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O que esperar da nova regulação dos criptoativos após a Consulta Pública BCB 109/2024

Inspirado na trajetória do mercado de capitais, o texto submetido a debate na consulta pública busca equilibrar inovação e proteção, criando categorias de prestadores de serviços, requisitos de capital mínimo e uma extensa agenda de transparência informacional

Direito e tecnologia (the-lightwriter/Getty Images)

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Da Redação
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Publicado em 17 de agosto de 2025 às 10h07.

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Por João Paulo Meirelles e Ricardo Azevedo*

A Consulta Pública BCB 109/2024, encerrada em fevereiro deste ano, consolidou o caminho para que o Banco Central assuma de forma concreta a supervisão dos prestadores de serviços de ativos virtuais, tarefa que foi atribuída ao BCB pelo Decreto nº 11.563/23, com o objetivo de regulamentar a Lei nº 14.478/22.

Inspirado na trajetória do mercado de capitais, o texto submetido a debate na consulta pública busca equilibrar inovação e proteção, criando categorias de prestadores de serviços, requisitos de capital mínimo e uma extensa agenda de transparência informacional, sendo este último, um dos pilares centrais da proposta regulatória.

O escopo da proposta deixa de fora os tokens não fungíveis, os instrumentos financeiros tokenizados e os bens tangíveis tokenizados, os quais, deverão ser regulados por normas específicas a serem editadas pelo Bacen ou eventualmente compartilhadas e/ou direcionadas a outros órgãos vinculados ao Ministério da Fazenda. Portanto o foco recai nas criptomoedas clássicas, cuja intermediação ainda carece de padrões mínimos de regulamentação.

No que tange à modalidade de atuação, os prestadores de serviços de ativos virtuais deverão, conforme a proposta do Banco Central, se enquadrar em uma das seguintes categorias: intermediários, custodiantes ou corretoras. As intermediárias são responsáveis por mediar e executar atividades como distribuição, subscrição, negociação e provisão de liquidez de ativos virtuais. As custodiantes, por sua vez, concentram-se na guarda e controle dos ativos virtuais e na conciliação das posições dos clientes. Já as corretoras acumulam as funções de intermediárias e custodiantes.

Para cada modalidade, o regulador propõe a necessidade de um capital social mínimo, conforme o grau de responsabilidade e higidez regulatórios, sendo de um milhão de reais para as intermediárias, dois milhões para as custodiantes e de três milhões para as corretoras. Embora esses montantes mínimos possam parecer referências modestas diante do porte global das exchanges que atuam no país, refletem a preocupação do Bacen com a solvência e a continuidade operacional das prestadoras de serviços nesse setor econômico.

A proposta em consulta pública também dedica atenção especial ao patrimônio dos clientes desses prestadores de serviços, determinando que recursos e criptoativos deverão permanecer segregados dos ativos da empresa, com registro em contas individualizadas. A medida visa reduzir o risco de apropriação indevida ou confusão patrimonial, cenários que ganharam notoriedade em colapsos recentes de plataformas estrangeiras, como no caso da FTX.

A respeito do relacionamento com o investidor, a proposta impõe a implementação obrigatória de políticas de suitability, exigindo que as prestadoras de serviços avaliem o perfil de risco de cada cliente antes de realizar qualquer operação. Se o cliente optar por uma operação que não seja compatível com seu perfil, a prestadora deverá solicitar uma declaração específica ou termo de ciência, no qual o investidor reconhece e assume os riscos envolvidos. Essa abordagem segue o modelo já adotado no mercado de capitais, especialmente pelas corretoras de valores mobiliários.

No contexto da transparência informacional, as prestadoras de serviços de ativos virtuais deverão disponibilizar informações detalhadas sobre sua autorização junto ao Banco Central, licenças regulatórias, políticas organizacionais, eventuais conflitos de interesse e existência ou não de cobertura securitária.

No que tange às operações, a proposta de texto normativo exige a transmissão de dados completos à instituição receptora sobre o originador e o beneficiário das transações, em linha com as diretrizes internacionais de prevenção à lavagem de dinheiro e combate ao financiamento do terrorismo em vigor.

Além disso, há obrigações direcionadas para cada tipo de prestadora. As intermediárias, por exemplo, devem apresentar, em linguagem acessível, informações sobre o emissor ou idealizador do ativo, seu propósito, a tecnologia utilizada, mecanismos de estabilização e formas de resgate, tendo como norte o princípio da ampla e adequada divulgação (full and fair disclosure) consagrado no âmbito do mercado de capitais.

Já as custodiantes ficam encarregadas de fornecer, ao menos a cada trimestre, relatório do saldo, quantidade e histórico de movimentações dos criptoativos do cliente, além de comunicar eventos que alterem direitos sobre os ativos custodiados.

Tal qual a CVM, o Banco Central aposta na disciplina do full and fair disclosure como antídoto contra a assimetria informacional. Não se trata de chancela implícita dos ativos ofertados, e sim de criar condições para que o investidor tome decisões conscientes, em bases transparentes e equitativas.

O avanço normativo proposto implicará em custos de adaptação para os prestadores de serviços do mercado de ativos virtuais, sobretudo os de menor porte. Como contrapartida, apresenta-se a possibilidade de ganho reputacional e de expansão do mercado, que hoje sofre com a insegurança regulatória e desconfiança de potenciais investidores. Para estes, a norma proposta promete maior previsibilidade e vias de reparação mais claras em caso de descumprimento de deveres dos prestadores de serviço.

Embora a proposta apresentada pelo Bacen reflita fortemente as práticas adotadas no mercado de capitais, o que contribui para uma melhor compreensão do desenho regulatório por quem já atua no setor, não menor será o desafio do regulador de calibrar exigências sem sufocar a inovação, mantendo diálogo permanente com o mercado.

Uma regulação que se mostre demasiada rígida pode empurrar negócios para a informalidade; mas a ausência de regras, como se viu em episódios internacionais, também cobra seu preço. O equilíbrio, portanto, será determinante para que o país integre, com segurança jurídica, o ecossistema global de ativos digitais, também sob a perspectiva normativa e regulatória.

*João Paulo Meirelles e Ricardo Azevedo são sócios do Chalfin Goldberg Vainboim Advogados.

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