Atualmente, são mais de 76 milhões de ações em tramitação no Judiciário brasileiro (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)
Redator
Publicado em 29 de setembro de 2025 às 13h24.
Um dos sistemas judiciais mais litigiosos do mundo, o Brasil tem cada vez mais recorrido à inteligência artificial para dar vazão ao alto volume de processos. Atualmente, são mais de 76 milhões de ações em tramitação. Só o Supremo Tribunal Federal (STF) recebe cerca de 80 mil novos casos por ano — dez vezes mais que a Suprema Corte dos EUA.
Para lidar com esse cenário, entre 2019 e 2023, tribunais brasileiros desenvolveram ou implementaram mais de 140 projetos com IA, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). As ferramentas, baseadas em machine learning e grandes modelos de linguagem (LLMs), ajudam a localizar precedentes, classificar ações, redigir despachos e prever decisões judiciais.
No STF, o uso da MARIA (Módulo de Apoio para Redação com IA) — ferramenta desenvolvida pela equipe técnica do tribunal, baseado nos modelos da OpenAI (ChatGPT) e do Google (Gemini) — reduziu o acúmulo de processos ao menor nível desde 1992. Em todo o país, os casos encerrados cresceram 75% em comparação a 2020, de acordo com o CNJ.
Ao mesmo tempo, o uso da IA também já se espalhou entre os advogados: mais da metade utiliza ferramentas generativas diariamente, segundo a seccional de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP). Em 2024, foram protocoladas 39 milhões de novas ações — um salto de 46% desde 2020. Com defesas que antes levavam 20 minutos sendo feitas em segundos, a automação também alimenta um ciclo de crescimento acelerado de litígios.
Enquanto grandes escritórios utilizam ferramentas próprias e pagas para análise de documentos, comparação de pareceres e revisão de peças, advogados autônomos sem acesso a esse tipo de software recorrem a versões gratuitas, como a do ChatGPT, para otimizar o trabalho e lidar com o acúmulo de tarefas.
Entre as legaltechs, destaca-se a norte-americana Harvey, com mais de 500 clientes em 54 países e receita de US$ 100 milhões. Fundada em 2022, a startup de IA jurídica já recebeu investimentos de Sequoia Capital e OpenAI.
O interesse não para por aí: somente em 2025, investidores aplicaram mais de US$ 1 bilhão em startups de tecnologia jurídica. A expectativa é que o setor movimente US$ 47 bilhões até 2029, segundo a Research and Markets.
Apesar do crescente uso e dos ganhos operacionais, especialmente em tarefas repetitivas, especialistas ressaltam que a IA deve complementar — e não substituir — a revisão humana e a análise jurídica contextual. Recentemente, a ONU também alertou governos sobre os riscos do chamado solucionismo tecnológico no Judiciário.