Inteligência Artificial

Autenticidade em crise: a inteligência artificial vai roubar a nossa identidade?

CEOs correm para abraçar a inteligência artificial e turbinar suas imagens – mas enfrentam o paradoxo entre eficiência e autenticidade

Crise de identidade: o papel da IA no marketing (Imagem gerada com auxílio de Inteligência Artificial)

Crise de identidade: o papel da IA no marketing (Imagem gerada com auxílio de Inteligência Artificial)

Miguel Fernandes
Miguel Fernandes

Chief Artificial Intelligence Officer da Exame

Publicado em 18 de abril de 2025 às 16h33.

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Comecei meu dia digitando poucas palavras no ChatGPT. Em segundos, a inteligência artificial gerou um texto polido para minha página no LinkedIn, exaltando a visão da minha empresa com eloquência. Fiquei impressionado. Aquele post soava como eu, porém não nasceu de mim. Ao delegar minha voz a um algoritmo, senti minha marca pessoal escorregar pelos dedos.

Eis o dilema: até que ponto a revolução da IA pode custar a nossa autenticidade?

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A revolução tentadora

Não estou sozinho nessa experimentação. Do mundo corporativo às redes sociais, muitos líderes já mergulharam de cabeça nas promessas da inteligência artificial. A estrategista de marketing Diandra Santos, por exemplo, admite sem rodeios: Eu uso a inteligência artificial em absolutamente tudo que eu faço hoje para otimizar o meu tempo e otimizar o tempo do meu time.

A IA virou uma espécie de co-piloto onipresente na criação de conteúdo e gestão da imagem pessoal. Diandra inclusive desenvolveu agentes virtuais capazes de replicar seu tom de voz em roteiros de vídeo – um experimento que já rendeu posts com mais de 400 mil visualizações.

Os números corroboram o entusiasmo: 8 em cada 10 profissionais de marketing no Brasil já utilizam IA nas estratégias, colhendo ganhos concretos de eficiência e velocidade, aponta pesquisa do IAB Brasil, feita em parceria com a Nielsen.

A criação de conteúdo se tornou a aplicação mais comum, adotada por 71% desses profissionais, enquanto análise de dados e otimização de campanhas vêm logo em seguida. Em outras palavras, a tecnologia está deixando de ser diferencial e virando padrão – e quem não aproveitar, arrisca ficar para trás.

Do ponto de vista de negócios, a promessa é sedutora. Com algoritmos generativos, um CEO pode publicar artigos, posts e até vídeos a uma cadência antes impensável, mantendo presença constante sem sacrificar tempo estratégico. A marca pessoal 2.0 promete ser onipresente, otimizada e – em tese – mais influente do que nunca.

O risco do colapso autêntico

Na euforia de aderir a essa revolução, aumenta também um sinal de alerta: a linha que separa amplificar de perder sua voz é tênue. A mesma Diandra que abraça a IA reconhece a raiz do problema. Vivemos uma crise de confiança.

“As pessoas estão com medo de consumir o que é novo”, disse ela ao descrever uma tendência de neofobia em meio a tantas novidades tecnológicas. Bombardeado por deepfakes e conteúdos genéricos, o público se retrai para o familiar e, nessas horas, credibilidade vale ouro: “é muito mais fácil criar credibilidade com uma marca pessoal do que com marcas corporativas distantes”.

Ou seja, o valor da autenticidade humana nunca esteve tão alto – e exatamente por isso, automatizar demais a própria imagem pode ser um tiro no pé.

Diandra garante a autenticidade do conteúdo com seus personagens editoriais (Arquivo pessoal)

A atenção, principal moeda do marketing pessoal, se torna ainda mais disputada quando todos os players usam as mesmas táticas automatizadas. Nessas horas, a história única de cada líder, suas vulnerabilidades e seu toque humano passam a ser o fiel da balança para se destacar no mar de informações.

Ao mesmo tempo em que a IA promete uma revolução, ela pode precipitar um colapso na diferenciação e na confiança – pilares da marca pessoal construída ao longo de anos.

O equilíbrio entre algoritmo e autenticidade

Diante desse impasse, a solução aponta para um equilíbrio cuidadoso, uma espécie de “via do meio” entre rejeitar a tecnologia e render-se completamente a ela. A inteligência artificial veio para ficar, mas o como usá-la é o que definirá vencedores e perdedores nessa nova fase do branding pessoal.

Também é vital definir limites claros. Cada líder deve se perguntar sobre quais aspectos da sua marca pessoal não podem ser delegados. Diandra Santos, apesar de todo seu arsenal de bots, reconhece que nenhum robô pode assumir em seu lugar. E toca em um ponto crucial: interações humanas genuínas – responder a um comentário sensível, negociar uma parceria olhando no olho (mesmo que via Zoom), compartilhar uma história pessoal – permanecem insubstituíveis.

A empatia e a vivência humana por trás de cada comunicação são o que cria conexão de verdade. Automatize o que for operacional, preserve o que for emocional e estratégico. Autoridade não se copia e reputação não se terceiriza.

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