Invest

David Vélez, CEO do Nubank: “Esperamos que o mercado acorde e veja o que estamos construindo”

Fundador da fintech conta como planeja reforçar oferta de crédito em 2023; operação no México também deve ganhar força

David Vélez, CEO e fundador do Nubank (Nubank/Divulgação)

David Vélez, CEO e fundador do Nubank (Nubank/Divulgação)

BQ

Beatriz Quesada

Publicado em 16 de dezembro de 2022 às 10h51.

Última atualização em 16 de dezembro de 2022 às 15h37.

“Vamos focar muito na execução em 2023 e, em algum momento, esperamos que o mercado acorde e se dê conta que estamos construindo a maior plataforma de produtos financeiros da América Latina”, disse David Vélez, CEO e fundador do Nubank, em entrevista exclusiva à EXAME Invest.

A fala de Vélez se refere ao descompasso entre os resultados da fintech e o desempenho das ações ao longo de 2022. O ano foi turbulento para o Nubank na bolsa, com as ações da fintech caindo 60% no acumulado desde a abertura de capital em dezembro do ano passado. 

Nas linhas do balanço, no entanto, o negócio avança em bom ritmo. A empresa entregou no terceiro trimestre seu primeiro lucro após abrir capital na bolsa, de US$ 7,8 milhões e uma receita líquida de US$ 1,3 bilhão – um novo recorde e um crescimento de 171% na comparação ano a ano. 

Contudo, o resultado foi conquistado em um cenário de elevação nas taxas de juros globais, em especial nos Estados Unidos, deixando investidores receosos com as empresas focadas em crescimento, como é o caso da fintech brasileira. Não à toa, o Nubank perdeu mais de US$ 20 bilhões em valor de mercado no período.

A estratégia do Nubank para navegar no ambiente hostil é continuar engajando sua grande base de 70 milhões de clientes, de olho, principalmente, em linhas de crédito inexploradas até então. “Cerca de 70% de toda a rentabilidade do sistema financeiro brasileiro vem do crédito. Então, temos uma oportunidade na qual estamos muito focados”, contou Vélez.

Os holofotes estão no empréstimo consignado e no microcrédito. A primeira aposta é, segundo Vélez, uma estratégia óbvia para o Nubank por ser mais segura em um momento de alta da inadimplência no sistema financeiro do País. 

“Tem uma oportunidade óbvia que é esse mercado de R$ 300-400 bilhões de crédito colateralizado no qual podemos crescer. Nossa base de clientes quer esse produto, e ele traz muito menos risco em termos de crescimento”, disse. A entrada no segmento foi sinalizada em meados deste ano, e deve sair do papel ainda no primeiro trimestre de 2023.

O crédito ao microempreendedor, por sua vez, também pode encontrar terreno fértil para se desenvolver a partir do próximo ano. Nesta segunda-feira, o novo ministro da Fazenda do governo Lula, Fernando Haddad, se referiu às fintechs e aos bancos digitais ao dizer que pretende estimular o microcrédito por meio da competição no sistema bancário. Prato cheio para o  Nubank, que já vem investindo em soluções para esse público e pretende ampliar a presença no próximo ano com soluções de crédito. 

Vale lembrar que a empresa do cartão roxinho já cultiva mais relacionamentos de crédito no Brasil do que gigantes como Santander, Caixa e Banco do Brasil. Segundo cálculos do JPMorgan, o Nubank tem 24 milhões de clientes com exposição de crédito, acima dos  17,6 milhões do BB, dos 21,5 milhões de clientes da Caixa e dos 21,2 milhões do Santander Brasil. E não fica muito atrás do Bradesco, com 26 milhões de clientes.

Para além do crédito, o Nubank pretende avançar no Brasil conquistando participação de mercado em áreas que já atua, como cartão de crédito, investimentos e seguros. O ano de 2023 também deve ser de forte expansão internacional: a expectativa é lançar o serviço de conta digital tanto no México quanto na Colômbia, o que pode impulsionar o crescimento nesses países em até 10 vezes, segundo Vélez. Confira abaixo os principais pontos da entrevista:

O novo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, citou recentemente que pretende estimular o microcrédito via competição, usando fintechs e bancos digitais ao invés dos bancos públicos, como foi feito no passado. Como o governo pode estimular a competição e o desenvolvimento da estratégia? 

David Vélez: O principal é manter a agenda existente hoje no Brasil do Banco Central. Criar espaço para novos participantes e manter forte apoio ao Pix e ao Open Banking. O Open Banking, em especial, vai ser um grande viabilizador de concorrência para crédito, já que permite que as instituições compitam para oferecer produtos melhores, com juros mais baixos. Em segundo lugar, existem algumas áreas mais difíceis onde seria possível estimular o crédito. Um exemplo são as microempresas. O Brasil tem mais de 12 milhões de microempreendedores e é um segmento muito mal atendido e que tem grande dificuldade de acessar crédito. Desde o início da pandemia, foram criados vários programas de governo de financiamento do segmento, mas são iniciativas que ainda podem crescer bastante porque existe muita informação sobre o cliente [ainda não utilizada].

Leia também: Haddad, como ministro, fala de IPOs enquanto Câmara muda Lei de Estatais para Mercadante

O crédito voltado para o microempreendedor é um foco para 2023? 

Vélez: É uma agenda importante no nosso plano de crescimento para 2023, uma grande oportunidade. Somos conhecidos, principalmente, por ser o banco digital do consumidor no Brasil, mas temos uma base muito grande de microempresários. Entre os mais de 70 milhões de clientes, calculamos que cerca de 8 ou 9 milhões tenham sua própria empresa e sejam microempreendedores. Um dos maiores desafios deles é justamente o acesso a crédito. Estamos começando uma agenda de dar crédito ao microempreendedor via cartão de crédito, um produto que dominamos. Já lançamos e está crescendo bastante bem, mas vamos sempre devagar. Preferimos oferecer limites baixos, sendo conservadores.

Essa tendência mais conservadora já vem de outras áreas, devido ao desafio do cenário macroeconômico. Como isso deve se refletir na carteira de crédito?

Vélez: O ano será de foco no crescimento da carteira de crédito; no crédito pessoal mas também colateralizado. Vamos ter um portfólio de produtos novos, com crédito consignado para funcionário público e crédito com securitização de investimentos como alguns exemplos. Temos muita expectativa de crescer esse portfólio de crédito com colateralização.

A busca é então por linhas de crédito mais seguras?

Vélez: Exatamente. De alguma forma, começamos focados em um produto de maior risco, que é o produto sem colateralização. Mas entrar nesse mercado é vital para monetizar qualquer banco digital, já que cerca de 70% de toda a rentabilidade do sistema financeiro brasileiro é crédito. Tem uma oportunidade óbvia que é esse mercado de R$ 300-400 bilhões de crédito colateralizado, no qual podemos crescer. Nossa base de clientes quer esse produto, e ele traz muito menos risco em termos de crescimento. Pretendemos lançar entre o primeiro e o segundo trimestre do ano que vem.

Assine a EXAME e fique por dentro das principais notícias que afetam o seu bolso. Tudo por menos de R$ 0,37/dia

Neste ambiente, como vocês avaliam o desafio da inadimplência para 2023? O Nubank se saiu melhor que os pares este ano, mas como deve ficar o indicador no próximo ano?

Vélez: Foi um ano de muita volatilidade em termos de visão macroeconômica. Trouxe um pouco mais de cautela do nosso lado em termos de crescimento, em especial no empréstimo pessoal, mas temos performado muito melhor do que o mercado estimava. Difícil saber até onde vai subir a inadimplência, acho que deve continuar subindo por um tempo. E isso significa que vamos continuar com um pouco mais de cautela, mas sem deixar de crescer e ganhar mercado. Isso acontece independentemente da economia. Temos muita informação para continuar crescendo no crédito dentro de uma base grande de clientes que continua avançando.

Leia também: Nubank tem receita recorde no 3º tri e primeiro lucro pós-IPO, de US$ 7,8 mi

Até o terceiro trimestre, o Nubank havia conquistado 70,4 milhões de clientes, um crescimento de 46% na comparação anual. O ritmo de expansão deve continuar forte em 2023?

Vélez: Não abrimos projeção de número de clientes para o próximo ano, mas entendemos que é possível manter o ritmo de crescimento atual em 2023. Parte disso deve vir de um crescimento bem acelerado em México e Colômbia, onde já somos o maior emissor de cartão de crédito e também líderes no segmento de bancos digitais.

Mesmo com o crescimento e ganho de rentabilidade, as ações do Nubank ainda não reagiram e sofrem com o cenário macroeconômico. O que esperam do desempenho do papel no ano que vem? Existe algum catalisador que possa destravar o preço, até mesmo esse investimento em linhas mais seguras de crédito, por exemplo?

Vélez: Acho que é impossível projetar o preço da ação porque o que está trazendo volatilidade são as incertezas macroeconômicas no Brasil e no exterior – em especial a alta nos juros americanos. Vamos focar muito na execução em 2023 e, em algum momento, esperamos que o mercado acorde e se dê conta que estamos construindo a maior plataforma de produtos financeiros da América Latina. E isso tem muito valor. Mas é impossível saber quando isso vai acontecer.

Leia também: Um ano após IPO, Nubank perdeu US$ 22,4 bi em valor de mercado. O que esperar do roxinho?

Além do crédito, para onde o Nubank deve caminhar no Brasil?

Vélez: No Brasil ainda vemos oportunidade de crescimento em diversos segmentos. Provamos que somos grandes, mas temos um market share [participação de mercado] baixo em muitos dos nossos produtos. Temos 12,5% de market share em cartão de crédito, mas em empréstimo pessoal temos entre 3% e 4%. Em investimentos, temos perto de 1%, em seguros, menos de 1%. Então tem uma grande oportunidade de continuar crescendo o número de clientes e o market share dentro dessa base de clientes.

Na frente de expansão internacional, o Nubank anunciou recentemente uma capitalização de US$ 330 milhões para investir no México. Que velocidade pretendem imprimir para continuar crescendo no país?

Vélez:  Já investimos US$ 1,3 bilhão no México, o que faz do país nosso segundo maior investimento na história. Já ultrapassamos 3 milhões de clientes e é um país com uma posição grande e uma renda per capita maior que no Brasil. Então, estamos muito animados. O próximo passo é o lançamento da NuConta [conta digital]. O cartão de crédito lá tem penetração mais baixa que no Brasil então, com o lançamento da conta, vamos poder aceitar os 5 milhões de possíveis clientes que hoje estão na fila de espera para o cartão. Uma vez lançada a NuConta, vamos acelerar bastante o crescimento como aconteceu no Brasil. Aqui, nós aceleramos o crescimento em 10 vezes em um mês com a NuConta. Fomos de 150 mil novos clientes por mês para 1,5 milhão.

Quando o lançamento será feito? Pretendem expandir também para outros países?

Vélez: A conta está em fase de testes e deve chegar a toda a base no primeiro trimestre do ano que vem. Em 2023 vamos manter muito o foco no Brasil, no México e na Colômbia. Depois do México, pretendemos lançar a NuConta também na Colômbia.

Acompanhe tudo sobre:AçõesBancosbolsas-de-valoresCréditoCrédito consignadoFintechsNubank

Mais de Invest

Receita abre nesta sexta-feira consulta ao lote residual de restituição do IR

O que é circuit breaker? Entenda e relembre as ‘paradas’ da bolsa brasileira

15 ideias de fazer renda extra pela Internet

Mutirão de negociação: consumidores endividados têm até dia 30 para renegociar dívidas