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Curva de Phillips: o que é e como funciona

Entenda a Curva de Phillips, sua origem, aplicações na economia, relação entre desemprego e inflação e impactos para os investimentos no Brasil

A história começa em 1958, quando o economista neozelandês William Phillips analisou quase 100 anos de dados econômicos do Reino Unido. (Jonathan Kitchen/Getty Images)

A história começa em 1958, quando o economista neozelandês William Phillips analisou quase 100 anos de dados econômicos do Reino Unido. (Jonathan Kitchen/Getty Images)

Luanda Moraes
Luanda Moraes

Colaboradora

Publicado em 4 de outubro de 2025 às 12h00.

Quando o governo anuncia que o desemprego caiu para níveis históricos, investidores experientes já começam a se preparar para o próximo movimento do Banco Central. A razão está em uma teoria econômica desenvolvida há mais de 60 anos que continua influenciando decisões de investimento em todo o mundo.

Conhecida como Curva de Phillips, essa teoria sugere que existe uma relação direta entre o nível de emprego em um país e a pressão sobre os preços. Abaixo, entenda como essa ideia funciona na prática, quais as experiências do passado, e as consequências que caminham lado a lado com essa premissa.

O que é a Curva de Phillips?

A Curva de Phillips é um conceito econômico que mostra como a inflação e o desemprego se relacionam de forma inversa em uma economia. Basicamente, quando muitas pessoas estão empregadas, os preços tendem a subir. Quando o desemprego aumenta, a pressão sobre os preços diminui.

Essa relação acontece porque, em momentos de pleno emprego, as empresas precisam disputar trabalhadores escassos oferecendo salários maiores. Esses custos extras acabam sendo repassados aos produtos e serviços, gerando inflação. Por outro lado, quando há muitos desempregados, as empresas não precisam aumentar salários para atrair funcionários, mantendo os preços mais estáveis.

Origem e histórico da teoria

A história começa em 1958, quando o economista neozelandês William Phillips analisou quase 100 anos de dados econômicos do Reino Unido. Na época, ele descobriu um padrão consistente que apontava que nos períodos em que o desemprego estava baixo, os salários subiam rapidamente, e quando o desemprego aumentava, os salários ficavam praticamente parados.

Nos anos 1960, dois economistas americanos, Paul Samuelson e Robert Solow, adaptaram a ideia de Phillips. Em vez de olhar apenas para salários, eles analisaram a inflação geral de preços. A descoberta foi similar e revolucionou a forma como os governos pensavam sobre política econômica.

Durante décadas, políticos acreditaram que poderiam escolher entre ter mais empregos com inflação mais alta ou menos inflação aceitando mais desemprego. Essa visão simplista funcionou até os anos 1970, quando a crise do petróleo desafiou a teoria.

Como funciona a Curva de Phillips na prática

Imagine uma cidade onde todas as empresas estão contratando e há poucos trabalhadores disponíveis. As empresas começam a oferecer salários cada vez maiores para atrair funcionários. Com mais dinheiro no bolso, as pessoas consomem mais, e as lojas aproveitam para aumentar os preços.

Agora pense no cenário oposto, com muitas pessoas desempregadas e poucas vagas. As empresas podem pagar salários menores porque há fila de candidatos. Sendo assim, com menos dinheiro circulando, o comércio não consegue subir preços porque as pessoas compram menos.

Essa relação de inflação e desemprego é observada de perto pelos bancos centrais do mundo todo para decidir se devem subir ou baixar os juros. Quando o desemprego está muito baixo e a inflação começa a acelerar, geralmente os juros sobem para esfriar a economia.

O que é inflação e o que a provoca

Antes de continuar, é importante entender o que é inflação. De forma simples, inflação é quando os preços sobem de forma generalizada e contínua. Não é apenas o tomate ficando mais caro numa semana, mas sim a maioria dos produtos e serviços aumentando mês após mês.

As causas da inflação são variadas, sendo a mais comum o excesso de demanda — quando as pessoas querem comprar mais do que as empresas conseguem produzir.

Outra causa importante são os choques de oferta. Quando o preço do petróleo dispara ou quando uma safra de café é prejudicada por geadas, os custos de produção sobem e são repassados ao consumidor final.

Relação entre desemprego e inflação

A relação entre desemprego e inflação não é uma regra matemática exata. Em economias modernas, diversos fatores complicam essa relação. A globalização, por exemplo, permite importar produtos baratos mesmo quando o emprego local está alto, segurando a inflação.

A tecnologia também mudou o jogo. Aplicativos de entrega criaram milhares de empregos, mas como são trabalhos precários com remuneração baixa, não pressionam salários como empregos tradicionais fariam. Isso pode explicar por que alguns países conseguem manter o desemprego baixo sem disparar a inflação.

Outro complicador são as expectativas. Se trabalhadores acreditam que a inflação vai subir, pedem aumentos maiores hoje. Se conseguem, as empresas repassam o custo, criando a inflação que todos temiam. É uma profecia autorrealizável que pode acontecer mesmo com desemprego alto.

Impactos da inflação nos investimentos

Tesouro Direto

No Tesouro Direto, a inflação afeta cada título de forma diferente. Os títulos indexados ao IPCA, como o Tesouro IPCA+, protegem completamente contra a inflação, pagando a variação do índice mais uma taxa extra. Se a inflação sobe mais que o esperado, esses títulos se valorizam.

Já os títulos prefixados, como o Tesouro Prefixado, sofrem quando a inflação surpreende para cima. Se você comprou um título pagando 10% ao ano e a inflação sobe para 8%, seu ganho real cai para apenas 2%. Por isso, em momentos de incerteza inflacionária, investidores migram para títulos indexados.

LCIs e LCAs

As Letras de Crédito Imobiliário e do Agronegócio geralmente rendem um percentual do CDI, que acompanha a taxa Selic. Quando a inflação sobe, o Banco Central tende a aumentar os juros para controlá-la, beneficiando esses investimentos.

A grande vantagem é a isenção de Imposto de Renda, que torna o retorno real ainda melhor em cenários de inflação moderada. Uma LCI rendendo 90% do CDI com Selic a 12% ao ano entrega mais retorno líquido que muitos investimentos tributados.

Fundos de investimento

Os fundos multimercados são os que melhor navegam em períodos de mudança na relação inflação-desemprego. Gestores experientes ajustam rapidamente as carteiras, comprando dólar quando esperam inflação, migrando para juros quando o Banco Central deve agir, ou apostando em ações de empresas que se beneficiam do cenário.

Os fundos de renda fixa de longo prazo sofrem quando a inflação surpreende e os juros sobem, pois títulos antigos perdem valor de mercado frente aos novos papéis com taxas maiores. Já fundos de ações precisam de análise caso a caso: empresas com poder de repassar custos se saem melhor que aquelas com margens apertadas.

A Curva de Phillips aumentada de expectativa

Nos anos 1970, Milton Friedman revolucionou a teoria ao incluir as expectativas das pessoas. Ele mostrou que não adianta o governo tentar contornar o mercado, já que, se todos esperam 5% de inflação, vão agir como se ela já existisse, negociando salários e preços com base nisso.

Essa versão "aumentada" da curva explica fracassos de política econômica. Quando um governo tenta estimular a economia imprimindo dinheiro, as pessoas percebem e se protegem antecipadamente. O resultado é apenas inflação maior, sem criar empregos sólidos.

É por esse motivo que os bancos centrais hoje focam tanto em credibilidade. Quando o mercado confia que a inflação será controlada, as expectativas se mantêm baixas, facilitando o controle real dos preços.

A Curva de Phillips no curto e longo prazo

No curto prazo, a relação funciona porque preços e salários têm rigidez. Os contratos são fixos por meses, empresas não reajustam preços diariamente e trabalhadores demoram para perceber a inflação real. Essa defasagem permite que estímulos econômicos reduzam temporariamente o desemprego antes que os preços se ajustem.

No longo prazo, todos percebem e se adaptam. A economia retorna à taxa natural de desemprego (NAIRU), um nível mínimo que persiste mesmo com a economia saudável, refletindo pessoas mudando de emprego ou entrando no mercado. Forçar o desemprego abaixo desse ponto apenas acelera a inflação, pois não há mais trabalhadores disponíveis para contratar.

Complementaridade entre a Curva de Phillips e a Lei de Okun

A Lei de Okun é outra ferramenta importante que relaciona crescimento econômico com desemprego. Ela mostra que quando o PIB cresce acima de determinado nível, o desemprego cai. Quando o crescimento é fraco, o desemprego sobe.

Unindo as duas teorias, investidores conseguem prever ciclos completos. Crescimento forte reduz desemprego (Okun), que depois pressiona inflação (Phillips), levando a juros mais altos que desaceleram a economia. É um ciclo que se repete e oferece oportunidades para quem sabe identificar cada fase.

Curva de Phillips e estagflação

A estagflação é o pesadelo de qualquer economia: a inflação alta combinada com desemprego crescente e economia parada. Nos anos 1970, choques do petróleo criaram exatamente isso, desafiando a teoria tradicional da Curva de Phillips.

Para investidores, períodos de estagflação exigem estratégias especiais, pois ações caem com a economia fraca enquanto títulos sofrem com inflação alta. Commodities, ouro e investimentos no exterior costumam ser as melhores proteções nesses momentos difíceis.

Devemos imprimir dinheiro segundo a Curva de Phillips?

A pergunta sobre imprimir dinheiro é polêmica. Alguns economistas defendem que em momentos de alto desemprego, injetar mais dinheiro em circulação pode estimular a economia sem gerar muita inflação. Outros alertam que isso só funciona temporariamente e pode criar problemas maiores no futuro.

A experiência mostra que o contexto importa mais que a teoria. O Japão imprimiu dinheiro por décadas sem gerar inflação significativa devido a fatores culturais e demográficos únicos. Já países latinos-americanos viram suas moedas derreterem com políticas similares.

O consenso atual é que imprimir dinheiro pode ajudar em crises severas, mas precisa ser temporário e acompanhado de reformas estruturais. Sem aumentar a capacidade produtiva da economia, criar dinheiro apenas dilui o valor da moeda, empobrecendo quem depende de salários e aposentadorias fixas.

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