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Agência de notícias
Publicado em 4 de julho de 2025 às 09h30.
Normalmente associadas a roubos, tráfico de drogas e negócios ilegais, facções criminosas como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV) estão buscando conferir legalidade às suas operações se infiltrando na economia formal e nos mercados financeiros.
Os sindicatos do crime exploram brechas regulatórias e a complexidade dos sistemas financeiros tradicionais para criar empresas de fachada ou tomar parte em negócios legítimos – desde o transporte público e privado e a cadeia de produção e distribuição de combustíveis, passando por limpeza urbana, serviços de saúde, até o mercado imobiliário e as fintechs.
A estratégia do crime organizado visa não apenas a lavagem de dinheiro, mas também a expansão de seu poder e influência.
Empresários nacionais e estrangeiros ouvidos pela Folha de São Paulo temem que o crime organizado esteja contaminando a Faria Lima, coração empresarial e financeiro do Brasil, ameaçando a segurança da economia formal e do ambiente de negócios no país.
Segundo eles, tem se tornado cada vez mais difícil distinguir o que é lícito do que é ilícito na cadeia econômica. As operações financiadas pelo dinheiro de facções criminosas não apenas comprometem a integridade do sistema financeiro – resultam também em concorrência desleal contra empresas que operam estritamente dentro da legalidade.
A arquitetura do sistema financeiro tradicional, com suas múltiplas camadas e jurisdições, é explorada para criar mecanismos sofisticados de ocultação. A complexidade das estruturas societárias, que incluem empresas de fachada, holdings interligadas e redes de subsidiárias, permite que o dinheiro de origem ilícita seja integrado ao fluxo de capital legítimo.
O uso estratégico de intermediários – os chamados "laranjas" – adiciona outra camada de dissimulação, dificultando a rastreabilidade dos verdadeiros proprietários e beneficiários de um negócio, como explicou o promotor de Justiça Fábio Bechara, integrante do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado) do Ministério Público do Estado de São Paulo:
“Se antes os criminosos precisavam enterrar dinheiro, agora alguns já lavam recursos por meio de uma fintech aberta por parceiros; se antes saqueavam transportadoras para vender segurança ou ter influência sobre a empresa, agora tentam manter as suas próprias frotas.”
Em São Paulo, o PCC recorreu à criação de empresas formais com auxílio de advogados especializados para participar e vencer licitações de transporte público. A operação foi desvendada pelo Ministério Público no âmbito da Operação Fim de Linha.
Utilizando os FIPs (Fundos de Investimento em Participações), o PCC se infiltrou no setor imobiliário para lavar e movimentar grandes quantias de dinheiro ilícito. A complexidade desses fundos e a mistura de capitais tornam a origem dos recursos praticamente irrastreável, como afirma um advogado que preferiu não se identificar.
Menos suscetíveis à regulação e à fiscalização que instituições financeiras tradicionais, as fintechs tornaram-se um instrumento para movimentação e lavagem de dinheiro.
Direitos garantidos por lei, como o sigilo bancário excessivo e a utilização de paraísos fiscais, viabilizam a movimentação transfronteiriça de fundos sem levantar suspeitas imediatas sobre a origem ou o destino do dinheiro.
O tempo e os vastos recursos necessários para seguir o rastro do dinheiro, decifrar teias societárias complexas e identificar os beneficiários finais tornam a investigação morosa e, frequentemente, insuficiente. Ou seja, o setor de segurança pública e o judiciário não dispõem das ferramentas e recursos necessários para expor e conter essa ameaça.
Embora criminosos utilizem criptomoedas em suas operações ilícitas, a tecnologia blockchain oferece um contraponto à opacidade dos sistemas financeiros tradicionais, ao garantir a transparência, a imutabilidade e a rastreabilidade das transações.
Ao contrário dos sistemas financeiros que dependem de intermediários e processos complexos para verificar transações, as redes blockchain operam com um registro imutável e distribuído. Cada transação é gravada em um livro-razão público, validada por múltiplos participantes da rede e, uma vez registrada, não pode ser alterada.
A crença de que as criptomoedas são próprias a atividades ilícitas, devido a um suposto anonimato dos usuários, é um equívoco. Embora as identidades dos usuários não sejam diretamente ligadas a nomes (o que as torna pseudo-anônimas), todas as transações são públicas e rastreáveis.
Empresas especializadas em análise on-chain, como a Chainalysis, possuem ferramentas avançadas para rastrear o movimento de fundos em redes blockchain, identificar padrões suspeitos e colaborar com agentes de segurança.
Apesar do potencial da blockchain como ferramenta de combate ao crime financeiro, a postura de governos e do setor empresarial em relação à tecnologia é ambivalente. A regulamentação por parte das instituições financeiras tradicionais muitas vezes foca no controle e na restrição das novas tecnologias, em vez de incorporar suas inovações.
O ministro da Justiça e Segurança Ricardo Lewandowski associa regularmente às criptomoedas ao crime organizado.
“O pagamento das drogas traficadas nas fronteiras, os coiotes que traficam pessoas, o garimpo ilegal, a exploração de madeira, tudo isso é pago hoje não mais em dinheiro, mas através de criptomoedas”, disse o ministro durante um evento na sede da Febraban (Federação Brasileira de Bancos).
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