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Hering: tesouraria comprou R$ 60 mi em ações enquanto negociava fusão

Companhia comprou papéis entre os dias 12 e 22, justamente no momento mais crítico das negociações com Arezzo e Grupo Soma

Loja Hering: no mês passado, o Grupo Soma anunciou acordo para incorporar a Cia Hering, que foi avaliada em cerca de 5,32 bilhões de reais. (Hering/Divulgação)

Loja Hering: no mês passado, o Grupo Soma anunciou acordo para incorporar a Cia Hering, que foi avaliada em cerca de 5,32 bilhões de reais. (Hering/Divulgação)

GV

Graziella Valenti

Publicado em 10 de maio de 2021 às 21h05.

Última atualização em 11 de maio de 2021 às 09h01.

A aquisição da Hering ganhou mais um capítulo após a divulgação de um relatório mensal obrigatório, exigido pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). No mês de abril, enquanto a companhia recebia propostas de combinação de negócios da Arezzo e do Grupo Soma, conforme apresentação das empresas, a tesouraria da empresa adquiriu mais R$ 60 milhões de ações no mercado.

As aquisições ocorreram entre os dias 12 e 22. Quando estava avaliada em R$ 2,7 bilhões, a Hering tornou pública a existência de uma proposta de união de negócios feita pela Arezzo, que avaliava a empresa em aproximadamente R$ 3,4 bilhões. Nesse mesmo comunicado, recusou a oferta, que não era vinculante. A decisão foi tomada de forma unânime pelo conselho de administração.

Fabio Hering era, então, presidente executivo da empresa e membro do conselho. As quase 3.000.000 adquiridas valem hoje R$ 86,3 milhões na bolsa, uma valorização da ordem de 43%. Todas as compras foram realizadas justamente no período mais intenso das conversas.

A companhia ainda não divulgou o balanço do primeiro trimestre deste ano. De acordo com o balanço de 2020, encerrou dezembro com pouco mais de R$ 470 milhões em caixa. O investimento nos próprios papéis, portanto, era equivalente a quase 13% desse total.

Ao longo dos meses janeiro, fevereiro e março de 2021, a Hering não realizou nenhuma aquisição de ações de sua emissão na bolsa. Desde o dia 19 de abril, a xerife do mercado avalia o comportamento da companhia a respeito da divulgação das informações. A análise do caso começou "de ofício", ou seja, a própria autarquia agiu, sem que houve qualquer provocação externa sobre o tema.

Em 19 de agosto do ano passado, a empresa deu início a um programa de recompra de ações com objetivo de adquirir até 5.000.000 papéis, durante o período de um ano. Em nota ao EXAME IN, a empresa relembra que havia alertado ao mercado que manteria a recompra ativa (Confira a íntegra no fim da reportagem). Antes de abril, o maior movimento ocorreu no próprio mês da renovação do programa, em agosto de 2020 — foram compradas cerca de 2.000.000 de ações, com um investimento de R$ 33,8 milhões.

No dia 15 de abril, a empresa recebeu um questionamento da CVM a respeito das negociações com as ações. A autarquia detectou aumento no volume financeiro e da quantidade de transações entre os dias 1 e 15, a data em que enviou o documento à companhia.

A Hering respondeu que “nas datas informadas não havia qualquer fato ou ato pendente de divulgação pela administração que pudesse justificar a oscilação ocorrida nas ações de sua emissão”. Segundo a empresa, o movimento não poderia ser atribuído à informação sobre a proposta da Arezzo, “uma vez que: i) não houve vazamento de qualquer informação ao mercado; e ii) o conhecimento do seu conteúdo ficou adstrito ao conselho de administração e aos assessores da companhia".

Por fim, o anúncio da combinação com o Grupo Soma foi feito na manhã no dia 26 de abril, antes da abertura do mercado. Nesse momento, os investidores tomaram conhecimento que os principais acionistas da Hering, herdeiros dos fundadores, donos de aproximadamente 23% do capital, aceitaram uma combinação com o grupo dono das marcas Farm, Animale, Cris Barros, entre outras. Para a operação, a Hering foi avaliada em R$ 5,1 bilhões.

A união ainda depende de aprovação da maioria dos acionistas em assembleia geral. A família não possui o controle majoritário do negócio.

O caso público mais famoso envolvendo tesouraria e um fato público foi quando a JBS vendeu ações que mantinha em tesouraria antes do famoso Joesley Day, 17 de maio de 2017, quando o Brasil soube que os fundadores da empresa Joesley e Wesley Batista estavam aguardando homologação de suas colaborações premiadas à Procuradoria Geral da República (PGR) e que tinham, inclusive, gravado o então presidente da República Michel Temer (PMDB).

Após consulta pelo EXAME IN, a Hering respondeu que: "A recompra de ações de Hering é pública, vem ocorrendo desde agosto de 2020 e faz parte de decisão do Conselho de Administração de proteção aos interesses aos acionistas da companhia. A informação consta do próprio Comunicado ao Mercado de 14 de abril, quando da rejeição da oferta não solicitada de Arezzo." Em seguida, a empresa relembra o que disse na data da recusa da Arezzo: “Em conjunto com a busca por crescimento orgânico, a companhia continuamente analisa oportunidades inorgânicas e manterá seu programa de recompra de ações aprovado pelo conselho de administração, em reunião realizada em 18/08/2020".

Naquele momento (14/4), segundo diz a Hering em sua resposta, "não existia uma oferta de Soma". A partir do momento em que passou a negociar com o Grupo Soma, a companhia não executou nenhuma compra de ação dentro do programa. A companhia Hering sempre se pauta, e continuará se pautando, por ações transparentes e éticas."

 

 

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