Projeto de regulação de criptoativos estabelece medidas como segregação de ativos e prevenção à lavagem de dinheiro (Jefferson Rudy/Agência Senado/Flickr)
O projeto de lei que o mercado de criptoativos no Brasil pode ser aprovado ainda em 2022, segundo o presidente da Associação Brasileira de Criptoeconomia (ABCripto), Bernardo Srur. Em entrevista à EXAME, ele avalia ainda que a falência da FTX pode acelerar a análise da proposta na Câmara.
O PL 4401 já foi aprovado no Senado neste ano, mas está há alguns meses parado na Câmara aguardando uma votação final necessária para que ele seja enviado à Presidência para sanção e futura implementação. Na semana passada, a ABCripto e outras entidades do setor financeiro divulgaram uma carta pública pedindo que o texto seja analisado.
Srur acredita que há um "cenário atípico" no Brasil no momento, com uma combinação de Copa do Mundo, período pós-eleitoral e proximidade do recesso parlamentar que levam a uma "despriorização" do projeto. Ao mesmo tempo, ele acredita que o caso FTX atua como uma força oposta, favorecendo a aprovação do texto.
"A falência da FTX mostrou exatamente o que a ausência de regulação em um momento de expansão da criptoeconomia pode acarretar, os impactos que pode trazer se não tem regras que imponhas governança às empresas", diz Srur.
Considerando o momento atual, ele acredita que há um "espaço propício para aprovar o PL em um esforço concentrado". Ele lembra que o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, se comprometeu a pautar o projeto no plenário até a próxima segunda-feira, 21.
"O PL já está mais do que alinhado em todas as casas, as discussões regulatórias já foram feitas. Não precisa mais saber é o momento exato, precisa pautar e aprovar. Hoje, a criptoeconomia pode ajudar muito o Brasil, mas para isso precisa do Marco Regulatório o mais rápido possível", ressalta Srur.
O presidente da ABCripto observa que a falta de conhecimento de muitos parlamentares sobre o tema pode ter sido o "grande motivo" para a demora na aprovação do texto. Entretanto, ele credita a lentidão mais ao período eleitoral, em que diversos temas, inclusive o PL, acabaram ficando de lado.
"Passadas as eleições, há o problema que a FTX trouxe, que está sendo muito bem acompanhado por órgãos reguladores aqui, então eu vejo um ambiente propício para aprovar. Há um consenso entre a maioria de legisladores e órgãos de que o que ocorreu lá fora não pode ocorrer aqui no Brasil", comenta Srur.
Mesmo se o texto não for aprovado, Srur acredita que o projeto não começaria do zero, mas teria um atraso em 2023 devido à necessidade de indicar um novo relator com o início de uma nova legislatura. O atual, Expedito Netto (PSD-RO), não conseguiu se reeleger.
Além disso, Srur afirma que o início de um novo governo deve trazer "novas pautas prioritárias", que também tendem a atrasar a análise do projeto. Esse seria "um dos motivos para a importância de aprovar o projeto ainda neste ano".
"Não pode perder o timing de desenvolvimento de mercado – existem muitos projetos aguardando a legislação para fazer investimentos – e de segurança jurídica, o setor não pode carecer dela", defende.
Em relação ao projeto, Srur diz que ele traz pontos positivos, o principal sendo "estabelecer o que é criptoeconomia, qual é o setor, e regulamentar isso no Brasil. É mais psicológico até, visando esse desenvolvimento, mas com indicação de órgãos reguladores para cuidar do tema".
Pelo projeto, criptoativos que forem considerados como valores mobiliários ficarão sob a alçada da CVM, enquanto outros elementos do setor que não se enquadrem nessa categoria ficarão com um órgão competente sendo nomeado pelo Poder Executivo, o mais provável sendo o Banco Central.
Srur também cita como pontos positivos "trazer regras de constituições para empresas no Brasil, o respeito às regras tributárias brasileiras e de direito ao consumidor, a alteração da lei de lavagem de dinheiro para passar a incluir criptoativos e a segregação patrimonial"
Esta última é apontada pelo presidente da ABCripto como importante para evitar casos como o da FTX. Pela regra, o dinheiro dos clientes em corretoras de criptoativos não poderá ser fundido com o dinheiro da empresa para financiar operações. Além disso, a proposta "garante que, caso a empresa quebre, os ativos dos clientes estarão a salvo".
Uma vez que o projeto aprovado, esses órgãos reguladores iniciarão a chamada regulação secundária, o estabelecimento de medidas específicas e mais detalhadas que ajudarão a cumprir as medidas mais gerais colocadas no projeto.
"O tema inicialmente vai ser tratado seguindo as recomendações gerais, os processos de autorização, constituição de empresas, prevenção à lavagem de dinheiro, implementar isso. Depois têm as licenças de empresas. Depois, vão ter regras mais específicas para custódia e operação. A conclusão disso depende, teria de 6 meses a um ano para adequação", projeta Srur.
Enquanto isso, o setor já conta com medidas de autorregulação, em geral boas práticas recomendadas entre as próprias empresas. A ABCripto lançou um código de boas práticas que todos os seus membros precisam seguir e que envolve medidas que compõem o projeto, incluindo a prevenção à lavagem de dinheiro e a segregação de ativos.
"A autorregulação tem papel importante, em termos de organização do mercado, e mesmo que ganhe regulação, só reforça a necessidade de organização do mercado e o papel da autorregulação. É um grande passo para o mercado nesse sentido", acredita o presidente da associação.
Ao mesmo tempo, o PL obrigará todas as empresas a aderir a boas práticas, não apenas as integrantes do grupo. Srur avalia ainda que o segmento de criptoativos "pode sim ter um autosupervisor no mercado, como o Conar, a Ambima, a Febraban, que são positivos para o mercado. Tem um espaço para isso".
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