do capital estrangeiro, o Ibovespa acumulou alta de 15,90%, melhor resultado mensal desde março de 2016 e o melhor novembro da Bolsa desde 1999.
Diante de tanta prosperidade, é natural que o investidor se pergunte se o Ibovespa ainda tem espaço para crescer. Em outras palavras, o índice ficou caro depois do rali do mês passado? Para o investidor estrangeiro, a resposta parece ser não. No exterior, o preço e a atratividade da bolsa brasileira são medidos em dólares, não em reais. E, sob essa perspectiva, o índice ainda tem espaço para avançar.
Em moeda nacional, o Ibovespa encerrou novembro aos 113.793,06 pontos, número muito próximo do acumulado para o mês de janeiro deste ano, em que foram registrados 113.760,60 pontos. Já em dólares, o valor acumulado para o primeiro mês do ano era de 26.644,94 pontos, enquanto novembro fica bem atrás, aos 20.739,26 pontos, segundo cálculos da agência classificadora de risco Austin Rating.
A principal explicação para a incompatibilidade dos valores é a depreciação acumulada de 27% do real frente ao dólar em 2020. “A desvalorização do real deixou o Ibovespa atrativo para o investidor estrangeiro porque ele precisou de menos capital para entrar na B3. Ou seja, mesmo que a bolsa tivesse ficado estável no mesmo patamar de janeiro até hoje, ela ainda estaria mais barata por causa da desvalorização da moeda”, afirma o economista-chefe da Austin Rating Alex Agostini.
O preço da bolsa lá fora, no entanto, já esteve mais em conta neste ano. O Ibovespa dolarizado acumulou uma alta de 27% em novembro em comparação a outubro e já se afastou das mínimas de março, quando o resultado acumulado fechou em apenas 14.045,77 pontos.
Ainda assim, o Ibovespa está longe de renovar suas máximas em dólares. O recorde é de maio de 2008, quando o índice acumulou 44.551,37 pontos. Naquele mês, a agência Standard & Poor's elevou a nota atribuída ao Brasil para títulos da dívida emitidos em moeda estrangeira para "BBB-" (a anterior era "BB+"), alçando o país ao chamado grau de investimento -- e isso ampliou a atração de recursos estrangeiros para o país. Em reais, no mesmo período, o Ibovespa estava em 72.592 pontos, outro recorde que só voltou a ser superado quase uma década depois, em 2017.
Nos últimos três anos, o índice vem se valorizando em reais, mas o movimento não foi acompanhado pelo preço em dólar. Em junho de 2019, quando foi quebrada a marca dos 100 mil pontos no acumulado mensal, o Ibovespa dolarizado valia 26.347,06 pontos, quase 20 mil pontos abaixo da máxima de 2008.
Para este ano, as previsões preliminares da Austin indicam que o mês de dezembro deve colocar o índice na casa dos 22.000 pontos, em termos dolarizados. Segundo dados da Economatica, o índice encerrou o pregão de ontem aos 22.347 pontos sob a perspectiva do dólar. Em reais, o fechamento foi de 113.793 pontos, alta de 0,18%.
Nas últimas semanas, a moeda americana enfrentou uma sequência de quedas consistentes frente ao real, impulsionadas, inclusive, pelo fluxo comprador do estrangeiro na B3. A entrada de capital externo contribuiu para valorizar o real, que se apreciou 7,91% frente ao dólar no mês passado.
O movimento, no entanto, não deve retirar o apetite do investidor estrangeiro por ativos do Brasil. Isso porque as recentes depreciações do dólar fazem parte de uma tendência global em que a moeda se fortalece à medida que os mercados ficam mais esperançosos com o fim da pandemia de Covid-19 e com a retomada da economia.
“Mesmo com a queda recente do dólar, o mercado nacional segue muito atrativo por conta do avanço das vacinas, que atraem o capital estrangeiro para a bolsa brasileira”, afirma Pablo Spyer, diretor da corretora Mirae Asset.
“Além disso, é possível esperar novas ondas de estímulo nos países desenvolvidos, gerando um quadro de grande liberação de fluxo financeiro, que deve continuar migrando para os países emergentes”, conclui. Apenas nos Estados Unidos, o pacote de estímulos pode chegar a 908 bilhões de dólares.
Apesar do temor com o cenário fiscal, as perspectivas são boas para o Brasil. O JP Morgan vê o Ibovespa a 134 mil pontos no próximo ano, em linha com a estimativa do Bank of America (BofA), que projeta o índice aos 130 mil pontos. O Goldman Sachs tem uma previsão um pouco mais modesta, de 125 mil pontos, mas destaca que o Ibovespa ainda não retornou aos patamares pré-covid, o que abreinvest espaço para valorização.