Inteligência Artificial

Médico alagoano usa luz virtual e IA para criar lente que trata catarata

Já aprovado na União Europeia, o produto, que combina diferentes tecnologias, deve começar a ser vendido no Brasil em 2025

João Marcelo Lyra: médico oftamologista e fundador da Logos Bio Science (Ovni Digital/Divulgação)

João Marcelo Lyra: médico oftamologista e fundador da Logos Bio Science (Ovni Digital/Divulgação)

André Lopes
André Lopes

Repórter

Publicado em 10 de outubro de 2024 às 16h49.

Última atualização em 10 de outubro de 2024 às 17h47.

"Pessoas do mundo todo poderão enxergar melhor graças a uma tecnologia idealizada no Brasil", conta João Marcelo Lyra, médico oftalmologista e cirurgião alagoano que desenvolveu a lente intraocular Galaxy, a primeira do mundo a adotar um design em espiral, desenvolvida em parceria com engenheiros brasileiros. O projeto, iniciado em 2019, uniu especialistas de várias áreas — inteligência artificial, física óptica e oftalmologia — para resolver um dos principais problemas das lentes multifocais tradicionais e que são instaladas por meio de cirurgia no olho dos pacientes: os efeitos colaterais visuais, como halos ao redor de luzes durante a noite, que incomodavam até 15% dos operados.

Um coração mais previsível: como será o futuro da cardiologia, segundo professor de Harvard

O desenvolvimento da Galaxy envolveu uma colaboração da empresa fundada por Lyra, a Logos Bio Science, com a empresa britânica Rayner, referência global em lentes intraoculares, o que ajudou a consolidar a lente no mercado europeu. Testada em pacientes do Reino Unido e da Nova Zelândia, a nova tecnologia já beneficiou mais de 15 pessoas durante os testes de aprovação e tem potencial para alcançar milhares, especialmente com a liberação comercial na Europa, que ocorreu este ano. A Rayner, que investiu mais de 10 milhões de libras no desenvolvimento e distribuição do produto, acredita que a Galaxy pode conquistar até 10% do mercado de lentes intraoculares multifocais na Europa até 2025. A previsão é que a chegada ao Brasil ocorra no próximo ano.

O tempo de desenvolvimento foram drasticamente reduzidos graças à integração de inteligência artificial e aprendizado de máquina no design da lente. Segundo Lyra, uma nova proposta de engenharia leva, tradicionalmente, entre três e seis anos; caiu para cerca de dois anos. Isso não só acelerou o lançamento da tecnologia, como também reduziu custos. "Um projeto como esse normalmente custaria de US$ 5 a 6 milhões. Conseguimos otimizar todo o processo e desenvolver a lente por menos da metade desse valor", afirma Lyra. A estimativa é que o custo final da lente para o consumidor fique entre US$ 2.500 e US$ 4.000, dependendo do mercado.

A Galaxy trouxe uma mudança de paradigma na indústria de lentes intraoculares. Desde os anos 2000, o design das lentes multifocais não mudou significativamente, permanecendo na tecnologia de anéis infrativos, que resolvia parte dos problemas de visão, mas trazia desconforto para muitos pacientes. Com a pandemia e a nova busca global por qualidade de vida — e, consequentemente, por melhor qualidade de visão —, a demanda por soluções mais eficientes cresceu. "O mundo passou a exigir mais", ressalta Lyra, apontando que tecnologias antigas não atendem mais às necessidades de pacientes que querem dirigir à noite, viajar mais e ter visão clara sem óculos, além de usarem dispositivos eletrônicos por muito mais tempo que gerações anteriores.

A solução da lente Galaxy

O design em espiral da lente oferece um "corredor de visão" que cobre uma faixa de 30 a 80 cm de visão, sem os incômodos halos ou perda de contraste que eram comuns nas lentes anteriores. Para isso, a equipe utilizou algoritmos de machine learning para ajustar mais de mil parâmetros no design da espiral, junto  de um sistema de ray tracing, em português "traçado de raios", a mesma tecnologia usada em videogames para simular a luz em ambientes virtuais. Ela cria o caminho da luz através de uma retina simulada, garantindo a máxima precisão óptica.

O avanço tecnológico da Galaxy representa uma importante vitória não apenas para a ciência, mas também para a indústria brasileira. O projeto foi apresentado recentemente na feira de oftalmologia de Barcelona, onde mais de 18 mil profissionais de todo o mundo tiveram a oportunidade de conhecer a inovação na área da saúde ocular.

O cirurgião brasileiro responsável pelo projeto, junto com sua equipe, tem planos ambiciosos para os próximos anos. Eles pretendem investir cerca de R$ 30 milhões em novas soluções criativas e tecnologias baseadas em biotecnologia e IA, voltadas para a saúde dos olhos.

Entre as inovações já desenvolvidas, destaca-se um software proprietário que utiliza IA e está atualmente em fase de testes. Lyra parece ter a visão clara sobre o negócio.

Acompanhe tudo sobre:Inteligência artificialPesquisaMedicina

Mais de Inteligência Artificial

Dupla do Google DeepMind divide prêmio Nobel de química com bioquímico dos EUA

WhatsApp recebe Meta AI no Brasil após resolução de problemas com a ANPD

Ganhador do Nobel de Física alerta para riscos da Inteligência Artificial não controlada

O que o primeiro MBA em inteligência artificial para negócios significa para o Brasil