Casa de câmbio: desempenho do real em relação ao dólar está melhor do que de outras moedas da América Latina até agora (Federico Parra)
Da Redação
Publicado em 23 de fevereiro de 2016 às 16h11.
São Paulo - A recuperação das contas externas no Brasil vem ajudando o real a ter desempenho melhor do que outras moedas da América Latina neste início de ano, mas essa tendência pode não durar em meio ao quadro de incertezas políticas e à profunda recessão econômica no país.
Após saltar quase 50 por cento em 2015, o dólar subiu apenas 0,05 por cento contra o real neste ano, até a véspera. Em comparação, a moeda norte-americana acumulou alta de 17 por cento contra o peso mexicano no ano passado e avanço de cerca de 5,24 por cento agora.
O mesmo ocorre no mercado colombiano, onde a divisa dos EUA saltou mais de 30 por cento em 2015 e subiu 4,28 por cento neste ano. Na América Latina, o dólar só se desvalorizou frente ao peso chileno, reflexo da recuperação dos preços do cobre frente às mínimas vistas no início do ano.
"Politicamente e fiscalmente, as coisas continuam uma bagunça. Mas, no lado da economia real, não se pode ignorar que está ocorrendo um ajuste bastante forte nas contas externas (no Brasil)", disse o gestor da Aberdeen Asset Management Viktor Szabo.
O Brasil fechou 2015 com déficit em transações correntes de 58,9 bilhões de dólares, o melhor desde 2010, segundo o Banco Central, rombo totalmente coberto pelos investimentos estrangeiros diretos no país, que somaram 75,075 bilhões de dólares no período.
Os dados da conta corrente refletem a combinação de encarecimento de bens e serviços importados devido à alta do dólar e fraqueza da demanda doméstica.
A tendência continuou no início de 2016, com o déficit em transações correntes recuando 60 por cento em janeiro. A recessão econômica e o dólar forte continuaram fazendo as importações caírem mais do que as exportações e levando brasileiros a gastarem menos em viagens lá fora.
As saídas de capitais do país vêm diminuindo, o que serve de plataforma para estabilizar o câmbio. O banco Itaú espera que essa tendência continue e apoie a recuperação da economia, com o déficit em transações correntes zerando até 2017.
"Uma vez dando suporte para o câmbio, (as contas externas) permitem uma trajetória declinante para a inflação e, portanto, vão permitir no futuro uma trajetória declinante de juros", disse o economista-chefe do Itaú, Ilan Goldfajn, em recente almoço com jornalistas.
Outro fator que explica o bom desempenho do real neste ano é o fato de que os juros altos no Brasil encarecem apostas no avanço da moeda norte-americana. Com a Selic a 14,25 por cento ao ano, fica difícil uma operação cambial bater esse rendimento.
O próprio Banco Central tem deixando claro que não vê espaço para "movimentos significativos" de depreciação cambial neste ano.
Contratos a termo de dólar --instrumento tipicamente usado para especulação ou hedge, já que não tem entrega física-- com prazo de um ano têm sido negociado perto de 4,40 reais. Ou seja, o dólar teria que subir cerca de 10 por cento nesse período para que a aposta sequer não dê prejuízo.
Em relatório, os analistas da Nomura Securities Mario Robles e João Pedro Ribeiro escreveram que esses fatores podem levar o real a continuar tendo desempenho melhor que seus pares nos próximos meses, mas ressaltaram riscos "consideráveis" relacionados ao ambiente doméstico no Brasil.
PERIGOS O cenário econômico e político do país deixa parte dos especialistas mais pessimistas. Enquanto o Nomura espera que o dólar termine o ano a 4,20 reais, o JPMorgan projeta que a moeda norte-americana deve ir a 4,70 reais no mesmo período, reflexo da piora das expectativas inflacionárias.
Para o economista para América Latina da 4Cast, Pedro Tuesta, o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff e dúvidas sobre o comprometimento do governo com o ajuste fiscal são motivos que devem fazer o dólar voltar a subir mais que seus pares.
É essa a aposta da Verde Asset Management, que afirmou em relatório que tem aproveitado a trégua no câmbio para montar posições que se beneficiam de eventual alta da moeda norte-americana.
"Nos surpreende o fato de o real ser uma das moedas de melhor performance no mundo em 2016. Acreditamos que tal fenômeno seja temporário, ainda mais dada a inflação brasileira sistematicamente mais alta que dos pares", trouxe o relatório.