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Pirâmides, roubos, falsificações: criptoativos têm mais golpes? Entenda

Falta de conhecimento sobre o setor e ausência de verificação são apontados por especialistas como causas para perdas

Setor de criptoativos tem volume financeiro menor que outras opções de investimento, mas número grande de usuários (EDUARD MUZHEVSKYI / SCIENCE PHOTO LIBRARY/Getty Images)

Setor de criptoativos tem volume financeiro menor que outras opções de investimento, mas número grande de usuários (EDUARD MUZHEVSKYI / SCIENCE PHOTO LIBRARY/Getty Images)

Não é incomum encontrar notícias sobre golpes envolvendo diversos tipos de aplicações financeiras, incluindo os criptoativos. Das chamadas pirâmides financeiras até estratégias de convencimento para roubo de ativos, essas práticas não existem apenas no Brasil, e não se restringem aos ativos digitais.

Recentemente, alguns casos acabaram se tornando mais famosos, afetando a reputação do setor. É o caso da chamada “Rainha Cripto”, que criou uma falsa criptomoeda para sustentar uma esquema de pirâmide em que enganou mais de 3 milhões de investidores e obteve mais de US$ 4 bilhões.

No Brasil, houve o caso ainda do “Faraó dos bitcoins”, investigado por também ter criado um suposto esquema de pirâmide para atrair investidores e usar os fundos enviados por eles para aplicação em criptoativos.

Por trás desses casos, especialistas citam à EXAME um cenário ainda favorável atualmente para a prática de golpes envolvendo criptoativos, mas alertam que a atenção dada a esses casos mais marcantes podem acabar criando uma imagem de total insegurança no setor que não é verdadeira.

Os tipos de golpes

Para João Zecchin, co-fundador da Fuse Capital, a maior parte dos golpes envolvendo os criptoativos estão voltados a vulnerabilidades dos próprios usuários. Uma das práticas mais comuns é o chamado phishing, em que há o envio de mensagens ou e-mails falsos para convencer investidores a fornecer dados.

Realizados para obter diversos tipos de informações, no caso do mundo cripto o foco dessa prática é obter as chaves de acesso a carteiras digitais, permitindo movimentar as criptomoedas guardadas nelas.

(Mynt/Divulgação)

“Existem ataques mais sofisticados, em que se coloca em um contrato a permissão para alcançar outros ativos em uma carteira, e tem golpes mais de engenharia social, de quem se passa por assessores financeiros, pedem quantia grande prometendo retornos absurdos e aí somem com o dinheiro”, explica Zecchin.

Ele alerta ainda que, hoje, o Twitter acabou se tornando a plataforma favorita dos golpistas, já que lá é fácil identificar pessoas que falam sobre criptomoedas e entrar em contato com elas.

Outro golpe muito comum, diz Zecchin, envolve a “comunicação do usuário de que recebeu algo, aí ele acredita e revela a senha da carteita. Mas esses golpes não ficam públicos porque são pequenos, afetam um usuário só”.

“O que se fala mais são de golpes financeiros, eles têm uma escala maior, chamam mais atenção, mas afetam os menores investidores, quem começa a investir buscando ter algum retorno”, avalia.

Ele lembra que “quem é experiente no tema financeiro sabe que esses retornos prometidos são irreais, quem cai nisso geralmente é iniciante, e se afasta do setor”.

Para Victor Jorge, professor do MBA in company da FGV e sócio do escritório Jorge Advogados, “o golpe mais comum que encontramos é o da pirâmide financeira, que em 99% das vezes envolve um ganho estratosférico prometido e a impossibilidade de sacar o dinheiro a hora que quiser”.

Ele cita também o da chamada falsa carteira, em que um suposto assessor de investimentos aponta um endereço de carteira para depósito de ativos que, depois, desaparecem.

Há ainda o “pig butchering”, um tipo de pirâmide em que os golpistas vão “engordando o porco até abater”. Nele, o investidor “vai vendo resultados, tem uma carteira compartilhada, cria confiança, mas na hora de sacar ele pede uma taxa e quando paga cria outro pagamento e vai enrolando, no fim perdeu todo o dinheiro”.

“Hoje, o que acontece é que tem questões de gestão financeira fraudulenta, crimes financeiros, que envolvem atuar como instituição financeira sem autorização, e tem até crimes como estelionato, organização criminosa, evasão de divisas, furto qualificado, mas não há um crime específico para o setor”, explica o advogado.

Jorge afirma ainda que atualmente é difícil investigar esses atos e achar e responsabilizar os golpistas, seja devido às complexidades do setor de criptoativos, à falta de conhecimento dos investigadores ou até ao fato do golpista estar no exterior, fora do alcance das leis brasileiras.

“Sempre desconfie de uma oferta muito boa. Se não tem como tirar dinheiro a hora que quiser, tome cuidado, se tem ganho estratosférico, 10% ao mês, um ganho garantido, desconfie”, alerta.

O setor de criptoativos é mais inseguro?

Para o advogado, os golpes são muitas vezes ajudados pela desinformação, ou falta de informação, por parte do público quanto ao funcionamento do setor. Há, ainda, uma falta de regulamentação. “O mercado é mais suscetível à aplicação de golpes, teve um boom de rentabilidades estratosféricas e outras questões que geraram um ambiente propício à aplicação de golpes”, acredita.

Jorge acredita que, por ser um mercado novo, há mais insegurança, e que os criptoativos oferecem uma facilidade de exaurir investimentos em golpes com movimentações mais rápidas e fáceis. Elas dependem, porém, de encontrar um investidor desprevenido.

“A pessoa tem que saber ler essa transparência do setor, enxergar. Existem diversos mecanismos, softwares e ferramentas, que identificam a origem dos criptoativos, se é espúria, se tem risco, se é pirâmide, mas demanda um interesse, leitura, intepretação. A transparência dá segurança, mas precisa conseguir interpretar, porque nem todos têm esse conhecimento”, ressalta Jorge.

Ele defende ainda que o setor “precisa de legislação específica, que não mate o empreendedor mas não deixe livre da forma como está, que gera uma sensação de impunidade”, e que é preciso também que as empresas invistam mais em educar os investidores sobre os perigos do segmento.

Já Zecchin, da Fuse, observa que o setor é menor que outros pensando em volume financeiro, mas no Brasil é maior que o mercado de ações pensando em número de usuários. Entretanto, ele é mais fragmentado.

“É um mercado muito novo, as pessoas não sabem direito como funciona, e dá poder total sobre os ativos para os investidores. Com os usuários aprendendo a mexer ainda, é natural que tenha mais golpes”, pondera.

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Ele acredita ainda que, por ser um segmento mais transparente, os golpes acabam sendo mais evidentes e divulgados, o que ajuda a criar uma imagem de insegurança maior que não pode ser estabelecida com certeza. No mercado tradicional, “às vezes uma empresa ou banco é hackeado mas absorve aquilo e esconde a perda para não ter crise de transparência”.

O co-fundador da Fuse diz ainda que há um “volume de golpe grande porque tem uma responsabilidade grande pro usuário. Tem esse controle e é algo muito técnico, profundo, que o usuário comum ainda não detém, não consegue digerir as informações que existem”.

Mas também existem alternativas, como uso de corretoras de criptoativos para armazenamento e negociação, em geral com mais segurança. Nesses casos, é importante pesquisar bem antes de escolher uma exchange.

Zecchin destaca que “a parte financeira sempre é mais vulnerável a golpe, porque lida com dinheiro. Os grandes golpes aqui até agora foram nisso, prometendo retornos elevadíssimos”.

Para ele, uma redução nos golpes passa por facilitar o uso da tecnologia por parte dos usuários, reduzindo a necessidade de ter conhecimentos técnicos, algo que pode ser facilitado pela união entre empresas tradicionais e as nativas do setor.

“A regulação ajuda a coibir? Pouco, mas não é muita efetiva porque qualquer mercado emergente sempre teve golpe. O cartão de crédito no começo tinha um volume de golpe absurdo, e o golpe não caiu pela regulação, caiu por fatores do mercado, um ajuste. A partir do momento que as empresas tomam responsabilidades pelas perdas, e isso é importante, vão agir para proteger os usuários”, defende.

Ele ressalta também que “o tamanho do mercado é muito relevante em quantidade de usuários e alcance, é um dos maiores mercados novos que cresce 100% online, tem acesso à população do mundo todo. Todos os ativos estão em todos os lugares, 24/7, então é natural que tenha um volume de cosias boas e ruins muito elevado”.

“Pela quantidade de empresas, o nível de profissionalismo tem crescido a cada ano. Uma previsão dessa integração de Web2 e Web3 deve ocorrer em cinco anos, e isso vai dar mais proteção e maturidade para o setor e segurança para os usuários”, projeta Zecchin.

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