A agência de classificação de risco Standard and Poor's: atualmente, o Brasil é classificado em "BBB-" pela Standard & Poor's (Eric Piermont/AFP)
Da Redação
Publicado em 20 de fevereiro de 2015 às 15h45.
São Paulo - Os ativos financeiros brasileiros têm sido negociados a preços que sugerem que o país caminha para perder seu cobiçado grau de investimento neste ano, mas poucos analistas acreditam que esse cenário deve se concretizar, o que abre espaço para uma correção nos mercados no futuro.
Segundo gestores, economistas e estrategistas consultados pela Reuters, os esforços da equipe econômica chefiada pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, para limpar as contas públicas devem servir de escudo para o Brasil frente às agências de classificação de risco.
Atualmente, o Brasil é classificado em "BBB-" pela Standard & Poor's, com perspectiva estável, o que significa que o país precisaria ser rebaixado em apenas um degrau para perder seu grau de investimento.
Já a Moody's e a Fitch classificam o país em "Baa2" (perspectiva negativa) e "BBB" (perspectiva estável), respectivamente, dois degraus acima do grau especulativo.
Apesar de o país ainda ser considerado "grau de investimento", os ativos brasileiros têm sido negociados a preços mais condizentes com classificações mais baixas.
O diferencial entre os rendimentos de títulos brasileiros em moeda estrangeira e os papéis do Tesouro dos Estados Unidos estava em 279 pontos básicos, segundo o índice EMBI Global do JPMorgan. O número supera o spread de 200 pontos básicos para a Guatemala e 275 pontos para o Paraguai, ambos classificados em "BB" pela S&P. Já o dado para a Colômbia, que tem rating "BBB" pela S&P, marcava 204 pontos básicos.
Segundo analistas, a disparidade reflete um pacote de más notícias, começando pela deterioração dos fundamentos macroeconômicos brasileiros nos últimos anos, passando pelo escândalo bilionário de corrupção na Petrobras e chegando à crescente resistência política ao ajuste fiscal.
"Basicamente, todas as notícias ruins estão no preço", disse o gestor sênior da Aberdeen Asset Management em Londres Viktor Szabo, que ajuda a administrar mais de 12 bilhões de dólares aplicados em mercados emergentes.
Mas "contanto que Levy continue na Fazenda, é altamente improvável que haja um 'downgrade'. Essa é única graça salvadora do Brasil", acrescentou ele, que disse estar "bastante" exposto ao mercado brasileiro.
O mau humor se nota também no mercado de câmbio. Após chegar a recuar a 2,57 reais em janeiro, o dólar mudou de direção e passou a subir, acumulando alta de quase 8 por cento neste ano até 19 de fevereiro e renovando as máximas em mais de uma década.
A desconfiança foi desencadeada, entre outros fatores, por dúvidas sobre a capacidade do governo de cumprir a promessa de entregar um superávit primário equivalente a 1,2 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, com políticos mostrando resistência às medidas de contenção fiscal.
Na semana passada, a Câmara dos Deputados aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Orçamento Impositivo, que obriga o governo a pagar as emendas parlamentares individuais e ainda prevê uma destinação escalonada de recursos da União para a saúde.
"Agora sabemos que parte das medidas fiscais não vão sobreviver ao Congresso. É possível que as autoridades não consigam cumprir o que prometeram", disse o diretor de pesquisa para mercados emergentes do Goldman Sachs, Alberto Ramos.
Ele não acredita, contudo, que isso deva levar a um rebaixamento do rating do Brasil. "É mais do que o número absoluto do superávit primário. (As agências de risco) querem ver um esforço genuíno e entendem que fazer um ajuste fiscal será difícil", acrescentou.
Correção
Especialistas identificaram duas consequências para os mercados de capitais: por um lado, há espaço para uma correção dos preços dos ativos nos próximos meses; por outro, se o rebaixamento de fato ocorrer, a reação tende a ser contida.
"O Brasil é um mercado emergente bastante barato, especialmente entre seus pares em termos de ratings", disse o gestor da Acadian Asset Management Bryan Carter, em Boston. "Então o mercado provavelmente está exagerando, mas precisamos de um catalisador para acreditar nisso." Isso poderia vir sob a forma de uma melhora contínua nos resultados fiscais, após o governo não conseguir fazer economia para pagar juros da dívida em 2014 pela primeira vez em mais de dez anos.
Investidores buscarão nos próximos números sinais de que os esforços da equipe econômica do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff estão rendendo dividendos, mesmo em meio ao quadro de atividade estagnada, que limita a arrecadação tributária.
"O mercado precisará ver melhora persistente, mês a mês, no lado fiscal", disse a estrategista para a América Latina do Jefferies, Siobhan Morden, para quem o maior risco ao grau de investimento brasileiro seria a "falta de comprometimento político com o ajuste fiscal".
De qualquer modo, se a correção dos ativos ocorrer, ela não deve vir tão cedo, não só devido à confiança abalada na política fiscal brasileira, mas também porque os problemas na Petrobras, no centro de um escândalo por sobrepreço em contratos, devem continuar fazendo investidores exigirem rendimentos maiores de ativos brasileiros.
Carter, da Acadian, baseou-se em outros casos de corrupção semelhantes em países emergentes para sustentar que o estresse com a estatal petroleira não passará logo. "O escândalo infligiu danos de longo prazo à credibilidade da companhia e do setor público brasileiro", disse ele.