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Cinco motivos para a alta do dólar e por que deve continuar acima de R$ 5

Com alta de mais de 5% em um mês, moeda americana toca máxima de 6 meses e frustra perspectivas de desvalorização

Dólar: (halduns/Getty Images)

Dólar: (halduns/Getty Images)

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Guilherme Guilherme

Publicado em 15 de outubro de 2021 às 06h00.

Última atualização em 15 de outubro de 2021 às 08h49.

Ainda que os cálculos da maior parte do mercado indiquem que o dólar está “caro demais”, a expectativa sobre a queda da moeda americana vem se reduzindo. 

Segundo o último boletim Focus, o consenso de economistas para o preço do dólar no fim do ano mudou pela primeira vez depois de um mês, passando de 5,20 para 5,25 reais.

Os ajustes de estimativas ocorrem em meio à sequência de altas que levaram a moeda americana a bater seu maior patamar em seis meses nesta semana. A apreciação do dólar, que chegou a mais de 5% nos últimos 30 dias, só foi freada após a atuação do Banco Central, que vendeu 1 bilhão de dólares por meio de instrumentos de mercado na última quarta-feira, 13.

Acima das projeções de economistas, o dólar, hoje, cotado na casa dos 5,50 reais, está mais próximo de seu maior patamar do ano, de 5,75 reais, do que de seu menor, de 4,90 reais. 

Uma das casas que, recentemente, alteraram suas estimativas para moeda é a Necton. Primeira colocada do ranking Focus de câmbio para o curto prazo, a corretora elevou sua projeção para o dólar de 5,30 para 5,40 reais até o fim do ano. 

O BNP Paribas, primeiro lugar do ranking Focus de câmbio para o médio prazo de 2019, foi outro a alterar suas projeções. No início do ano, o banco francês via grandes chances de a moeda americana fechar 2021 abaixo de 5 reais. Hoje, a perspectiva é de que o dólar permaneça mais forte no Brasil e no mundo.

1 - Efeito Fed

Presidente do Fed, Jerome Powell

Jerome Powell: presidente do Federal Reserve (Andrew Harrer/Bloomberg)

O que mudou de lá para cá foi a percepção sobre o aperto monetário do Federal Reserve (Fed), que, devido à inflação mais persistente do que o esperado, ocorrerá mais cedo do que o esperado. 

Segundo a ata da última reunião do Fed, divulgada na quarta-feira, 13, o tapering ainda neste ano. Ou seja, os 120 bilhões dólares mensais que o Fed vinha injetando no mercado de títulos se reduzirá a zero. A expectativa é de que o processo de retirada de estímulos inicie já no próximo mês e termine em meados do ano que vem.

Para o economista do BNP Paribas Luca Maia, esse tem sido o principal gatilho para a valorização do dólar no mundo. E a dinâmica, segundo ele, deve permanecer por mais algum tempo. “Historicamente, em períodos de tapering, praticamente todos os ativos emergentes [como bolsa e moedas] costumam apresentar forte desvalorização. É uma menor oferta de dólar”, afirma. 

Mas antes mesmo de o Fed retirar os estímulos e subir a taxa de juros, o mercado vem se antecipando ao movimento, elevando os rendimentos dos títulos americanos (treasuries), considerados os mais seguros do mundo. No início da semana, os títulos com vencimento em 10 anos bateram 1,6% de rendimento, o maior patamar desde maio. Mas já tem títulos, como o de 2 e 5 anos, com pagamentos só vistos antes da pandemia. 

O movimento tem apreciado o dólar no mundo inteiro. O índice Dxy, que mede a variação da moeda americana contra uma cesta de divisas desenvolvidas, como o euro, a libra e o iene, está próximo do maior patamar em 14 meses. 

 “Quanto maior a expectativa de que os treasuries vão subir, mais força o dólar deve ganhar. Os Estados Unidos estão voltando a ser horizonte de investimento em renda fixa”, comenta Jefferson Laatus, sócio-fundador e estrategista-chefe do Grupo Laatus. “O tapering já está dado, a preocupação agora é se o Fed vai subir os juros mais cedo.”

2 - Atuação do BC

Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central. Janeiro de 2020

Roberto Campos Neto: presidente do Banco Central (Andre Coelho/Bloomberg)

Embora tenha se valorizado no resto do mundo, o dólar subiu ainda mais no Brasil. Enquanto o real acumula perdas de mais de 5% nos últimos 30 dias, o peso mexicano e o rand sul-africano se desvalorizaram menos de 3,5%. Parte dessa diferença, segundo Luca Maia, se deve à atuação menos agressiva do Banco Central.

Diante das pressões inflacionárias elevadas e temores sobre efeitos da crise hídrica, o mercado esperava uma elevação de 150 pontos base (bps) para a última reunião do Copom. A expectativa, no entanto, foi esvaziada, após o presidente do BC, Roberto Campos Neto, admitir, uma semana antes da decisão, que iria manter “o plano de voo”. Ou seja, subiria em apenas 100 bps, na mesma magnitude do ajuste anterior, como já havia sinalizado. 

Desde então, o dólar, que estava próximo de 5,20 reais, subiu 30 centavos. A mudança de estratégia do BC, que chegou a subir os juros mais do que o esperado no início do ciclo de alta, decepcionou parte do mercado

“Acreditávamos que a normalização de juros seria mais rápida. Temos uma visão positiva para o real, mas com menor convicção dada essa mudança do BC”, diz Maia. “Mas acredito que ainda há tempo de ele ajustar essa postura.” Sinal de uma possível alteração, segundo Maia, se mostrou presente nesta semana, com a venda bilionária de dólares do BC

“Essa intervenção do BC começa a colocar uma pulga atrás da orelha de investidores locais e internacionais que estão querendo comprar dólar. Eles vão ter que pagar um carrego negativo e ainda tem o risco de atuação do BC”, diz Maia. “Porém, é difícil o BC lutar contra a alta estrutural da moeda americana.” 

3 - Commodities

Minério de ferro no Porto do Itaqui, no Maranhão (Alex Tauber/Pulsar)

Apesar das commodities seguirem em patamares elevados, a alta não ocorreu como o esperado por parte dos investidores, que já vislumbravam um possível “supercíclo”. Maia recorda que o dólar tocou sua menor cotação no Brasil justamente quando o minério estava próximo das máximas de 200 dólares por tonelada. 

“Há duas semanas, o preço do minério ficou abaixo de 95 e vem se estabilizando em 130 dólares. Ainda assim, houve uma mudança grande no preço de commodities industriais”, diz o economista. Segundo ele, esta variável deve ser uma das principais responsáveis por determinar o preço do dólar nos próximos meses. 

Apesar dos preços acima do patamar histórico, as perspectivas para o minério de ferro tem se alterado com piora de percepção sobre a economia chinesa, em especial sobre a demanda de aço por parte da construção civil, com a crise desencadeada pela Evergrande

4 - Fantasma fiscal 

Ministro da Economia, Paulo Guedes

Paulo Guedes: ministro da Economia (Isac Nóbrega/PR/Flickr)

Os fiscais seguem presentes nas mesas de negociações do país. Para Jefferson Laatus, a queda de popularização do presidente Jair Bolsonaro pode ser um gatilho para a piora das contas do governo. 

“Há duas formas de ganhar popularidade, gerando emprego para que a população tenha renda ou gerando renda direta por programas sociais. Mas o governo não tem verba para financiar o aumento do Bolsa Família, que geraria popularidade”, comenta Laatus. “Esse risco fiscal acaba afastando investidores do país e faz o dólar subir.”

5 - Eleição bipolar

Lula x Bolsonaro (Fotos: Charles Platiau/Reuters e Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Se as projeções para o dólar não são positivas para este ano, para o 2022 o cenário esperado não é dos melhores. Com eleições se aproximando, investidores temem por impactos negativos de uma polarização do pleito entre o presidente Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva

“Isso tende a chacoalhar muito. A expectativa é de que a eleição seja apertada. Então, teremos muita volatilidade e dólar alto, principalmente se, no ano que vem, o Lula se mostrar à frente nas pesquisas. Uma terceira via seria a melhor opção”, comenta Laatus. "É muito difícil termos um dólar abaixo de 5 reais neste ano e ainda mais no ano que vem”, afirma.

Para o BNP, o dólar deve fechar 2022 abaixo de 5 reais, mas a queda é esperada somente para depois das eleições. “Historicamente, há maior volatilidade entre os meses de julho e setembro de anos de eleição. Deve haver impacto no câmbio, com a alta do dólar.”

 

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