Burguer King: futuro pouco claro sobre estrutura societária (Leandro Fonseca/Exame)
Graziella Valenti
Publicado em 6 de setembro de 2022 às 12h20.
Última atualização em 6 de setembro de 2022 às 15h43.
A Zamp (BKBR3), dona das operações das bandeiras Burger King e Popeyes no Brasil, têm um futuro nebuloso. Não, isso não tem (quase) nada a ver com o desempenho operacional da empresa que, aliás, ‘vai muito bem, obrigada’ — no pós-pandemia, claro! A companhia, ao fim de junho, acumulou R$ 3,3 bilhões em receita líquida nos últimos 12 meses, um recorde histórico mesmo se comparado ao desempenho antes da covid – expansão de 19% sobre 2019.
O que está difícil de saber é se a companhia vai continuar tendo seu capital pulverizado na B3 ou se terá um dono, um sócio majoritário, mais precisamente a Mubadala Capital. A gestora, que conta com recursos do fundo soberano Abu Dhabi, tem pouco mais de 5% do capital da Zamp e fez uma oferta pública (OPA) por mais 45% do capital da empresa com preço de R$ 7,55 por ação — um movimento de quase R$ 1 bilhão. Esse preço por ação equivale a avaliar 100% da empresa em R$ 2,1 bilhões.
Como todos os negócios de food service, a Zamp sofreu um bocado na pandemia e viu o valor de sua ação, que superou R$ 23,50 há cerca de dois anos, chegar a R$5,30 em meados de 2022. Quando a proposta do Mubadala chegou, representava um prêmio da ordem de 30% sobre o preço médio de negociação em bolsa dos últimos 30 dias. Mas, é verdade que esse era o piso histórico do negócio. E que, desde então, curiosamente, os papéis se mantém ligeiramente acima da oferta anunciada. Apenas hoje é que passaram a ser negociados ligeiramente abaixo: há pouco tinham queda de 3,6%, para R$ 7,46.
O Mubadala, que já foi acionista e já ganhou um bom dinheiro com o negócio, não pensou duas vezes. Aproveitou as mínimas históricas e se lançou no intento de comprar o controle.
Nesta segunda-feira, ontem, dia 5, terminou o prazo para surgimento de uma oferta concorrente. Saldo: nada! Se houvesse, ela teria de ser, no mínimo, 5% acima da proposta do Mubadala. O que deixa os investidores com o seguinte futuro: um leilão na B3, agendado para 15 de setembro, com um preço que até ontem estava abaixo da cotação de mercado. Mas as diferenças são tão pequenas que não são suficientes para dar pistas do futuro.
E, vale lembrar que, desde a bagunça da disputa pelo controle da Eletropaulo entre Enel e Neoenergia, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) mudou as regras para essas situações. Não há mais a possibilidade de interferência compradora durante o leilão, nesse tipo de oferta.
Sobra, como única alternativa (ou esperança), o Mubadala elevar sua proposta — isso ou acreditar em um comprador potencial depois que toda essa poeira baixar. A gestora, até aqui, bateu o pé e reforça que esse é o valor justo para o negócio. Os acionistas, por sua vez, se mobilizam tentando mostrar resistência: a holding Burger King do Brasil, dona de 9,8% do capital total, rechaçou ontem o valor que está na mesa. Essa fatia equivale a cerca de 20% do que o Mubadala precisa comprar para chegar ao controle.
Sem oferta concorrente, sobrou para todo mundo se fazer de difícil. E deixar o mercado no escuro. Os acionistas, na tentativa de pressão, devem se calar sobre a oferta daqui para frente, assim como a Mubadala. A ideia é deixar a outra parte com medo, pressionar. Pode parecer cruel, mas é a rotina no caso de companhias de capital pulverizado.
O maior acionista da Zamp é o Morgan Stanley, com cerca de 10% do capital, mas que está longe de ser um sócio ‘estratégico’. Outros acionistas relevantes são as badaladas gestoras Atmos e Vinci Partners, com 7,4% e 6,4% do capital, respectivamente. Essas, sim, com capacidade de mudar o rumo das coisas — com um sim, ou com um não. Mas difícil imaginar que possa acontecer.
O que torna a análise de tudo mais desafiadora é que cada acionista tem um ponto de entrada e, portanto, de retorno e de limites, diferente. Não está nada garantido para o Mubadala. Nem o cenário de fracasso, nem de sucesso. O mesmo vale para os acionistas.
Conta pontos contra a oferta, além do valor, o fato de ser parcial. Na prática, significa que os acionistas precisam correr ao menos algum risco do novo dono. E nem todos veem isso com bons olhos. Para completar, é uma oferta tudo ou nada. O Mubadala quer 45%. Menos que isso, não aceita comprar — o que ela poderia, dentro dos limites das regras de mercado.
Seria lógico pensar que qualquer um que entre num movimento como esse do fundo árabe, absolutamente hostil, teria uma reserva para considerar um aumento de preço — ainda que simbólico. Vários contam com isso.
Mas não há como saber, a essa altura do campeonato, faltando dez dias para o leilão, se o Mubadala quer garantir vitória ou se já jogou a toalha diante da reação do mercado e arriscará a sorte nos R$ 7,55. Também não dá para prever como os acionistas vão se comportar, já que a diferença em relação ao valor de mercado é mínima.
Pelo visto, será um jogo de nervos. Pior do que isso. Um jogo de nervos no qual ninguém tem certeza do resultado e, tampouco, consegue prever o futuro. Melhor com Mubadala ou sem? Vender parte agora e ver o futuro ou não vender nada e esperar?
De todas as finas sensibilidades que se pode — tentar — ler até o momento, vale considerar que a carta da Burguer King Brasil foi para lá de educada e não fechou portas. E também o conselho de administração da Zamp não forneceu parâmetros ou um projeto alternativo. Todos parecem abertos a conversar. Até agora, porém, conversas não há. Cada um em sua toca, esperando o primeiro movimento ‘do outro’.
E, sim, isso é tudo por ora. Cada um por sua ‘conta e risco’, uma expressão que parece ter sido cunhada para essa circunstância.
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