Black Friday: juros mais altos desde a primeira edição no Brasil (Leandro Fonseca/Exame)
Repórter
Publicado em 26 de novembro de 2025 às 05h30.
Com os juros mais altos desde sua popularização no Brasil, em 2010, a Black Friday de 2025 chega em um ambiente que, em teoria, deveria frear o consumo. Mas as projeções para a data até o momento mostram que as vendas devem bater um recorde, segundo diferentes entidades.
A Neotrust, que monitora transações reais de 80 milhões de consumidores em sete mil lojas online, estima, por exemplo, um faturamento de R$ 11 bilhões entre esta quinta-feira, 26, e domingo, 30, uma alta de 17% na comparação anual, com destaque para categorias como saúde, esporte e lazer, automotivo e beleza.
Já a Associação Brasileira de Inteligência Artificial de E-commerce (Abiacom) prevê que o comércio eletrônico brasileiro movimente R$ 13,34 bilhões durante essa semana. O valor também representa um crescimento de 14,74% em relação ao ano passado, quando o setor registrou R$ 11,63 bilhões em vendas.
O desempenho surpreende porque esta será a Black Friday com a taxa básica de juros, a Selic, mais alta da história do evento no Brasil, em 15% ao ano — o maior patamar desde 2006.
Mesmo em meio a um ambiente de juros elevados, parte da estratégia do Banco Central para conter a inflação, o varejo online já somou R$ 29 bilhões entre 1º e 21 de novembro deste ano, avanço de 32% frente ao mesmo período de 2024. No acumulado do ano, o setor cresceu 18%.
A explicação para esse aparente paradoxo passa pelo comportamento do consumidor. Uma pesquisa do Instituto Locomotiva e QuestionPro, com 1.500 entrevistas de todo o país, indica que o brasileiro chega à Black Friday deste ano mais racional, planejado e experiente do que nunca.
Oito em cada dez conhecem e já compraram na data, sendo que 72% monitoram previamente os preços e 75% pesquisam antes de comprar. Além disso, ao menos 69% dão preferência a marcas que já conhecem.
Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva, observa que essa maturidade não nasce dos juros, mas da experiência acumulada. "O consumidor passou a ser mais planejado porque o dinheiro continua sendo difícil de ser conquistado", diz.
"Ele está mais experiente e calejado. A Black Friday não é mais uma novidade no Brasil, está entre as principais datas do varejo. E essa é talvez a primeira Black Friday de recuperação de economia e com pleno emprego, e o consumidor quer fazer valer ao máximo esse período. Ele não cai mais na black 'fraude', no 'tudo pela metade do dobro'. Ele está acompanhando a variação de preço", afirma Meirelles.
Os juros altos, contudo, seguem sendo o principal freio. A Selic elevada não aparece de imediato na compra parcelada sem juros, mas pesa quando há atraso ou estouro do orçamento, e é ai, segundo o especialista, que o consumidor percebe o maior patamar de juros em 19 anos.
Apesar disso, quando as promoções são reais na Black Friday, o gasto ainda faz sentido mesmo para o consumidor que hoje está mais maduro. Isso porque a sexta-feira funciona, na cabeça das pessoas, como uma espécie de "licença poética para consumir", diz o presidente do instituto, em um momento do ano em que esse desembolso é quase "justificável".
A pesquisa mostra que os brasileiros têm cada vez mais esperado por esse período e guardado dinheiro para conseguir oportunidades que não aparecem no dia a dia. "Nesse época da Black Friday ele fala: agora eu estou fazendo o meu dinheiro render mais. Porque para o consumidor brasileiro, em especial o consumidor da classe C, comprar com desconto é uma forma de investimento financeiro", afirma.
O Locomotiva também mostra que roupas, acessórios e beleza lideram o desejo de compra e que a preocupação com golpes reforça a busca por reputação das lojas, assim como mulheres e famílias com filhos são as que mais usam a data para antecipar compras de Natal.
A Abiacom também confirma essa tendência e aponta que novembro consolidou-se como uma data estendida de promoções, o que inclui fenômenos como o 11/11, cada vez mais relevante.
Essa antecipação aparece também nos dados analisados pelo BTG Pactual (do mesmo grupo controlador da EXAME). O banco aponta que, até 20 de novembro, o volume de vendas online cresceu 27% no mês, e quase 40% em faturamento, impulsionado pela disputa acirrada entre grandes plataformas.
Só no 11/11, por exemplo, o volume de pedidos online saltou 65% em relação ao ano passado. O que também levanta dúvidas sobre possível impacto nas vendas de Natal e até na Black Friday, segundo analistas do BTG.
Para dar conta dessa edição que promete ser histórica, o Mercado Livre lançou R$ 100 milhões em cupons, frete grátis e parcelamento em até 21 vezes sem juros via Mercado Pago. A Amazon expandiu em 20% seu portfólio internacional e intensificou incentivos a sellers.
Já a Shopee reforçou centros de distribuição e ampliou programas de fidelidade, enquanto a Shein diversificou categorias e reduziu comissões para atrair vendedores. O BTG aponta que essa corrida eleva volumes, mas pode pressionar as margens dessas empresas, como já indicado por analistas que acompanham o setor.