O preço do metro quadrado em alguns bairros de Tóquio chegou a ficar 350 vezes superior ao de Manhattan, no coração de Nova York (DoctorEgg/Getty Images)
Agência de notícias
Publicado em 22 de fevereiro de 2024 às 12h30.
O corretor de valores Ryuta Otsuka ainda lembra da extravagância no Japão do final dos anos 1980, quando pegava táxis com notas de 10 mil ienes (66 dólares ou 325 reais na cotação atual) após noites de champanhe nos melhores bares de Tóquio.
Em uma queda brutal, a bolha especulativa estourou em 1990, levando a "décadas de perdas", estagnação e deflação no país, que então ameaçava a posição dos Estados Unidos como maior economia mundial.
Nesta quinta-feira, quase 35 anos depois, o índice Nikkei da Bolsa de Tóquio finalmente recuperou seus antigos números e superou seu recorde histórico de 29 de dezembro de 1989.
O feito lembrou os anos de bonança, embora atualmente os pequenos investidores japoneses prefiram se precaver a se render a um Porsche ou uma Ferrari.
Em 1986, em meio à esse turbilhão, Ryuta Otsuka começou sua carreira como corretor. "Meus colegas mais experientes me levavam para jantar nos locais da moda", conta quase quatro décadas depois.
À meia-noite "começava a luta por um táxi: não conseguia parar um se não mostrasse uma nota de 10 mil ienes", o equivalente a cerca de 66 dólares na atualidade (325 reais).
O preço do metro quadrado em alguns bairros de Tóquio chegou a ficar 350 vezes superior ao de Manhattan, no coração de Nova York.
Os preços dos carros de luxo estavam nas nuvens assim como associar-se a um clube de golfe.
Os investidores japoneses se lançaram também no mercado da arte. Um empresário chegou a comprar obras de Van Gogh e Renoir a preços recordes com a intenção de cremar seu corpo ao lado delas quando morresse.
Os profissionais de finanças vibravam com o desempenho das ações, lembra Otsuka, agora com cerca de sessenta anos.
Alguns de seus colegas, que ganhavam comissões, "transportavam seus salários em caixas de papelão cheias de maços de dinheiro".
Tudo ruiu em janeiro de 1990: a Nikkei e o mercado imobiliário despencaram.
A economia ficou estagnada em deflação por décadas e mergulhou em um círculo vicioso: a queda dos preços fez com que os salários e as contratações caíssem, enfraquecendo o poder de compra das famílias.
Muitos japoneses optaram por colocar as suas poupanças em contas bancárias normais, em vez de investir em ativos de risco, como ações.
A política monetária ultraflexível do Banco do Japão, com taxas de juros perto de zero por uma década, não foi suficiente para reverter a tendência.
Mas novos ventos sopram no Japão desde 2022. A inflação acelerou acima dos 2%, obrigando as empresas a aumentar os salários e levando o Banco Central a um ligeiro aumento das taxas de juros, o primeiro desde 2007.
O crescimento econômico ainda é moderado, 1,9% em 2023, com uma recessão no segundo trimestre.
O interesse pelo mercado de ações aumenta entre os japoneses, mas está longe do entusiasmo da década de 1980.
"Só quem tem recursos financeiros pode investir", afirma Asuka Sakamoto, economista-chefe da Mizuho Research & Technologies.
"Por isso é extremamente importante aumentar os salários" para evitar um crescente abismo entre os ricos e os assalariados no Japão.