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Como a Magnitsky pode penalizar bancos brasileiros? Incerteza derruba ações na bolsa

Multinacionais se veem tendo que gerir conflitos normativos, pois fora do Brasil não é necessário homologação do STJ para uma lei, como a Magnitsky

Publicado em 19 de agosto de 2025 às 16h33.

Última atualização em 19 de agosto de 2025 às 17h49.

A baixa nas ações do setor bancário nesta terça-feira, 19, contribui com a queda expressiva do Ibovespa. Uma discussão jurídica coloca os bancos, especialmente os grandes, com operações no exterior dentro de um dilema: aplicar ou não a famigerada Lei Magnitsky. Analistas (e jornalistas) bem que tentaram arrancar alguma declaração mais precisa sobre o tema dos executivos dos "bancões" nas conferências sobre os resultados trimestrais. E se o tema já era complexo - além de difícil pronúncia -, ganhou uma camada extra de "complicação" no momento em que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Flavio Dino, determinou: cidadão brasileiro em território nacional não pode ser sancionado por lei estrangeira.

Mas um analista do buy side de uma gestora de ações, ouvido por EXAME, acha difícil os bancos não seguirem a orientação vinda do exterior, sob o risco de ter "problemas muito sérios" com operações ligadas nos Estados Unidos.

"Instituições com operações ou ativos nos EUA permanecem sujeitas à legislação norte-americana. Assim, há um conflito normativo típico do direito internacional, em que a empresa precisa gerir riscos de forma diferenciada em cada jurisdição", afirma Eduardo Terashima, sócio da NHM Advogados e doutor em relações internacionais.

"As consequências podem ser severas no âmbito internacional: bloqueio de ativos em território estrangeiro, restrições de acesso a sistemas de pagamento em dólar e aumento do custo de captação no exterior", complementa. Terashima lembra um episódio de 2014, quando o BNP Paribas foi condenado pelos tribunais americanos por operar transações com países sob sanções econômicas dos Estados Unidos: Cuba, Irã e Sudão. O banco francês pagou uma multa de US$ 8,9 bilhões à época.

Territorialidade relativa

Apesar do princípio de territorialidade estabelecer que cada a empresa obedece à legislação do país onde atua, as multinacionais se veem tendo que gerir conflitos normativos, pois fora do Brasil não é necessário homologação do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para uma lei, como a Magnitsky, ser aplicada. "O desafio para multinacionais é gerir esses conflitos normativos, avaliando riscos econômicos e jurídicos de cada cenário", conclui Terashima.

O advogado criminalista Antônio Gonçalves afirma que os bancos não podem ser sancionados por cumprir a legislação brasileira. "O governo norte-americano só pode ter acesso a movimentações dentro do Brasil, mediante requisição por uma ação judicial, o que não existe até agora", afirma.

Por outro lado, Fabrício Bertini Pasquot Polido, sócio do L.O. Baptista, sanções podem encontrar, sim, uma "brecha" nas operações em dólar. "Não por uma falha ou descumprimento da decisão do STF, mas pela natureza extraterritorial das sanções americanas e pela dependência global do dólar", explica.

"Bancos brasileiros que prestarem serviços (incluindo operações em dólar e serviços de câmbio) para pessoas sancionadas pela Lei Magnitsky correm o risco de sofrer sanções secundárias dos EUA, independentemente da decisão do STF", complementa.

Ações preventivas

Segundo apuração da jornalista Mônica Bergamo, para Folha de São Paulo, ministros do STF teriam sido aconselhados por bancos públicos e privados a abrir contas em cooperativas de crédito para se proteger de possíveis sanções - caso a Magnitsky seja aplicada a outras togas, além do ministro Alexandre de Moraes. Os magistrados recebem salários pelo Banco do Brasil que, de acordo com dados do Banco Central, possui atividades em quatro cidades dos Estados Unidos. Os ministros, segundo a reportagem, não teriam gostado da ideia.

A reportagem entrou em contato com a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), que não se pronunciou sobre o tema até o fechamento da reportagem. O Banco do Brasil, por sua vez, enviou a seguinte nota:

O Banco do Brasil atua em plena conformidade à legislação brasileira, às normas dos mais de 20 países onde está presente e aos padrões internacionais que regem o sistema financeiro. Com mais de 80 anos de atuação no exterior, a instituição acumula sólida experiência em relações internacionais e está preparada para lidar com temas complexos e sensíveis que envolvem regulamentações globais. O Banco sempre acompanha esses assuntos com atenção e conta com assessoramento jurídico especializado para garantir atuação alinhada às melhores práticas de governança, integridade e segurança financeira.

O BB reforça o compromisso em oferecer soluções responsáveis, seguras e sustentáveis para todos os seus públicos de relacionamento.

Os próximos passos dos bancos estão aberto, mas Polido acredita que há grandes chances da influência americana prevalecer.

"Na prática, muitos bancos, especialmente aqueles com operações internacionais ou que dependem fortemente de transações em dólar, tendem a priorizar o cumprimento das sanções americanas para evitar o risco de serem prejudicados em suas operações no sistema bancário global."

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