Inter: usou estratégia para expandir base de clientes (Inter/Divulgação)
Repórter do Future of Money
Publicado em 27 de maio de 2023 às 08h43.
Criado em 1994, o Inter se tornou um dos principais bancos digitais do mercado brasileiro, e registrou um crescimento acelerado de clientes nos últimos cinco anos. Em 2018, o banco tinha cerca de 1 milhão de clientes. Já em 2023, chegou à marca de 27 milhões. Se, por um lado, a expansão mostra uma estratégia bem-sucedida, ela também trouxe diversos desafios para a empresa.
"Esse crescimento mostra como fica complexa a vida da empresa com um ritmo desses de expansão", comenta Priscila Salles, CMO do Inter, em entrevista exclusiva para a EXAME. A base maior traz desafios, por exemplo, em áreas como retenção de clientes, sugestão de produtos, atração de potenciais usuários, gestão de dados e atendimento.
Mas o banco implementou algumas ferramentas para tornar esses desafios mais simples. Uma delas é a parceria com a Salesforce, voltada para otimizar canais de atendimento e marketing, coletar e aproveitar melhor dados para operações e, com isso, não apenas manter a base atual de clientes como continuar a sua expansão. Salles define a parceria como uma "relação de longa vida, integrando novas funcionalidades conforme a companhia foi crescendo".
"O Inter estava com um foco de captura de clientes, crescimento de base exponencial, e isso efetivamente houve. Com a mudança, crescimento, dos ventos do mercado, em especial pós-pandemia, todo mercado buscou encontrar formas de trazer mais eficiência operacional, crescimento se somou à margem, retorno do investimento, pela liquidez menor no mercado", explica Fabio Costa, General Manager da Salesforce no Brasil, em entrevista à EXAME.
Salles acredita que um dos diferenciais do Inter para ter atraído mais clientes é o esforço do banco digital para se tornar um "super app", reunindo diferentes tipos de produtos e serviços que não seriam tradicionalmente encontrados em uma instituição financeira. Hoje, o aplicativo do banco possui mais de 140 produtos que podem ser oferecidos, de compras a investimentos, e o lançamento mais recente foi de um seguro para pets.
"Ao lançar o Shop em 2019, o Inter identificou que, como detentor do crédito, poderia oferecer algum benefício de compra. Já que a pessoa vai comprar alguma coisa, porque não usar o Inter pra isso? Então buscamos reunir ofertas, os melhores parceiros e um sistema de cashback. A ideia é complementar ofertas além do próprio serviço financeiro em si, ter tudo no mesmo aplicativo", explica a executiva.
Esse movimento não foi algo exclusivo do Inter, e nem do segmento bancário. Uma das estratégias mais populares atualmente no segmento varejista é o do "bank as a service", em que empresas aproveitam sua base de clientes para oferecer serviços bancários, como carteiras digitais e cartões. Entretanto, a jornada para implementar essa estratégia é diferente da de uma instituição financeira.
"Outros players entenderam que, para ter um produto de varejo fortalecido, precisa do backbone financeiro, então surgiu o bank as a service. Mas a recorrência do cliente é o financeiro, o cliente entra não para ver uma geladeira, shampoo, mas entra para ver extrato, fatura, fazer investimento, e a partir pode se interessar por um produto. Então inverte a compreensão. A gente precisa mostrar para o cliente que já está engajado, enquanto outros segmentos precisam engajar", afirma Salles.
Costa, da Salesforce, avalia que "o Inter fez um movimento de diferenciação dentro do movimento de finanças, de ter uma vantagem competitiva que traz benefícios para a marca. O varejo também tem o embedded banking, ele está testando buscar uma diferenciação dentro do segmento. A parte curiosa é que se resolve isso dentro do segmento, a questão passa a ser a competição entre os segmentos, porque a disputa vira pelo cliente em si".
Nesse sentido, ele acredita que o maior diferencial das empresas nessa disputa é um elemento cada vez mais importante, independentemente da área de atuação: os dados.
Costa afirma que a Salesforce tem trabalhado para oferecer soluções que "aumentem a capacidade de atendimento ao cliente, aumentem produtividade do time de vendas, trabalhe com dados em tempo real, façam um atendimento mais eficiente e também aumentem a capacidade e chance de venda ao interagir com o cliente".
Ao mesmo tempo, a empresa notou a dificuldade das empresas de precisar customizar essas soluções para as suas próprias estruturas e processos. Por isso, foca em alternativas lowcode, em que "customiza o mínimo possível para atender as necessidades de processo". "Quando você segue o protocolo padrão, de implantação de soluções de tecnologia, pode ter um projeto problemático, muito customizado, fora do prazo e do orçamento. Defendemos que é preciso parametrizar mais do que desenvolver códigos, então a solução é mais rápida e menos complexa", diz.
Com isso, a Salesforce busca facilitar a implementação de ferramentas que ajudem a organizar a onda de dados que atinge diariamente as empresas, mas também melhorar interações com clientes ou o público-alvo de campanhas de marketing em redes sociais, e-mails ou no WhatsApp.
Salles acredita que um gerenciamento adequado de dados é "um desafio", mas traz vantagens: "Se você conhece o comportamento do consumidor na plataforma, usa esses dados a seu favor, mas também a favor do próprio cliente. A empresa quer comunicar algo que o consumidor tem interesse, um serviço, uma facilidade. Nós lançamos agora o serviço pet, mas como comunicar o cliente sobre isso? A gente consegue ver pelo comportamento se ele usa hoje recursos para pets, então orienta se vamos ou não divulgar o serviço pra ele".
O essencial, defende a executiva, é saber integrar as informações que são obtidas em diferentes canais, tornando a comunicação com o cliente - da resolução de problemas a oferta de produtos - mais eficiente e precisa e criando uma "visão 360" sobre ele. "A ideia é sempre que o cliente tenha a melhor experiência, com a gente mesclando as informações que fazem sentido para o momento de vida dele".
A CMO do Inter comenta que, entre as tecnologias usadas pelo banco digital com esse objetivo, está a inteligência artificial. A empresa iniciou o uso da tecnologia nos anos de 2017 e 2018, muito antes da onda atual de inteligências artificiais generativas iniciadas com o ChatGPT. O grande foco da aplicação foi em melhorar o atendimento aos clientes, focando na resolução de problemas simples.
A adoção da tecnologia se tornou necessária diante da "volumetria acelerada de clientes" conforme a base do Inter crescia, mas a eficiência dos atendimentos caía. O primeiro desafio que o banco enfrentou foi uma "fricção cultural" interna: "as pessoas acharam que seriam substituídos por robôs, então precisou de uma campanha de conscientização, informando a inserção do nosso bot, a Babi. A ideia era verem ela como uma nova colega de trabalho".
"A ideia é solucionar problemas simples, e os humanos entram como segundo nível, para problemas mais complexos, então eles entenderam que a Babi veio para complementar. A realidade agora é que, com treinamento, o bot consegue ser mais detalhistas e auxilia mais os clientes. A IA é uma solução que foi aprendendo, ficando mais eficaz, e hoje consegue resolver 60% dos problemas dos clientes sem rechamada em 3 dias", destaca a executiva.
Ela ressalta ainda que o Inter está "completamente mergulhado" nessa tecnologia. Na visão de Salles, o mais importante é "saber usar a inteligência artificial a seu favor. Isso exige criatividade, mas não vai substituir o ser humano".
O country manager da Salesforce também destaca que a adoção maior de inteligência artificial "vai trazer mais eficiência no uso das informações que tem sobre o cliente. A interação vai ficar mais precisa, veloz e com custo mais baixo. Isso vai acontecer, é quase algo dado, as pessoas vão automatizar. Mas para usar, precisa de organização de dados, uma etapa anterior em que a empresa aprendeu a trabalhar com os dados na forma correta".
Por isso, ele acredita que "algumas empresas vão conseguir fazer o salto, mas o caminho não é curto, precisa saber acumular e usar os dados". No momento, Costa avalia que as aplicações mais importantes de inteligência artificial em empresas, como no atendimento a clientes, são de "risco baixo, quase não tem". Por isso, ele acredita que "a discussão na sociedade sobre uso de IA em outras áreas tem um caráter mais amplo, que foge da aplicação corporativa no atendimento, que é o principal".
"Esses modelos de aprendizado tendem a rapidamente se multiplicar, ter muitas alternativas, uma barreira relativamente baixa, então só vai facilitar o uso por empresas, mas demanda preocupação de onde e como está sendo usado", aconselha o executivo.