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Externo é o que faz preço no Brasil, e estrangeiro está mais otimista com o país, diz Esteves

Presidente do conselho do BTG Pactual diz que investimento nos EUA chegou ao pico - e os recursos que saem de lá, estão passando por aqui

André Esteves, chairman do BTG Pactual, no Global Manager Conference 2025 (BTG/Divulgação)

André Esteves, chairman do BTG Pactual, no Global Manager Conference 2025 (BTG/Divulgação)

Mitchel Diniz
Mitchel Diniz

Repórter de negócios e finanças

Publicado em 26 de junho de 2025 às 14h24.

Última atualização em 26 de junho de 2025 às 16h37.

Os portfólios globais estão sendo remodelados e reduzindo a exposição em ativos dos Estados Unidos, diante de mudanças nos padrões do mercado. É essa a visão de André Esteves, presidente do conselho de administração e sócio do BTG Pactual (do mesmo grupo de controle de EXAME). Ele nota que Bancos Centrais, fundos soberanos e de pensão estão diversificando os investimentos, e ainda que não estejam necessariamente saindo das ações americanas, reduzem posições em treasuries e dólar.

"Tivemos, nos seis primeiros meses do ano, um spillover [transbordamento] de dinheiro americano, ou de alocação em Estados Unidos, que trouxe enorme benefícios para os emergentes", disse o executivo, durante o Global Managers Conference Brasil 2025, organizado pelo BTG Pactual Asset Management. "O Brasil tem bons ativos, empresas a um valuation atraente e foi um dos receptores", complementou.

Para Esteves, o estrangeiro está mais otimista com o Brasil do que o investidor local e tem demonstrado mais interesse no país desde que o chamado excepcionalismo americano entrou em cheque.

"Esse pouquinho de diversificação fez com que os investidores fossem dar uma andada pelo mundo e passaram por aqui. Aqui tem escala, está muito barato, e a gente vive o sucesso de uma agenda de reformas que cruzaram os últimos governos", explica. As taxas de juros elevadas e o crescimento da economia acima do esperado, por cinco anos consecutivos, também estão chamando a atenção global, afirma Esteves. "Essa é a percepção que o investidor internacional, sobretudo o mais sofisticado, está tendo do Brasil."

Segundo ele, as notícias locais dando como exemplo a derrubada da cobrança do IOF na Câmara e Senado ainda que importantes na formulação de cenários, não mexem com o mercado de forma tão relevante. Se o fluxo não vem, explica, tem muito a mais a ver com fatores externos do que internos. "Tem um pouquinho de proximidade de eleição [no Brasil], mas muito menos do que headlines de jornal e conversas de bar sugerem", disse.

Uma nova ordem

chairman do BTG Pactual deu exemplos das recentes mudanças de padrões no mercado, com o dólar perdendo força depois de uma década e juros subindo nos EUA em um momento de risk off  (busca por menos risco) no mercado.

Esteves, contudo, não acredita que o dólar vai deixar de ser a moeda global. "O que acontece é um fundo soberano que tinha 60% de ativos em dólar nos Estados Unidos passando a ter 55%", explica. Da mesma forma, na avaliação do executivo, as empresas americanas continuam "espetaculares", mas ficam cada vez mais caras à medida que crescem.

O mercado de ações, segundo ele, está no "zero a zero". "Os portfólios globais parecem não estar vendendo ações americanas, mas também não estão comprando", afirma.

Tese estranha

Esteves comparou os Estados Unidos a um "buraco negro que atrai capital de todos os lugares com uma atratividade única". O executivo afirma que não se trata de uma bolha, mas mérito de um ambiente bem regulado, previsível, com um mercado de capitais mais desenvolvido e que concentra uma moeda de reserva mundial. Qualidades que, segundo ele, permitiram uma empresa como a Nvidia gerar US$ 2 trilhões de market cap em apenas dois anos. No entanto, Esteves acredita que, depois de a Bolsa americana crescer 20% por dois anos consecutivos, esses eventos chegaram a um pico agora em 2025.

O executivo disse ainda que a tese do liberation day, de Donald Trump, é "estranha" e "um tanto mercantilista" ao partir do princípio de que os Estados Unidos estão exportando criação de riqueza para outros países . Mesmo tendo déficits comerciais desde os anos 1970, "nenhum país ficou tão rico quanto os Estados Unidos", aponta Esteves, acrescentando que o país também está em situação de pleno emprego. "Existe uma concepção econômica errada e uma execução drástica. Isso criou uma volatilidade, novas inseguranças e uma consequência muito importante para os preços", disse.

Na avaliação de Esteves, o Federal Reserve está correto em manter a taxa de juros on hold, pois a economia americana está forte. A autoridade monetária americana, vale lembrar, tem sido pressionada por Trump a iniciar um ciclo de alívio o quanto antes. A imprensa americana inclusive noticiou que o presidente estaria tentando antecipar a saída de Jerome Powell do Fed antes do término final de seu mandato.

Mantendo a neutralidade

Na guerra comercial entre China e Estados, primeiro e segundo maiores parceiros comerciais do Brasil, respectivamente, o país deve se manter "na estrada histórica de política externa de neutralidade", afirma Esteves. "Fazemos negócio com todo mundo, como deve ser". O executivo destacou que o Brasil é um dos poucos países com escala no mundo em que os chineses podem fazer grandes investimentos em infraestrutura, o que é importante para se obter crescimento e produtividade. "Fomos também um dos poucos capazes de importar fertilizante da Rússia e Ucrânia ao mesmo tempo, em plena guerra [entre os países]. Que a gente mantenha isso, não cometa bobagens, nem erros infantis", disse.

Como exportador de commodities, o Brasil fica mais protegido do tarifaço, lembra o executivo. "Temos exposição a diferentes modelos econômicos e somos um dos poucos com déficit [comercial] com os Estados Unidos. O isolacionismo é mais uma oportunidade do que um risco para nós. É uma vantagem".

Um freio nos gastos públicos

Mansueto Almeida, economista-chefe do BTG Pactual, participou do mesmo painel que André Esteves e disse que o problema fiscal, obstáculo para destravar o potencial do Brasil, só vai ser resolvido com desaceleração dos gastos públicos, independentemente de quem estiver no governo. Ele explica que mesmo com uma elevada carga tributária, o país continua com déficit primário em ascensão, o que eleva a dívida pública cada vez mais. Reduzir a proporção de gasto em relação ao PIB, por sua vez, abre espaço para a inflação cair, com uma consequente redução de juros.

"O problema não é a arrecadação", disse. "E existem formas de arrecadar sem distorção, sem aumentar arrecadação de empresas ou famílias que já pagam muito imposto. Temos regimes tributários bons e ruins".

O economista falou sobre o crescimento dos programas sociais e, mesmo reconhecendo a importância deles, questionou sua eficácia. "Tem que ver se está ajudando mesmo a reduzir a pobreza e chegando a quem precisa", afirmou. A solução, tampouco, é fazer cortes drásticos de despesa de um ano para o outro, disse Mansueto.

Ele também questionou a política de valorização do salário mínimo, que é referência para ajustes na previdência social. A aposentadoria de servidores civis e militares, disse o economista, representa metade do gasto público não financeiro do governo federal, algo em torno de R$ 1,2 trilhão por ano.

De qualquer forma, tanto o economista quanto Esteves, acreditam que a percepção política do tema fiscal melhorou. "A percepção sobre o risco fiscal é muito mais presente", disse Mansueto. "Não é um problema de esquerda ou de direita. Houve um amadurecimento e o governo, qualquer que seja, está sendo cobrado, para não gastar mais do que ganha", complementou Esteves.

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