Vazamentos: informações sobre envio de armas pela Otan foram divulgadas on-line (Leonardo/Exame)
Até pouco tempo atrás os fundos e gestores ESG ficavam bem longe de ações de fabricantes de armas.
Fabricantes de caças-bombardeiros, tanques e metralhadoras nunca estiveram no radar dos investidores ESG.
Mesmo se essas empresas têm um papel importante em termos de crescimento econômico, tecnológico e, especialmente, de segurança nacional.
Essa tendência de esnobar, ou até difamar empresas do setor da Defesa por parte de fundos ESG perdurou por anos.
Mas a partir do dia 24 de fevereiro, o mercado mudou.
Vladimir Putin invadiu a Ucrânia e conseguiu alterar a percepção dos gestores de fundos ESG sobre as ações de empresas produtoras de armas.
A invasão russa da Ucrânia mudou o jogo no caso das abordagens dos investidores em relação às suas estratégias ambientais, sociais e de governança, o famoso acrônimo ESG.
Foi o caso do Skandinaviska Enskilda Banken (SEB), um dos maiores bancos da Suécia.
Há um ano, a instituição financeira sueca proclamou que nenhum de seus 100 fundos jamais compraria uma ação de empresas produtoras de armas.
Mas no primeiro de abril, seis fundos do SEB voltaram a comprar ações de empresas do setor de Defesa, como a Saab, fabricante sueca de aviões de combate (que inclusive está fornecendo seus modelos Gripen ao Brasil).
Não por acaso, as ações da Saab na Bolsa de Valores de Estocolmo passaram de 220 coroas para 415 coroas de fevereiro até maio, chegando a dispararam 30% em cinco dias.
A única exclusão que ainda está valendo para os fundos da SEB é sobre investimentos em empresas que fabricam, desenvolvem ou vendem armas que violem convenções internacionais ou que estejam envolvidas no desenvolvimento de armas nucleares.
Segundo os analistas do Citi, “a partir de agora, o setor da Defesa será considerado cada vez mais como uma necessidade que facilita a adoção de critérios ESG para os negócios, mantém a paz, a estabilidade e outras coisas socialmente justas”.
Traduzindo para o bom português: está liberado comprar papéis de produtores de armas. E o mercado não vai julgar os fundos que operarem nesse sentido. Muito menos puni-los.
É incrível como, poucas semanas após a invasão da Ucrânia, a indústria de armas começou a brilhar de luz própria os olhos de gestores que até poucos meses atrás - especialmente nos Estados Unidos e no norte da Europa - sequer olhavam para esses ativos.
Se em janeiro os papeis de produtores de armas estavam junto com os das usinas a carvão e produtores de tabaco, agora o jogo parece ter mudado de vez.
Essa mudança repentina de rumo dos gestores de fundos ESG não é apenas motivada pelos temores de outras possíveis investidas de tropas russas em outros países, principalmente Finlândia ou Suécia.
O que também está catalizando as atenções dos executivos do mercado financeiro é uma razão muito mais pragmática: o MSCI Defense and Aerospace Index - o índice que reúne as principais empresas do setor de Defesa do mundo - subiu 17% desde o começo de 2022.
Um desempenho estelar que só ocorreu outras duas vezes desde 1999.
E que se torna ainda mais interessante comparando com o resto do mercado financeiro, que está sofrendo nesse 2022 de alta de juros por parte dos Bancos Centrais do mundo inteiro.
E essa alta de dois dígitos do índice dos produtores de arma poderia ser apenas a ponta do iceberg.
Em resposta a invasão de Putin a Alemanha anunciou investimentos de 100 bilhões de euros (cerca de R$ 550 bilhões) nas Forças Armadas.
A ideia é chegar em breve a 2% do Produto Interno Bruto (PIB) da Alemanha, maior economia da Europa, investido na Defesa de forma permanente.
Isso daria ao país europeu o terceiro maior orçamento da Defesa do mundo.
E vai provocar um aumento maciço dos gastos em equipamentos militares.
Ou seja, a previsão no horizonte é mais faturamento para as empresas produtoras.
Não por acaso, desde o primeiro dia da “operação militar especial” de Putin na Ucrânia, as ações da Rheinmetall (empresa que produz tanques para países da OTAN) literalmente explodiram: alta de 160% na Bolsa.
E além da Alemanha, outros países prometeram aumentar seus gastos militares, o que vai resultado em um aumento nos estoques de defesa.
Entre eles, Polônia, Romênia, Suécia, Dinamarca e China já anunciaram aumentos no orçamento da Defesa, enquanto o Reino Unido, França e Canadá estão considerando aumentos no futuro próximo.
Com um cenário como esse, os gestores tiveram que se virar.
Se no início do ano, alguns gigantes da gestão de ativos tinham posições vendidas em ações de empresas da Defesa, agora tiveram que mudar rapidamente de rumo.
É o caso da BlackRock que estava apostando contra a empresa britânica BAE ou contra a italiana Leonardo.
Agora a ordem é: recomprar.
Afinal, como explicou recentemente o primeiro-ministro da Letônia, o que é mais ESG do que a segurança nacional?