Walter Maciel, CEO da AZ Quest: "Queremos ser os maiores aliados do goveno e do Estado (Gabriel Reis/Divulgação)
Guilherme Guilherme
Publicado em 2 de dezembro de 2022 às 06h33.
Última atualização em 2 de dezembro de 2022 às 11h05.
Quem será o novo ministro da Fazenda? A pergunta, que segue sem resposta, se tornou o principal ponto de incerteza (e volatilidade) do mercado brasileiro. Bolsa e câmbio têm chacoalhado a cada rumor de quem poderá assumir a pasta. Mas mais do que o nome do ministro, investidores esperam por maior clareza sobre os planos fiscais do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.
"Se o ministro da Fazenda fizer um discurso pragmático, ele irá conquistar o mercado. Mais importante do que ser brilhante é ser pragmático", afirmou Walter Maciel, CEO da AZ Quest, em entrevista à Exame Invest. "Mas tem que ser pragmático de maneira consistente, não basta ser só em um dia."
Com mais de 30 anos de mercado e R$ 23 bilhões sob gestão, Maciel acredita que a escolha será, antes de tudo, uma sinalização de que o novo governo seguirá a trilha da responsabilidade fiscal.
"É evidente que o mercado prefere um nome que ancora as expectativas e traz credibilidade. Armínio Fraga, Henrique Meirelles, Pérsio Arida são nomes que, instantaneamente arrumam a casa por si", disse. O CEO da AZ Quest aponta que um nome político, por outro lado, teria de ser rodeado de uma boa equipe técnica e demonstrar clareza de que seria um apenas "condutor" entre a pasta e o Congresso.
"O Fernando Haddad é um economista, mas que não exerceu a função por muito tempo. Caso seja escolhido, precisará deixar claro que sua posição será política. Aí ficaria mais palatável."
Apesar de toda a incerteza local e internacional, Maciel está otimista com a direção do mercado brasileiro. A maior prova é de que, enquanto segue montado em dólar contra as principais moedas do mundo, no Brasil, sua aposta é de valorização do real.
"O dólar tem muito mais cara de R$ 4 do que de R$ 6, mas depende totalmente da sinalização fiscal do governo", disse. "O governo tem o queijo e a faca na mão para criar um momento fabuloso."
Confira a entrevista com Walter Maciel, CEO da AZ Quest.
Qual será o Brasil que o Lula irá assumir no início de 2023?
O real está muito desvalorizado e a bolsa está no múltiplo mais baixo desde 2002. Então, esse governo tem o queijo e a faca na mão para criar um momento fabuloso, até porque o Banco Central já fez o trabalho tinha que fazer [de subir juros para conter a inflação]. A economia tem a parte humana, que está sendo negativamente afetada agora por causa das expectativas. Mas tem também a parte da matemática, que funciona e responde muito aos juros.
Se fizerem tudo direito agora, o juro tem tudo para cair para um dígito no começo de 2024. O problema é que não começou assim e as notícias que estamos recebendo são ruins. É isso que afeta o mercado.
Vimos o mercado precificar altas de juros para o ano que vem. Houve algum exagero, sendo que o Focus prevê quedas?
Não. O primeiro discurso do Lula após ser eleito foi muito bom. Começou a ensaiar uma lua de mel na primeira semana. Mas o que começamos a ver depois foi um vácuo político e de liderança. Não se percebia organização na divulgação das notícias e na maneira de levar as coisas ao Congresso e mas também começou a se perceber uma dissociação da ideia inicial.
As coisas já não dependem mais do presidente Jair Bolsonaro e do ministro Paulo Guedes. Por outro lado, não se sabe quem vai ser o ministro. E no meio disso surgiu uma proposta sem a participação da equipe econômica, o que me parece algo dissonante. Depois, ainda apareceu o Lula falando na televisão. E aí se começa a operar em cima do que se ouviu. Se é algo que te deixa animado, você corre para a bolsa, vende dólar, contrata gente e compra imóvel, ou começa a ficar preocupado.
E o mercado ficou preocupado?
Ficou, com a falta de de clareza e com a perspectiva que foi colocada na mesa de uma PEC que inicialmente era por prazo indefinido. Acho que vai sair com um prazo de um ano. Mas isso não interessa. A proposta gastaria 80% da economia da reforma da previdência e agravaria a dívida do Brasil. Não é uma coisa 'light'. E do lado do ministério, o investidor dorme com a sinalização de um nome e acorda com a de outro. Há uma erosão de apoio. O juro que sai de 13,75% para 8,5% acontece com a trajetória fiscal sustentável. Se a dívida caminhar para 100% do PIB, é dólar para cima, juro para cima e bolsa para baixo.
Esse deverá ser o caminho do Brasil nos próximos quatro anos?
Ainda acredito na racionalidade. Não acredito que o governo vai criar para si mesmo um caminho cheio de obstáculos, ainda mais que a rua está cheia de pessoas até agora . Não vai ter golpe nenhum, mas ter gente na rua até agora mosta que muita gente ainda está chateada com o resultado, porque torcia para o outro lado. Há um desafio ainda maior de ser um Nelson Mandela, de gerar pacificação e otimismo. Para isso, é preciso começar a dar sinais, mas os que começaram a vir não vão nessa linha. Se começar a ir por esse caminho, de desemprego e inflação e dólar lá em cima, haverá um obstáculo muito grande, até porque o Congresso que irá assumir é ainda mais opositor que o atual.
O novo governo errou na forma como apresentou a PEC da Transição?
Foi uma negociação mal conduzida. Lançaram os números lá em cima para tentar pegar embaixo, só que não perceberam que, ao lançar lá em cima, eles assustariam geral, dificultando a própria negociação. Não acredito num ganha-perde. É um ganha-ganha ou um perde-perde. E acho que será ganha-ganha. Se irmos para um caminho responsável, haverá um momento de mercado muito muito bom.
Fala-se muito do nome do Haddad para a Fazenda. O mercado já reagiu mal a esses rumores, mas o quanto disso já está precificado? O mercado já aceitou o Haddad?
Tem que aceitar, mas o mercado reage ao que vai ser falado. O mercado tem certa apreensão com o Haddad porque, apesar de ser economista, ele não exerceu essa função por muito tempo. Ele viria para uma posição política. Teria que ter uma equipe técnica muito forte em baixo, mas ninguém sabe ainda qual é. Faltam sinalizações. Tem que ter um recado de que não será ele que irá formular os planos econômicos e que será apenas um condutor entre a pasta e o Congresso. Aí ficaria mais palatável. Mas é evidente que o mercado prefere um nome que ancora as expectativas e traz credibilidade. Armínio Fraga, Henrique Meirelles, Pérsio Arida são nomes que, instantaneamente arrumam a casa por si. São pessoas com sucesso histórico.
Entre os políticos sondados, teria algum mais palatável que o Haddad?
O [Alexandre] Padilha é um bom nome do ponto de vista de dar essa sinalização, de ser um político não economista que possa fazer esse papel ao estilo Antônio Palocci [ ex-ministro da Fazenda de Lula]. Mas eles teriam um ônus que o Palocci também teve. Quando o Palocci chegou ninguém o conhecia, mas ele conseguiu romper resistências e rapidamente angariar expectativas com um discurso muito pragmático.
É disso que o novo ministro vai precisar? O pragmatismo?
No final é isso. Se o ministro da Fazenda fizer um discurso pragmático, ele irá conquistar o mercado. Mais importante do que ser brilhante é ser pragmático. Mas ele tem que ser pragmático de maneira consistente, não basta ser só em um dia.
O vice-presidente Geraldo Alckmin também é médico e teve um desempenho no governo de São Paulo do ponto de vista de execução muito bom ao longo do tempo. É um cara que não dá susto, pé no chão. Com algumas sinalizações, no fim de semana, ele acalmou todo mundo. É esse o trabalho que o ministro deve fazer. O ministro precisa vir com autoridade. O ministro da Fazenda vive de credibilidade. É um cargo muito visado, então precisa de muita credibilidade e pragmatismo.
Não é um cargo a ser encarado com uma catapulta política?
Na nossa história só um ministro da Fazenda saiu do cargo para ser presidente, o Fernando Henrique Cardoso. Mas porque pegou o plano real, acabou com a inflação e dobrou a renda da população. Então, não é tão óbvio que esse seja o cargo que irá trazer mais dividendo político no longo prazo. O mais provável é que seja a pasta que dê mais dor de cabeça.
Dado todo esse cenário, como a AZ Quest vem se posicionando? Houve mudança de posições nas últimas semanas?
Reduzimos algumas posições, porque o cliente não gosta de volatilidade. Mas continuamos vendidos em dólar contra real. Acreditamos que o real ainda pode se valorizar bastante. Continuamos com algumas posições em juros longos, onde tem muito prêmio. Saímos um pouco da pré[-fixada] porque sofre muito com as expectativas de curto prazo.
No exterior, temos posição de dólar contra euro, porque a Europa está atrasada [na alta de juros] em relação aos Estados Unidos e tem um problema mais grave. Também temos posição em dólar contra moedas emergentes.
O quão barato está o dólar aqui no Brasil? Para onde deve ir a moeda no ano que vem?
Vai depender só do fiscal. O mundo inteiro vai lutar com a inflação, então vai cair o consumo e o preço dos industrializados, que é o que importamos. Mas falta comida no mundo inteiro, então continuará sustentável o que vendemos - ainda mais se a China voltar a acelerar. Então, nossa balança fiscal ainda vai melhorar. O dólar tem muito mais cara de R$ 4 do que de R$ 6, mas depende totalmente da sinalização fiscal do governo.
A AZ Quest está otimista com a bolsa também?
Há uma série de oportunidades. Na bolsa, estamos com múltiplos quase nunca vistos antes. A bolsa está mais barata em preço/lucro do que em abril de 2020, quando não se sabia se haveria uma depressão econômica. E o fundo só pega as melhores empresas da bolsa, que estão mais blindadas ao ambiente.
Temos Localiza e Vale. A Petrobras está mais complicada, está muito barata, mas foi alvo de muito barulho, tanto do governo que está saindo, quanto do que está entrando.
Teria algo mais a que gostaria de comentar?
Quero enfatizar para os poderes que vão assumir que nós do mercado somos os maiores torcedores para que esse país cresça e se desenvolva. Estamos aqui empregando gente colocando nossa energia, nosso capital e nossas vidas na linha de frente. Nós queremos ser os maiores aliados do governo e do Estado.