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Adaptação na COP30: novos rascunhos adotam 'indicadores de Belém', mas esvaziam financiamento

Lista de 59 indicadores vai medir progresso em resiliência às mudanças climáticas, mas compromisso de triplicar recursos perde força ao migrar para decisão do Mutirão, apontam analistas

Adaptação climática é sobre como os países estão investindo em resiliência para lidar com os efeitos mais severos da crise do clima (Leandro Fonseca /Exame)

Adaptação climática é sobre como os países estão investindo em resiliência para lidar com os efeitos mais severos da crise do clima (Leandro Fonseca /Exame)

Sofia Schuck
Sofia Schuck

Repórter de ESG

Publicado em 21 de novembro de 2025 às 14h47.

Última atualização em 21 de novembro de 2025 às 14h50.

Belém, Pará - O novo rascunho do documento Decisão do Mutirão, que trata dos principais temas da COP30, divulgado pela presidência brasileira da conferência nesta manhã do último dia oficial da conferência climática cria uma série de "salas de espera" para os temas mais importantes: transição justa, financiamento e adaptação.

A avaliação é de Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa, em um dia marcado pelo atraso das negociações devido ao incêndio da quinta-feira, 20, e com a diplomacia brasileira fazendo "malabarismo" para chegar a um pacote final após o texto frustrar por não conter menção ao roteiro do fim dos combustíveis fósseis e do desmatamento.

Paralelamente, outros textos foram apresentados e a adaptação foi um dos temas que ganhou espaço dentro da agenda formal de negociação, apresentando avanços na chamada Meta Global de Adaptação (GGA).

O novo documento adota os "Indicadores de Belém" para medir progresso em como países estão se adaptando frente à nova realidade do clima — um resultado celebrado como um dos mais esperados após dias de impasse, especialmente entre países africanos e árabes que pediram pelo menos dois anos a mais para negociar. 

No entanto, a lista que começou com 9 indicadores na COP28 em Dubai e passou a contemplar mais de 100 na Conferência de Bonn, agora foi reduzida para 59 finais -- abrangendo áreas críticas como água, alimentos, saúde, ecossistemas, infraestrutura e patrimônio cultural.

Com a definição, será possível medir a capacidade de países, comunidades e ecossistemas naturais de enfrentar riscos crescentes associados a eventos extremos e "abrir caminho para políticas públicas e investimentos efetivos em adaptação".

Financiamento vago e sem responsáveis claros

Uma das críticas diz respeito ao financiamento para adaptação ter sido removido do texto da GGA e transferido para o documento da decisão do mutirão, em que aparece de "forma substancialmente vaga e enfraquecida".

Especialistas alertam que esta mudança faz parte da estratégia da presidência brasileira para tentar avançar com os temas mais espinhosos entre as partes, mas deixa uma lacuna justamente no componente que os países em desenvolvimento mais necessitam: recursos para lidar com os efeitos mais severos das mudanças do clima. 

A expectativa de financiamento para adaptação era saltar dos atuais US$ 40 bilhões anuais para US$ 120 bilhões até 2030, compromisso que vinha sendo negociado desde a COP29 em Baku.

Embora o novo texto apresente avanços na menção de triplicar os recursos até 2030, há uma ausência de fontes e mecanismos claros e falta de definição sobre quem é "responsável por pagar esta conta".

"É uma citação de forma tão vaga que vira um jogo de 'deixa que eu deixo', exatamente o que não podemos aceitar", destacou Unterstell.

Meta global de adaptação e indicadores de Belém

Daniel Porcel, especialista do Instituto Talanoa, complementou que há avanços claros na proposta do texto do GGA.

O texto estabelece dois novos processos: a Visão Belém-Addis, um alinhamento de políticas de dois anos, e o Roteiro de Adaptação de Baku, focado em coordenação entre agendas.

Os dois processos têm funções complementares: a Visão Belém-Addis cuidará da parte técnica e em como aprimorar os métodos para medir se os indicadores estão funcionando na prática, com uma força-tarefa dedicada cujos resultados serão apresentados na COP32 em 2027, na Etiópia.

Enquanto isso, o Roteiro de Baku focará na implementação concreta, organizando workshops semestrais até 2028 para coordenar os diversos órgãos da ONU que trabalham com adaptação e facilitar o acesso dos países em desenvolvimento a recursos, tecnologia e capacitação.

Já a redução de 100 para 59 indicadores ainda gera dúvidas entre os especialistas.

"Ainda não conseguimos analisar quais foram removidos e qual o impacto disso", afirma Fernanda Bortolotto, da The Nature Conservancy Brasil. O documento mantém alguns princípios importantes: os indicadores são voluntários, não punitivos e não podem ser usados como condição para países em desenvolvimento acessarem financiamento.

Atendendo demandas africanas, o texto também inclui salvaguardas para implementação dos indicadores e mantém a linguagem sobre financiamento público internacional de países desenvolvidos para os países em desenvolvimento mais vulneráveis à crise do clima. 

Os três pilares indissociáveis

O enfraquecimento da adaptação na agenda formal ocorre no mesmo dia em que o rascunho eliminou completamente a linguagem sobre transição para eliminação gradual dos combustíveis fósseis, agenda que a presidência brasileira vinha posicionando desde o início como uma das entregas de Belém.

Especialistas ouvidos pela EXAME ressaltam que "não significa que está tudo perdido" neste sentido e ainda pode haver alguma menção no acordo final, visto que as negociações seguem a todo vapor nas salas fechadas.

Nesta manhã, ao menos 37 países se mobilizaram para uma resposta da presidência da COP30 sobre o "roadmap" ou roteiro que leve ao fim dos fósseis. 

"Sem dúvida é um rascunho que nos destina a mais de 2 graus de aquecimento", disse Unterstell sobre a Decisão do Mutirão Global.

Mais cedo, o secretário-geral da ONU, António Guterres, identificou a Arábia Saudita como principal responsável por manobras de bloqueio para avançar nas agendas, segundo noticiou o jornal Financial Times. Em reuniões com a União Europeia, Guterres alertou que, como consequência, "as negociações podem fracassar".

"O que está sendo proposto agora é inaceitável. Estamos realmente diante de um cenário sem acordo", declarou também o comissário europeu do clima, Wopke Hoekstra.

A unanimidade é que um acordo robusto exige três pilares indissociáveis: financiamento justo, adaptação real e caminho claro para o fim dos fósseis.

Com o mapa de transição já fora do texto e o financiamento para adaptação diluído em "linguagem vaga", resta ao último dia de COP30 uma tarefa árdua: resgatar a ambição que o Brasil prometeu ao colocar adaptação e implementação no centro. 

As próximas horas serão como uma prova de fogo do próprio discurso antes que "as portas se fechem em Belém", alertam especialistas.

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