Martin Jaco, CEO da BR Properties: empresa de propriedades irá concentrar investimentos no segmento de logística no interior de São Paulo, em Jarinú e Cajamar | Foto: Leandro Fonseca/EXAME (Leandro Fonseca/Exame)
Marília Almeida
Publicado em 5 de dezembro de 2021 às 08h10.
Última atualização em 5 de dezembro de 2021 às 08h17.
A pandemia chegou no começo de 2020 em um momento de mudanças para a BR Properties (BRPR3). A empresa de propriedades comerciais para renda por meio de aluguel havia decidido mudar radicalmente seu portfólio para se concentrar em ativos triple A, os mais valiosos do mercado imobiliário, com oferta de serviços e transporte público no entorno. Essa grande mudança se encerrou justamente no fim de 2019, com a venda de muitos escritórios menores, em regiões de categoria B, descentralizadas.
O movimento deixou a empresa preparada para enfrentar o teste da crise que viria poucos meses depois, provocada pela pandemia. Como resultado, seus imóveis corporativos já registram uma ocupação mais alta do que no início da crise, diferentemente de ativos em regiões B, que continuam a sofrer com taxas de vacância mais elevadas, disse o CEO da BR Properties, Martin Jaco, à EXAME Invest..
"Pagamos mais caro pelos ativos, mas atendo meus inquilinos e estou melhor posicionado agora. Esse nicho de mercado tem maior absorção. Os inquilinos percebem que não podem sair dali porque o dia em que quiserem voltar talvez não haja edifícios disponíveis."
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Diante de bons resultados, a companhia se prepara para colocar o pé novamente no segmento de logística, além de reforçar a operação com o primeiro fundo imobiliário aberto ao mercado. Veja abaixo a entrevista completa de Martin Jaco para a EXAME Invest:
A BR Properties aponta no balanço que a taxa de vacância financeira está em 20,7%. Já recuperou o índice pré-pandemia?
No segmento de logística temos quase 100% de ocupação e conseguimos esse número durante a pandemia. Ou seja, essa questão está bem resolvida.
Já em relação aos escritórios, tanto a nossa vacância física quanto financeira são menores do que as que tínhamos no período pré-pandemia. Ou seja, houve mais locações que devoluções. Continuamos com um portfólio saudável por causa do nosso posicionamento no segmento triple A.
Nossa vacância física é de certa de 15%, excluindo o Parque da Cidade, que é um empreendimento novo, aberto para locação desde o início do ano. Mas temos alugado cada vez mais rápido. Temos 24 meses para atingir 80% da ocupação. Já atingimos 20% do total.
Em São Paulo, em regiões como Jardins e Avenida Juscelino Kubistchek, quase todos os imóveis estão ocupados. Na Marginal Pinheiros, a ocupação também está alta em edifícios como Rochaverá e MTC Morumbi. Para 2022, há uma tendência de pressão dos valores porque não existem muitas entregas previstas nos próximos anos.
O mercado do Rio de Janeiro está se recuperando, mas tem defasagem em relação a São Paulo: o estoque é antigo e tem qualidade inferior. Além disso, é mais difícil construir no centro.
A empresa está voltando a apostar no mercado de logística. Não acredita que haja uma sobreoferta?
Já fomos grandes no segmento de logística, que chegou a representar 15% do nosso portfólio. Hoje, representa 5%, mas desde 2016 voltamos a investir, com outro foco. Resolvemos nos concentrar em Jarinú, que tem valor nacional e regional no segmento, e Cajamar, onde ficam os centros de distribuição da Grande São Paulo e para a qual prevemos demanda duradoura. Somos conservadores. Não vamos tomar risco de localização. Estamos entrando onde o mercado está consolidado.
Acreditamos que se construirmos o produto certo nessas regiões não haverá superoferta. Por isso, em setembro a companhia fez um contrato de permuta, visando a aquisição de terreno em Cajamar para o desenvolvimento de um projeto logístico de aproximadamente 150 mil metros quadrados de área bruta locável (ABL), em área adjacente ao “Projeto Cajamar I”.
Serão construídos dois condomínios logísticos (“Projeto Cajamar II”), que serão compostos por quatro galpões no total. Após a conclusão da construção, a companhia será proprietária de 67% do empreendimento, com aproximadamente 100.500 metros quadrados.
Acreditamos que o mercado de logística não será mais regido por ciclos. Houve uma mudança cultural. Muita gente entendeu o e-commerce porque foi obrigada a utilizá-lo na pandemia. Isso trouxe uma necessidade logística que demoraria 20 anos para chegar. Há uma cadeia inteira para ser desenvolvida, e esse ciclo vai durar alguns anos.
Como o primeiro fundo imobiliário vai reforçar a operação da companhia? Em que timing entram, e por quê?
A oferta está aberta e vamos finalizá-la quando o mercado for mais favorável. Não sabemos quando e não temos pressa. É um mercado que estudamos há muito tempo, uma continuidade do que fazemos e que tem um benefício claro para a companhia e seus acionistas.
Nós compramos imóveis que têm potencial de valorização e nossos resultados têm sido bons. Conseguimos alugar, fazemos reformas e consolidamos as propriedades. Depois, faz parte do nosso plano vender o ativo para obter o resultado desse investimento e distribuir dividendos aos acionistas ou realizarmos novos investimentos.
Quando tivermos um fundo imobiliário próprio ,poderemos fazer essas movimentações por meio do produto e continuarmos a fazer a gestão do ativo. Isso será importante para o cotista: a gestão de contratos não passará por outra empresa.
Pretendemos entregar um produto em que haja alinhamento de interesses entre gestor e cotista. Vamos colocar pedaços de ativos consolidados no fundo, enquanto outras frações continuam na companhia. Se alocarmos errado, vamos nos dar mal também.
Continuaríamos com o imóvel dentro desse fundo com o mesmo ponto de vista que temos sobre os nossos investimentos: quando for a hora de vender, iremos vender. Quando for a hora de aumentar o fundo, iremos aumentar. E não teremos apenas ativos nossos. Podemos participar de outros investimentos no mercado.
Já tivemos vários fundos imobiliários próprios, mas que não abrimos ao mercado. Fomos reciclando, mudamos a nossa estrutura societária para trazê-los para dentro da holding até que vendemos os ativos. Portanto, essa estrutura é familiar para nós.
O cenário agora está repleto de incertezas. Mas, por outro lado, o investidor de FIIs está mais maduro do que há dois anos. Isso está bem equacionado ou preocupa o nível de maturidade do mercado?
Pelo contrário. Se olhássemos há cinco, dez anos, o mercado era muito mais imaturo. Hoje, pela quantidade de pessoas que atuam no mercado, a quantidade de fundos, a quantidade de cobertura que é feita, a existência de clubes, a pessoa física tem mais informação, mais acesso.
O investidor está preparado para discussões mais profundas, que vão além da rentabilidade. Precisa olhar ativos que estão por trás do produto, a estratégia do gestor, os ciclos do mercado (em que ponto estão entrando).
O que o senhor espera para o cenário macroeconômico em 2022?
Os fundamentos do mercado imobiliário são claros. Estamos saindo de patamares baixos em relação a valores de locação e teremos uma oferta de imóveis muito restrita daqui para a frente. Vamos ter um número menor de edifícios sendo entregue nos próximos anos. A demanda irá crescer, e a oferta será menor.
Claro que temos de pesar também os fundamentos do país. Será um ano de eleição e alta de taxas de juros, que influenciam a velocidade de tomada de decisão das companhias. Pode ser que algumas delas se questionem se é hora de mudar de escritórios e resolvam esperar mais seis meses. Mas teremos uma recuperação. Essa recuperação pode ser mais rápida ou lenta. Mas vamos ter. Em um ambiente de juros altos, talvez seja a hora de a companhia pagar mais dívida e ter um menor custo financeiro.
Os inquilinos continuarão a valorizar a qualidade técnica das edificações, além de serviço e transporte público no entorno. Mesmo quem precisar de menos espaço irá buscar imóveis em regiões A, onde atuamos. Quem ocupa hoje 10.000 metros quadrados em um prédio descentralizado talvez agora, em um regime híbrido, perceba que precise de 6.000 metros quadrados e posso migrar para mercado de maior qualidade, que é o A. Neste exemplo, o A ganha 6.000 metros quadrados, enquanto o B perde.
O que norteou aquisições e vendas recentes da BR Properties e o que norteará daqui para a frente?
Sempre nos vimos como um investidor com viés oportunístico. Não temos um volume de recurso obrigatório que devemos investir em determinado período, como as empresas de private equity, e não precisamos devolver o dinheiro ao cotista para sairmos dos investimentos. Os melhores investimentos são feitos com flexibilidade, na hora correta de entrada e saída.
Os nossos investimentos buscam valor agregado. Não é negócio para nós que os ativos paguem renda direta, como os FIIs no começo. E os negócios não precisam estar redondos. Precisamos entender o ciclo no qual entramos e então entrar conscientemente, sabendo se o imóvel tem potencial para retrofit, renegociação de contratos, e como podemos extrair valor dele. Até que a receita fique estabilizada e realizamos a saída.
Fizemos três vendas recentes de ativos que se consolidaram do ponto de vista de valor máximo. Nelas tivemos retorno de 51% em um ano de crise.
No terceiro trimestre, concluímos a venda de 20% da fração ideal do imóvel “Complexo JK – Torre B” pelo preço total de 184,7 milhões de reais, ou 30.150 reais por m² de ABL, correspondente a um prêmio de 6% acima do valor registrado da propriedade.
Em agosto, vendemos para o fundo VBI Logístico um galpão em desenvolvimento, com ABL de 35.690 m², que faz parte do empreendimento “Projeto Cajamar I”. A alienação corresponde a aproximadamente 24% da área total locável do empreendimento de 149.525 m². O custo total de desenvolvimento do empreendimento, incluindo o terreno, foi de 2.508 reais por m², correspondente a um prêmio de 38% acima do valor registrado da propriedade.
Também concluímos a venda do “Galpão Tucano”, localizado no complexo Brazilian Business Park (BBP), com área bruta locável (ABL) de 31.718 m², pelo preço total de 94 milhões de reais, 5% acima do valor registrado no balanço.
A ação da BR Properties tem queda de cerca de 25% no ano, enquanto o Ibovespa recua perto de 12%. O que explica o desempenho?
Há poucas empresas na bolsa com as quais podemos nos comparar. Alguns analistas acabam nos comparando com administradoras de shoppings. Mas temos DNA diferente. Em um momento de inflação e juros altos, ficamos todos no mesmo bolo.
Pelo menos uma vez por ano ajustamos o valor de mercado das nossas propriedades, tanto para cima como para baixo. Hoje, o valor de nossas propriedades menos a dívida líquida faria a ação valer 15 reais, e não 7 reais. Como vendemos recentemente nossas propriedades por preço do balanço ou até acima, acreditamos que a precificação não faz sentido.
Qual foi o impacto da alta do IGP-M no portfólio da companhia?
A inflação é indiferente para a empresa. Deixamos a mudança do indexador a critério do inquilino. Alguns quiseram migrar contratos novos para o IPCA, e outros, na renegociação, quiseram mudar o índice, do IGP-M para o IPCA. Se o inquilino ficar mais confortável com a mudança, fazemos. O importante é que o contrato seja indexado.
Conseguimos repassar grande parte da alta do índice porque o segmento corporativo vinha com preços de locação inferiores aos da média histórica. Como mudamos nosso portfólio em 2016, quando o país passava por uma crise séria, os preços de locação foram baixos. Até 2020 os contratos ainda não tinham sido revistos. Portanto a inflação apenas os aproximou do valor de mercado atual.
Quando renegociamos um contrato de aluguel não estamos falando apenas sobre valor, mas também de índices aplicados, duração e garantias do contrato. Não vou aplicar a variação toda do IGP-M, mas posso aumentar o tempo do aluguel para cinco anos, manter garantias e, dessa forma, melhorar a qualidade do contrato. Alongar contratos traz maior estabilidade de receita. Isso demonstra a qualidade da gestão, que o cotista tem de analisar.