Copom reduziu a Selic para 12,25% ao ano (Getty Images/Getty Images)
Repórter de Invest
Publicado em 2 de novembro de 2023 às 08h50.
Última atualização em 3 de novembro de 2023 às 11h16.
A discussão sobre a meta fiscal dominou as atenções dos mercados nos últimos dias depois do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sinalizar que o governo pode abandonar a meta de zerar o déficit público em 2024. O temor dos mercados é que a mudança impacte a trajetória de queda de juros no País, mas este não deve ser o caso. A avaliação é de Julio Hegedus Netto, economista-chefe da Mirae Asset.
“Claro que a questão fiscal precisa ser encaminhada. Porém, de certa forma, o mercado já prevê que vai ser difícil fechar um déficit zero”, afirmou Hegedus Netto em entrevista à EXAME Invest após a última decisão de juros do Banco Central.
O Comitê de Política Monetária (Copom) reduziu os juros em 0,5 ponto percentual, para 12,25% ao ano nesta quarta-feira, 1º, e ignorou o burburinho sobre a meta fiscal em seu comunicado sobre a decisão. O economista acredita que o Copom não deve mudar a trajetória de cortes este ano por conta do fiscal – mas a questão deve ficar mais evidente nos próximos meses. Veja abaixo os principais pontos da entrevista:
As recentes críticas do presindente Lula ao déficit zero em 2024 ficaram de fora do comunicado – mesmo com a repercussão recente nos mercados. Em sua avaliação, isso tira impacto da discussão sobre a meta?
Julio Hegedus Netto: Não houve menção no comunicado, mas precisamos ficar atentos à divulgação da ata na próxima semana. Na minha opinião, alguma intervenção houve do Gabriel Galípolo [diretor do BC indicado por Lula], sinalizando que o governo vai chegar a um consenso internamente, acho que o Haddad vai conseguir contornar. Ainda falta muita coisa para equilibrar o resultado fiscal primário, dificilmente será alcançado. Mas teremos uma solução negociada para essa questão da meta.
A discussão deve afetar a trajetória de corte de juros?
Hegedus Netto: O comunicado praticamente repetiu setembro, exceto pelo tom mais amargo em relação ao mercado internacional. Acredito que a toada de cortes de 0,5 ponto percentual será mantida para a próxima reunião, com a Selic encerrando 2023 em 11,75% ao ano. Mas claro que a questão fiscal precisa ser encaminhada. Porém, de certa forma, o mercado já prevê que vai ser difícil fechar um déficit zero.
Você mencionou um tom mais amargo em relação aos mercados internacionais. O que está em jogo no exterior e como isso pode afetar a nossa trajetória de juros?
Hegedus Netto: O maior risco é a volatilidade absoluta nos mercados de commodities, especialmente o petróleo – que pode gerar um choque de oferta e impactar a inflação global. Por enquanto temos um cenário de invasão por terra do exército israelense na Faixa de Gaza, com intervenção indireta dos principais players internacionais que estão de olho, principalmente, no Irã. Não acho que a guerra chegará ao ponto de se espalhar pelo Oriente Médio, mas o comunicado colocou isso como preocupação logo no início do texto.
E no caso das preocupações citadas pelo Comitê, como entra a questão dos juros nos Estados Unidos? Tivemos recentemente uma disparada no rendimento das Treasuries que tomou as atenções em outubro.
Hegedus Netto: A situação foi levemente amenizada depois da reunião de ontem do Fed [Federal Reserve, o banco central americano], que manteve a taxa de juros inalterada nos EUA. Mas há sim um fluxo de recursos do do mercado americano dos títulos que impacta as moedas globais, dos emergentes principalmente. Ainda é um movimento muito gradual na parte do câmbio. Mas o Brasil não deve ficar olhando apenas para o exterior.
Quais são os principais pontos de atenção no mercado local?
Hegedus Netto: Os indicadores de inflação estamos caminhando bem. É importante observar que a economia está desacelerando um pouco mais, serviços em queda, varejo também fraco. Muito do crescimento da economia no segundo trimestre foi impulsionado por consumo das famílias e isso não é sustentável. Então é importante que os investimentos retomem para que tenhamos um crescimento mais sustentável à médio prazo. E existe ainda, claro, a questão fiscal.