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1 ano depois de virar moeda oficial em El Salvador, bitcoin está 'esquecido' no país

El Salvador foi o primeiro país a adotar uma criptomoeda como moeda oficial, mas medida não ganhou popularidade entre habitantes

Bitcoin se tornou moeda de curso legal em El Salvador em 7 de setembro de 2021 (MARVIN RECINOS/Getty Images)

Bitcoin se tornou moeda de curso legal em El Salvador em 7 de setembro de 2021 (MARVIN RECINOS/Getty Images)

Em 7 de setembro de 2021, El Salvador fez história ao se tornar o primeiro país a adotar o bitcoin como moeda de curso legal. Na data, o presidente Nayib Bukele subiu ao palco com fogos de artifício para anunciar a medida que prometia “revolucionar a economia do país” para uma multidão de entusiastas. No entanto, um ano depois, os níveis de adoção entre a população continuam baixos e a queda de mais de 60% da criptomoeda traz efeitos negativos para El Salvador.

Caindo de aproximadamente US$ 45 mil para US$ 19 mil atualmente, o bitcoin não substituiu a moeda mais forte em El Salvador: o dólar norte-americano. No entanto, também não trouxe a ruína que os mais céticos previam. A maior criptomoeda do mundo em valor de mercado estaria “esquecida” no país.

“Ninguém mais fala sobre bitcoin aqui. Está meio esquecido”, disse o ex-presidente do banco central de El Salvador, Carlos Acevedo, à Bloomberg. “Não sei se você chamaria isso de fracasso, mas certamente não foi um sucesso.”

(Mynt/Divulgação)

No lançamento, em setembro de 2021, cada salvadorenho recebeu uma carteira digital criada pelo governo, chamada de Chivo. Nela, continham US$ 30 em bitcoin como uma forma de incentivo à adoção em massa. No entanto, muitos habitantes alegaram que o governo não realizou medidas educativas o suficiente para que eles pudessem aprender a utilizar a tecnologia, que pode ser complicada até para os mais adeptos.

De acordo com a “Lei Bitcoin”, instaurada em El Salvador, os impostos podem ser pagos em bitcoin e as empresas e comércios devem aceitá-lo como forma de pagamento, a menos que sejam tecnologicamente incapazes disso.

No entanto, a aceitação não foi tão grande por conta da eficiência de outras redes de pagamento presentes no país, segundo Acevedo. “Em El Salvador, temos uma boa rede de pagamentos, então por que transferir dinheiro com criptomoeda?”, disse.

Segundo o Banco Central de El Salvador, apenas 2% das remessas foram feitas em criptomoedas, usando a carteira digital Chivo.

Uma pesquisa realizada em maio pela Universidade Centroamericana de El Salvador, revelou que 71,1% dos entrevistados disseram que a “Lei Bitcoin” não fez nada para melhorar as finanças de suas famílias. Os entrevistados classificaram o Bitcoin como a segunda maior falha política de Bukele em 2021, atrás apenas da alta na inflação.

“Se você for a qualquer mercado em El Salvador, é mais provável que receba um insulto do que consiga comprar algo em bitcoin”, disse Laura Andrade, diretora do instituto de opinião pública da universidade, que realizou a pesquisa. “Não faz parte da rotina diária das pessoas”, afirmou ela à Bloomberg.

Como investimento, o bitcoin também não “pegou” em El Salvador, segundo Acevedo. A volatilidade da criptomoeda pode ter assustado muitos investidores do país, principalmente levando em consideração as fortes quedas do bitcoin desde a sua adoção como moeda de curso legal.

Esta foi uma postura bem diferente do próprio governo do país, que investiu – e muito – em bitcoin. Sob o comando de Bukele, El Salvador começou a comprar bitcoin pouco antes da aprovação da “Lei Bitcoin" e continuou aproveitando quedas para aumentar suas reservas.

Agora, El Salvador possui cerca de US$ 58 milhões em perdas não realizadas de seus investimentos em bitcoin. As perdas são chamadas de “não realizadas” pois o país não chegou a vender seu patrimônio na criptomoeda.

(Mynt/Divulgação)

A situação de El Salvador em meio à pouca adoção da criptomoeda no país e as quedas no mercado cripto levantam preocupações em todo o mundo, incluindo do Fundo Monetário Internacional (FMI).

O FMI adiou a aprovação de um programa de US$ 1,3 bilhão para o país citando riscos do bitcoin. Os 2.381 bitcoins do governo comprados com fundos públicos valem US$ 47,2 milhões atualmente, menos da metade do que o governo pagou.

Dados da Moody's estimam que o governo gastou US$ 375 milhões no total no lançamento da “Lei Bitcoin”, incluindo um fundo de US$ 150 milhões para apoiar as conversões entre bitcoin e dólar e o dinheiro para o bônus de US$ 30 dado aos usuários da Chivo.

“O experimento promovido pelo governo Bukele com bitcoin aumentou significativamente a percepção de risco do mercado no país”, disse Fabiano Borsato, diretor de operações da Torino Capital LLC, à Bloomberg.

“Está sendo implementado em um contexto de finanças públicas frágeis, déficits fiscais elevados e persistentes e dúvidas sobre o estado de direito no país. Isso, em nossa opinião, impedirá El Salvador de acessar financiamentos nos mercados internacionais em condições favoráveis no curto e médio prazo”, acrescentou Borsato.

No entanto, algumas empresas afirmam que houveram, de fato, vantagens na adoção do bitcoin como moeda de curso legal. Além disso, a maior parte dos benefícios ainda estaria por vir, das quais El Salvador se aproveitaria ainda mais por ter investido na tecnologia antes de todos os outros países.

Segundo Alejandro Zelaya, Ministro das Finanças de El Salvador, o bitcoin atraiu investimentos estrangeiros e aumentou o turismo no país, além de facilitar o acesso financeiro a uma população grande parte não bancarizada, ou seja, sem conta em banco.

O governo salvadorenho ainda afirma que mais de 4 milhões de pessoas possuem carteiras digitais Chivo e o turismo está próximo de superar os níveis pré-pandemia. 59 empresas também teriam aberto escritórios no país.

A Bitfinex, uma das maiores corretoras de criptomoedas do mundo em volume de negociações, será parceira do governo salvadorenho em sua missão para impulsionar o bitcoin no país. Paolo Ardoino, diretor de tecnologia da empresa, defendeu a escolha de El Salvador em apostar na tecnologia desde cedo:

“Assumir que os carros eram um fracasso porque, desde o primeiro ano em que a Ford iniciou a produção em 1896, não mais de 2% da população que tivesse um carro teria sido bastante míope”, disse Paolo Ardoino, à Bloomberg. “O governo tem uma visão de longo prazo. A indústria de criptomoedas é altamente tecnológica e esse é o tipo de indústria que todos deveriam querer em seu país.”

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